Itamar Franco fez que fez, que conseguiu a volta da produção do fusca, que era a sua ideia de “carro popular”. Lula quer repetir Itamar, e patrocinar a volta do “carro popular”, um carro mais barato e acessível ao grande público. Só tem um probleminha: assim como o fusca, ninguém quer o “carro popular”.
Hoje o carro de 1.000 cilindradas já conta com benefícios fiscais. E, no entanto, custa os olhos da cara. Algumas ideias passam por reduzir itens de segurança (?!?) ou de proteção ao meio ambiente (?!?). Reduzir ainda mais os impostos nem pensar, dadas as necessidades pantagruélicas de gastos do Estado. Resta o “culpado de sempre”: os juros, que estariam impedindo o financiamento a prazos mais longos.
Só tem um problema com essa ”solução”: baixar a taxa de juros só vai aumentar a demanda sem aumentar a oferta de maneira proporcional. Resultado: aumento de preços. Atingiremos um novo equilíbrio com quase a mesma quantidade vendida e preços mais altos.
Tenho uma solução melhor: derrubar as barreiras para importação, reduzindo os impostos de importação e os subsídios para as montadoras nacionais dentro do programa Rota 2030. Em pouco tempo a oferta iria aumentar e os preços iriam despencar. Resta saber se Lula topa trocar os empregos de seus companheiros metalúrgicos por carros mais baratos para a população. É nessas horas que se vê quais são as verdadeiras prioridades.
Está rolando (mais) um ranking de preços internacionais do iPhone. É o ranking do site de comparação de preços Nukeni, mostrando que o iPhone 12 256Gb custa R$ 9.500 aqui no Brasil, contra R$ 5.167 nos EUA. A revolta é geral.
As duas reportagens que li hoje sobre o assunto se concentram na crítica ao imposto de importação, que encarece desproporcionalmente o produto em terras tupiniquins. Acho que as duas reportagens erram o foco.
Não tem dúvida de que o imposto de importação encarece os produtos. Mas sabemos por experiência própria todos os que já viajamos e fizemos compras nos States, que as coisas são sempre mais baratas lá, mesmo comparando com preços de produtos produzidos no Brasil. Roupas, eletrodomésticos, carros, enfim, tudo. Não precisa ser importado para ser mais caro.
O problema não está tanto na carga tributária, ainda que este seja um ponto importante sobre o qual falaremos em seguida, mas na distribuição dessa carga. Compare a carga tributária sobre bens e serviços do Brasil em relação à média da OCDE: 14,3% contra 11,1% do PIB. Nos EUA, essa mesma carga tributária é de apenas 4,3% do PIB. A diferença lá é cobrada sobre outros fatos geradores, principalmente renda. Ou seja, nos EUA e outros países desenvolvidos, há mais cobrança sobre a renda das pessoas do que sobre os bens e serviços produzidos.
Aqui no Brasil, portanto, os produtos são mais caros, mas o imposto de renda é muito menor. Assim, quando a classe média chora o iPhone caro no país, está analisando apenas um lado da equação. O outro lado é que paga menos imposto de renda do que seu equivalente norte-americano ou europeu. O resultado é que sobra mais dinheiro no bolso do brasileiro (ajustado pela renda de cada país), para gastar em produtos mais caros.
No final do dia, o que faz sentido é a comparação entre cargas tributárias totais. A distribuição do imposto, se pagamos sobre a nossa renda ou sobre os produtos que compramos, do ponto de vista estritamente econômico, importa pouco. Claro que esta é uma simplificação: o nosso sistema tributário é tão caótico, com tantas exceções e regimes especiais, que o nosso consumo é sim influenciado pelas escolhas dos produtos privilegiados. Mas, do ponto de vista de renda total disponível para consumo, o que importa é a carga tributária total do país.
Assim, não chore pelo iPhone caro. Chore pela carga tributária de 33% do PIB, equivalente à média dos países ricos e cerca de 10 pontos percentuais acima da média dos países da América Latina. Nos EUA, a carga tributária é de 25% do PIB. Antes do Biden, claro. E prepare seu bolso: ou você acha que essa dívida pública monstruosa que temos será paga com controle de gastos?
PS.: Não comentei, mas uma grande carga tributária sobre bens e serviços acaba sendo um instrumento de concentração de renda, na medida em que o imposto está embutido no produto, independentemente se é comprado pelo rico ou pelo pobre. Ou seja, o pobre acaba pagando a mesma coisa que o rico, mesmo tendo uma renda menor. Se o imposto fosse sobre a renda, o rico pagaria mais. Por isso, o nosso sistema tributário é altamente regressivo e concentrador de renda. E isto não está endereçado por nenhuma reforma tributária em análise no Congresso.