A importância do jornalismo profissional, apesar de tudo

“Apesar de adotar objetivos progressistas, governo democrata enfrenta número excessivo de imigrantes”.

Este é o lead da matéria sobre o imbróglio que o governo Biden está enfrentando nessa questão da imigração. Digamos, em uma realidade alternativa, que o lead fosse o seguinte:

“Por causa de seus objetivos progressistas, governo democrata enfrenta número excessivo de imigrantes”.

Este segundo hipotético lead seria interpretado como propaganda do governo Trump e só poderia ter sido publicado em algum site alt-right. Já o primeiro é, supostamente, neutro. Só que não.

O uso do “apesar” também faz uma ligação entre as “políticas progressistas” e o “número excessivo de imigrantes”: trata-se de uma relação de não causalidade. Ao usar “apesar”, o jornalista está afirmando que as políticas progressistas NÃO SÃO responsáveis pelo número excessivo de imigrantes. A causa da crise humanitária deve ser procurada em outro lugar.

Sairá de mãos abanando os que procurarem, na matéria, possíveis explicações para o aumento do número de imigrantes. Parece mais uma força incontrolável da natureza, uma catástrofe que calhou de cair sobre os ombros do presidente democrata. Um azar, dado que justamente ele adotou “políticas progressistas”.

A matéria seria neutra se deixasse essa bobagem de “políticas progressistas” de lado. Existe uma crise humanitária e o governo Biden não está conseguindo enfrentá-la, ponto. Avaliações sobre “políticas progressistas”, em clara contraposição às “políticas reacionárias” de seu antecessor, só mostram o lado do jornalista. E abrem o flanco para um leitor medianamente inteligente chegar à óbvia conclusão de que são exatamente essas “políticas progressistas” que estão causando a vaga de imigrantes.

Para terminar: em favor do jornalismo profissional, é de se notar que esse tipo de reportagem sequer teria espaço em um veículo puramente militante. O Granma não publica os problemas do sistema cubano, como o fazem o NYT ou o Washington Post em relação aos problemas do governo americano, apesar dos vieses. O fato de se publicar matérias sobre a crise dos imigrantes, apesar da tendência do jornalista, mostra a importância de termos uma imprensa profissional independente em uma democracia. Cabe a nós, leitores conscientes, separar o joio do trigo, evitando jogar o bebê junto com a água suja da banheira.

Ilegais maltratados

Reportagem de capa sobre o perrengue que brasileiros ilegais estão passando nas prisões americanas. São tratados como bichos, segundo a reportagem.

A matéria entrevista uma goiana, que tentou entrar nos EUA para fugir de seu ex-marido, muito violento. A polícia de Goiânia não seria confiável, segundo ela.

A repórter não perguntou porque ela não tentou se mudar para outra cidade do país, ou mesmo para outro país da América do Sul, como Peru ou Bolívia, onde estaria a salvo do ex-marido violento e da polícia de Goiânia. Ficamos sem saber.

Welcome to fake news

Em reportagem do Estado, você vai descobrir que:

1) O governo Obama também separava os filhos dos pais;

2) A menina hondurenha que está na capa da Time NÃO FOI separada da mãe e

3) A mãe sequestrou a filha e abandonou outros três filhos em Honduras.

Se essa capa da Time não é fake news, não sei mais o que é.

“Desafio”

Como se Obama recebesse de braços abertos pessoas que pulam o muro na fronteira com o México. Essa imprensa realmente perdeu o senso do ridículo.

Só para registro, o brasileiro foi preso na fronteira, sendo deportado 3 meses depois. Para a reportagem, declarou que “o sonho americano é uma ilusão”. Bom mesmo deve ser o pesadelo brasileiro.

Uma Grande China

Tenho lido várias análises em veículos como Wall Street Journal, Bloomberg e Financial Times, afirmando que a nova política de imigração de D Trump terá consequências mais catastróficas para a economia americana do que o choque de um asteroide ou o Big One, o temido terremoto causado pela falha de St Andreas, na Califórnia.

Convenhamos: considerar que a economia americana vai ficar de joelhos porque não poderá mais contar com imigrantes ilegais para limpar latrinas e bumbuns de nenês, é a admissão de que o mundo desenvolvido não passa de uma Grande China, que não sobrevive sem sub-empregados.