Vale a pena contribuir para o INSS?

Meu filho formou-se em medicina. Disse a ele para que pensasse sobre a possibilidade de começar a contribuir para o INSS. Afinal, quanto mais cedo começar, melhor será a aposentadoria lá na frente. Ele então me perguntou: “mas vale a pena mesmo? O sistema não está quebrado? Que garantia eu tenho de que vou receber meu dinheiro lá na frente? Não é melhor guardar o dinheiro e fazer a sua própria aposentadoria?”

Perguntas todas muito pertinentes. Fui fazer um cálculo simples, assumindo as seguintes premissas:

  • Idade atual: 25 anos
  • Idade da aposentadoria: 65 anos
  • Contribuição: 20% do salário mensal
  • Taxa de juros real durante a vida ativa: 3% ao ano
  • Taxa de juros real na aposentadoria: 2% ao ano

Com essas premissas, o INSS vale a pena se meu filho viver além dos 83 anos de idade. Se morrer antes, teria valido a pena juntar o dinheiro.

Bem, adivinhar a idade da morte não é a menor das dificuldades neste tipo de cálculo, mas não é a única. As premissas de taxas de juros reais também são difíceis de fazer, e o resultado final depende muito disso. Mas acho que a principal incerteza veio de uma objeção que ele fez: “e quem me garante que essas regras não vão ser modificadas lá na frente de novo?” É, ninguém garante. Quer dizer, na verdade, é garantido que essas regras SERÃO mudadas lá na frente de novo, pois o sistema ainda está desequilibrado, e tende a ficar pior com o envelhecimento da população.

Tenho certeza de que esta dúvida não é só do meu filho, mas de toda essa geração que está entrando agora no mercado de trabalho. Como o INSS é um sistema “pay as you go”, depende da entrada de novos contribuintes. Se estes começarem a faltar, poderemos começar a enfrentar dificuldades para pagar as atuais aposentadorias. E com a tendência de termos cada vez menos empregos registrados, a decisão de contribuir para o sistema fica cada vez mais na mão do jovem profissional.

Sem querer soar alarmista, pois não é o caso por enquanto, mas toda essa discussão sobre a Previdência, ao mesmo tempo que alertou para a necessidade de poupar para a aposentadoria, aumentou a desconfiança no sistema por parte das novas gerações, que podem se recusar a financiar um sistema quebrado. O sistema de capitalização que o Guedes propôs era o reconhecimento de que isso tenderia a acontecer. O sistema atual tem como base a “solidariedade” inter-geracional: só funciona se as novas gerações toparem continuar pedalando a bicicleta.

Rombos never die

A ideia é usar os recursos do FGTS como uma poupança previdenciária. É uma excelente ideia, a não ser por um pequeno detalhe: não sei quanto a vocês, mas eu já considero o meu saldo do FGTS como uma poupança previdenciária. Usarei aquele dinheiro como reserva para a minha aposentadoria.

O problema dessa ideia se vê no trecho da matéria destacado abaixo: poderíamos migrar para o sistema de capitalização sem custo fiscal. Afinal, tem o dinheiro do FGTS!

Apenas para relembrar, migrar para o sistema de capitalização envolve um custo fiscal pelo seguinte: a aposentadoria de quem saiu do mercado de trabalho é financiada por quem ainda está trabalhando e contribuindo para o INSS. Assim, se esse pessoal da ativa parar de contribuir e passar a colocar o seu dinheiro em um sistema de capitalização (onde cada um é dono de sua própria poupança), a aposentadoria dos atuais aposentados precisará ser financiada com outras fontes de recursos. Este é o custo fiscal.

A ideia brilhante de usar o FGTS para financiar a transição é a seguinte: você que está aposentado, não tenho mais como te pagar a aposentadoria. Mas não se preocupe: vou pegar esse dinheiro aqui do FGTS para cobrir o rombo. Lá na frente, quando não houver mais aposentados pelo regime atual, acabará o problema, pois cada um terá a sua própria poupança previdenciária no regime de capitalização.

Seria uma excelente ideia, não fosse um detalhe: estamos transferindo o rombo do INSS para o FGTS. Lá na frente, quando você for sacar o FGTS, faltará dinheiro, pois foi usado para pagar as aposentadorias. Só estamos transferindo o rombo de um bolso para o outro. Rombos never die.

Essa discussão sobre o regime de capitalização é bastante útil, pois explicita o rombo atuarial do atual sistema previdenciário. Não tem jeito, não tem mágica: o Estado brasileiro ainda vai precisar se endividar muito e aumentar muito imposto para cobrir esse rombo. Ou, diminuir o benefício. Usar o FGTS é uma forma mágica de fazê-lo sem que o público perceba.