A natureza do discurso político

“Sem provas, Michele diz que governos de esquerda vão ‘perseguir os cristãos’ no País”.

É muito curioso o uso da expressão “sem provas” nesse contexto. “Provas” se exigem de coisas que aconteceram no passado. Por exemplo, quando Bolsonaro afirma que “houve fraude nas eleições de 2018”, é mais do que legítimo exigir provas da afirmação.

Mesmo em relação a planos futuros frustrados, as provas referem-se aos preparativos antecedentes. Por exemplo, um plano para soltar o líder do PCC foi frustrado, e os envolvidos, presos. O plano não foi executado, mas foram encontradas provas concretas de sua execução.

Exige-se de Michele “provas” de que há um plano concreto de “perseguição de cristãos”. Como se esse tipo de coisa contasse com um “plano de execução”. A “prova”, no discurso político, é de outra natureza. Trata-se de dedução lógica: se o governo da Nicarágua está fechando igrejas e prendendo religiosos, e se Lula simpatiza com o regime de Daniel Ortega, então, deduz-se que, se as condições se repetirem aqui, um governo do PT faria a mesma coisa. Pouco importa se se trata de um possibilidade mais do que remota, pois o Brasil não é a Nicarágua. O que importa é que a “prova” existe para fins de discurso político.

O jornalista, que deve ser colaborador da agência Lupa, exige do discurso político as mesmas regras da justiça penal. Não, meu caro jornalista, não é assim que funciona. A verossimilhança já serve como “prova” do discurso político. Michele não está mentindo, como quer fazer supor a expressão “sem provas”. Michele está apenas dizendo o que acha que vai acontecer. E isso é perfeitamente legítimo. Lula e o PT é que precisam explicar a sua proximidade com o governo nicaraguense.