Ouvindo a voz do povo popular

Sérgio Cabral saiu algemado e acorrentado do presídio.

Os intelectuais ficaram chocados.

Os advogados de defesa ficaram indignados.

Os analistas disseram que poderia enfraquecer a operação lava-jato.

O pessoal da barbearia onde corto o cabelo (R$30 o corte, que já acho caro pela quantidade de trabalho no caso) achou foi é pouco.

Ontem assisti The Darkest Hour, filme que conta os bastidores da decisão da Inglaterra de resistir ao ataque nazi, ao invés de tentar chegar a um acordo de paz.

A situação estava realmente perdida. Todo o exército inglês estava cercado em Dunquerque e a única alternativa parecia ser a capitulação. Churchill acabava de assumir o governo por pressão dos trabalhistas, que exigiram seu nome para apoiar uma coalizão com os conservadores. No entanto, Chamberlain (o primeiro-ministro que deu lugar a Churchill), Halifax (ministro do exterior, preferido pelo rei para ser o primeiro-ministro) e o próprio rei preferiam uma saída negociada, que preservasse a paz. Como se isso fosse possível tendo Hitler do outro lado.

Churchill estava encurralado, sem apoio de seu partido e com a situação militar perdida. Resolveu então ouvir o povo (aqui é meio que um spoiler, mas que não tira a emoção da cena): toma o metrô e conversa com os passageiros, que são unânimes em dizer que a Inglaterra deve resistir.

O povo popular, aquele que anda de trem e ônibus e sustenta essa cambada com os seus impostos, está cansado de quem defende ladrão. O político que souber ouvir a sua voz ganhará as eleições.

Pizza em 3 simples passos

Talvez este seja o texto mais claro que li sobre a tese da pizza geral. A pizza é feita em 3 passos:

1) Confundir (propositalmente, pois não admito que uma pessoa inteligente como Bresser Pereira não tenha entendido esse ponto) o modo de doação (caixa 1 ou caixa 2) e o motivo da doação (desinteressada ou como compra de vantagens na administração pública). Para quem quer saber a diferença, sugiro ouvir o depoimento de Marcelo Odebrecht, que explica direitinho, de maneira didática.

2) Afirmar que o crime de que os políticos estão sendo acusados (todos) é de receberem doações ou “presentes” (sim, Bresser-Pereira usa o termo “presente”) via caixa 2.

3) Afirmar que a Lava-Jato somente vai condenar porque a lei (?!?) considera o caixa 2 como crime, quando, na verdade, trata-se dos usos e costumes do brasileiro (você é empresário ou profissional liberal? Tente fazer ou receber pagamentos por fora, e depois explicar para a Receita que se trata de “usos e costumes”).

Pronto! Agora é só levar ao forno, deixar por 50 minutos, e servir!


O acordo necessário (por Luiz Carlos Bresser-Pereira)

O indiciamento de mais 120 políticos, inclusive Fernando Henrique e Lula, mostra que a Operação Laja Jato tende a destruir toda a classe política brasileira. Muitos dirão que isto é “ótimo”, porque os políticos brasileiros são “todos”, ou “praticamente todos”, corruptos. E porque não há dificuldade em substituí-los. Mas estas duas crenças são falsas.

Primeiro, não é verdade que os políticos possam ser facilmente substituídos. Seria bom que muitos o fossem, mas será péssimo que os melhores políticos brasileiros, independentemente de sua cor ideológica, sejam desmoralizados e excluídos da vida pública. A profissão política é a mais importante das profissões, porque são os políticos que fazem as leis e conduzem o Estado; porque são eles que governam. Não se fazem políticos de um dia para outro. Um dia destes vi a entrevista de uma página inteira na Folha de um homem de televisão muito bem-sucedido, sr. Huck, que dizia que estava na hora de pessoas de sua geração assumirem o poder. Concordei com a afirmação, que estava no título, e decidi ler a entrevista. Uma coisa patética. Não havia uma ideia sobre o Brasil; uma ideia sobre o mundo. Apenas autoelogios e considerações vazias sobre a hora de sua geração.

Segundo, não é verdade que todos os políticos são corruptos. Pelo contrário, estou convencido que a grande maioria é honesta, inclusive alguns políticos já condenados pelo Mensalão, como José Genoíno (que conheço bem e admiro) e João Paulo Silva (que não conheço). Agora, no quadro do Lava Jato, é ridículo afirmar que políticos como Fernando Henrique, Lula, e Alckmin são corruptos. E, no entanto, o Judiciário, aplicando a lei, tende a também condená-los.

Por que condenar inocentes? Porque, segundo a lei, o ato receber doações para campanha ou como presente, sem oferecer em troca obra ou emenda – não sendo, portanto, propina –, é, não obstante, ilegal e pode ser entendido como corrupção. Mas não é, não é crime, porque a prática de se receberam doações e presentes sem que o político e a empresa fizessem o devido registro do fato fazia parte dos usos e costumes do país. A partir do Lava Jato e do susto que está causando nos políticos, não fará mais. E será preciso definir um limite para o valor dos presentes, como acontece em outros países. Mas não faz sentido agir retroativamente, considerar políticos eminentes como corruptos, e condená-los.

A imprensa hoje informou que os principais políticos dos principais partidos brasileiros estão se organizando para enfrentar o problema. Isto é mais do que necessário. A solução é a anistia do caixa 2 e regulamentar os presentes. É dar ao Judiciário uma lei que lhe permita não causar uma violência contra o Brasil.