Padrões

A história nunca se repete. O ser humano gosta de ver padrões, e daí nascem coisas como a astrologia e a numerologia. A tentação é igualmente grande de ver padrões históricos onde há apenas o desenrolar linear da história.

Tendo posto o disclaimer, a analogia entre Bolsonaro 2018 e Collor 1989 é tão irresistível que… não consegui resistir!

Assim como Bolsonaro, Collor voou abaixo dos radares por anos. Foi prefeito de Maceió, deputado federal e governador de Alagoas antes de ser alçado ao posto máximo da República.

Collor era um ilustre desconhecido até que, no próprio ano da eleição, engatou um discurso que pegou: o de “caçador de marajás”, aquele que iria acabar com a corrupção. E isso em um país que vivia uma hiperinflação de fazer inveja à Venezuela. A pauta não era econômica, mas moral. Alguma semelhança?

Collor desbancou medalhões da política tradicional, e decidiu o 2o turno com o eterno candidato do PT. Era claro para os analistas que Collor iria “desmanchar” durante a campanha: sem estrutura, com um partido pequeno, só tinha seu discurso. E Collor permaneceu teimosamente na frente de todos os outros candidatos ao longo de toda campanha.

Collor se elegeu e foi impichado. Sua deposição ocorreu porque um presidente se elege com um discurso moral, mas governa com a economia. Collor não domou a hiperinflação e a economia entrou em recessão. Quando mais precisava, seu apoio no Congresso lhe faltou, pois nunca o teve de verdade. A Casa da Dinda (os mais novos procurem pelo termo) foi apenas o motivo jurídico formal, assim como foram as pedaladas para Dilma. A queda se deu por falta de apoio político em um momento de extrema fragilidade da economia. Sarney e Temer também tiveram escândalos de corrupção em seus governos e atravessaram momentos terríveis na economia, e nem por isso foram derrubados. O apoio do Congresso fez a diferença.

Fast forward para 2018.

Bolsonaro apareceu do nada com um discurso moral, tem o apoio apenas de um pequeno partido e, se ganhar as eleições, terá desbancado medalhões com muito mais densidade política. Enfrentará uma crise econômica braba, estrutural, de solução não óbvia. Se não conseguir o apoio do Congresso (e, não nos enganemos, o Congresso é esse Centrão que está aí), será uma questão de tempo para que se encontre a “Casa da Dinda” ou as “pedaladas” que servirão de motivo formal para o seu impeachment.

Mas, claro, a história não se repete. Eu é que gosto de ver padrões onde eles não existem.

A provável votação pelo impeachment

Em 1992, fizemos um bolão no escritório sobre o número de deputados que iriam votar a favor do impeachment do Collor. No final, foram 441 votos. Eu havia chutado 400 e ganhei, pois o meu número havia sido o maior. Meu raciocínio foi o seguinte: como o voto é aberto, nenhum deputado do centro quer ficar mal com o novo governo. Assim, na medida em que a votação avança, e mesmo antes, os indecisos vão pendendo para a maioria. No final, votam contra apenas aqueles do núcleo duro em torno do presidente. Teve até deputado que reformou o seu voto após a votação, para não ficar mal. Este ano tem a votação no Senado, mas o raciocínio é o mesmo.

Considerando que PT e seus satélites somam menos de 100 deputados, é possível que o total de votos pelo impeachment ultrapasse novamente 400.

Um brasileiro

“Se o apartamento não é dele, por que ele viria aqui no condomínio? O que ele viria fazer aqui no prédio?”

José Afonso Pinheiro, zelador do Condomínio Solaris, é a versão 2016 do motorista Francisco Eriberto, que derrubou Collor, e do caseiro Francenildo, que derrubou Palloci.

Para quem não viveu esta época, Francisco Eriberto era motorista da secretária do Collor, e levava dinheiro de lá para cá.

Na CPI do Collor, o deputado Roberto Jefferson, na época pertencente à tropa de choque de Collor no Congresso, perguntou a Eriberto se ele estava fazendo aquela denúncia somente por patriotismo, insinuando que o motorista estaria recebendo dinheiro de alguém. Ficou para a história a sua antológica resposta: “E o senhor acha pouco?”

Os pobres, os trabalhadores, que esses populistas de todas as cores dizem representar, só querem trabalhar em paz, sem que alguém lhes roube em nome de uma utopia. Como disse o zelador do Condomínio Solaris, Josá Afonso Pinheiro, na entrevista à Veja, “o país precisa de pessoas honestas, com atitude e bom caráter.” É isso.