A tungada escondida

Ainda Ciro Gomes.

Pedro Nery, em excelente artigo hoje no Valor, usa as próprias ideias de Nelson Marconi (principal assessor econômico de Ciro) para desmascarar o que realmente significa o projeto “desenvolvimentista”.

O Santo Graal dos economistas desenvolvimentistas é um certo “câmbio de equilíbrio industrial”, que permitiria que a indústria local se tornasse competitiva. Em recente entrevista ao Valor, Marconi teria indicado que um câmbio entre R$ 3,80 e R$ 4,00 cumpriria este papel. (Não se iluda, este alvo é móvel, quando o câmbio chegar lá, o novo “câmbio de equilíbrio industrial estará mais para cima. Mas sigamos).

Pois bem: o que Pedro Nery vai garimpar em um livro do próprio Nelson Marconi, em co-autoria com Bresser-Pereira (!), é a admissão dos efeitos desse câmbio mais desvalorizado: diminuir os salários reais, via inflação. Ou seja, os trabalhadores precisariam ser convencidos a não terem seus salários reajustados, de modo a tornar as empresas mais competitivas com o novo câmbio! Caso contrário, aquela desvalorização real se torna apenas nominal, não servindo para aumentar a competitividade da indústria.

O trecho destacado abaixo descreve como Marconi resolveria a questão: através de um papo franco entre empresários e trabalhadores, intermediado pelo governo! Muito fofo. Faz lembrar as “câmaras setoriais” da Dorothea Werneck no governo Sarney, em que se tentava lidar com a inflação na base do papo.

Trabalhador: saiba que, quando alguém fala em “incentivos para a indústria” e “câmbio no lugar certo”, na verdade estão querendo tungar você.

A Política Industrial certa

Então ficamos assim: dar incentivos para a indústria não está errado. Erradas foram as escolhas feitas. Mesmo que, na época, tenham sido aplaudidas de pé por estes mesmos que agora as criticam.

Quer dizer: o erro não está na ideia de política industrial, mas na sua implementação porca. Que sempre é aplaudida até o momento em que dá com os burros n’água, quando então será acusada de não ser a política industrial “certa”.

E assim vamos, de política industrial em política industrial, enquanto o trabalho árduo de simplificação tributária, desburocratização, qualificação de mão de obra, enfim, tudo aquilo que aumentaria a produtividade do país, vai ficando para as calendas.