Açodamento

“Açodamento” é uma palavra chave no debate parlamentar. É como o “clinche” no boxe: o pugilista que está apanhando se agarra no adversário para interromper a luta e tomar um ar. No parlamento, quando os partidos da minoria percebem que a vaca está indo para o brejo, acusam o processo de “açodado” e pedem mais “debates com a sociedade”. Como se os parlamentares não fossem representantes da sociedade em uma democracia representativa.

Por isso me espantou que um grupo de entidades do campo, digamos, “progressista”, esteja acusando de “açodado” o processo de substituição da Lei de Segurança Nacional.

Há menos de duas semanas, um outro grupo de entidades, ligadas a partidos do mesmo campo ideológico, pedia o fim rápido da LSN. Segundo Mercadante, presidente da fundação Perseu Abramo, do PT, “o importante é que seja feito logo”.

Agora, provavelmente vendo que a nova lei está indo para uma direção que não lhes agrada, essas entidades perguntam “pra quê a preeeeeessssaaaa”?

É o que sempre digo: cuidado com seus desejos, eles podem se realizar.

O envenenamento do debate

“O governo insiste na necessidade de retomada econômica e ampliação do espaço fiscal via reformas que reduzam os gastos sociais e de investimentos.”

É com esse nível de desonestidade intelectual que começa o artigo de Oded Grajew, presidente do Conselho Deliberativo da Oxfam Brasil. A Oxfam, como sabemos, é aquela entidade que tem o monopólio do bem, apontando o dedo para os maldosos e insensíveis capitalistas.

45% da despesa pública é com Previdência, enquanto 20% é com pessoal. Ambos são, como sabemos, dois dos principais mecanismos de concentração de renda do País, pois beneficiam desproporcionalmente os mais bem posicionados na escala social. As reformas visam, justamente, remediar só um pouco esses mecanismos, para que sobre mais dinheiro para gastos sociais e investimentos! O justo oposto do que Grajew afirma na abertura de seu artigo.

Sim, a reforma tributária é importante também, permitindo o aumento da produtividade da economia. Mas Grajew defende uma reforma Robin Hood, com o Estado pegando “dos ricos para dar aos pobres”. Imposto sobre lucros, sobre a atividade financeira, sobre grandes fortunas, essas são as medidas do cardápio da reforma tributária proposta pela Oxfam Brasil. Sim, tudo isso pode ser adotado como uma resposta política ao clamor por “mais igualdade”, mas não esperem que o resultado seja o almejado. A resposta política deve ser ponderada com a boa literatura econômica, de modo a, no final, não matar a galinha dos ovos de ouro.

Como tudo o que se refere a grandes fenômenos sociais, em que ligar as consequências aos atos que lhes deram origem não é uma tarefa simples, a narrativa é parte essencial para moldar e obter apoio da opinião pública. Entidades como a Oxfam envenenam o debate, ao vender um mundo idílico, que só não é alcançado pela maldade de uns poucos. Cabe aos formuladores de políticas públicas não se deixar vencer na narrativa, dando o devido peso à demanda por mais igualdade social em seus discursos. Pois não tem nada que promova mais a igualdade do que a gestão responsável dos recursos públicos.