Hoje caiu-me uma ficha.
Foi um daqueles momentos em que uma determinada realidade aparece nítida, onde antes havia algo incompreensível.
Sou meio lento pra entender as coisas. Mas procuro me colocar no sapato dos outros, para entender suas razões e motivações. Mesmo não concordando, é um exercício útil, recomendo.
Neste fim de semana, lendo uma montanha de manifestações a respeito da postura de Bolsonaro diante do Congresso, como eu disse, caiu-me uma ficha.
Bolsonaro não vai conversar com o Congresso. O parlamento brasileiro representa o que há de mais abjeto. Só há interesses mesquinhos, para ficar na coisa mais branda, ou inconfessáveis, se quisermos traduzir o sentimento geral.
Se Bolsonaro cedesse e negociasse com este Congresso, estaria traindo o sentido mesmo de sua eleição, que foi o de negar as negociatas que têm lugar ali.
Para Bolsonaro e seu núcleo duro de eleitores (acho que 15%-20% dos leitores, os restantes 35%-40% que lhe deram a vitória no 2o turno são mais anti-PT do que bolsonaristas) o Congresso deveria votar as medidas enviadas pelo Executivo por patriotismo. O que não deixa de ser uma contradição em termos: bandido patriota parece ser um oximoro.
Minha premissa, nesses dias todos, estava equivocada. Ao pensar que Bolsonaro pudesse agir como um “político normal”, que negocia com o Congresso a sua pauta, estava simplesmente esquecendo a alma da campanha do agora presidente: limpar a política de toda a sua podridão. O meme que marcou a minha, digamos, “iluminação”, foi o das malas de dinheiro do Gedel, com a frase: “articulação política”. Sim, se isso é o que se entende por articulação política, então é óbvio que não tem negociação. Com ninguém.
Se não existe possibilidade de negociação com este Congresso (e, a bem da verdade, com qualquer Congresso, porque político é tudo igual), restam três alternativas:
1) O Congresso aprova as medidas enviadas por Bolsonaro sem qualquer tipo de “negociação” – negociação entre aspas para assumir o sentido bolsonarista da palavra. Os congressistas, ao se depararem com as consequências nefastas para a nação de não votarem com o governo, colocariam a mão na consciência. Há dois problemas com essa alternativa: a) bandido não tem consciência e b) pode haver parlamentares honestos que simplesmente não concordam com as medidas, ou que pensem que não sobrevirá o caos se não forem aprovadas.
2) O Congresso não aprovas as medidas, e o governo torna-se, na melhor das hipóteses, um lame duck durante 4 anos. Na pior, o presidente cai em função da piora significativa das condições econômicas. (Observação importante: não estou aqui prevendo e muito menos torcendo pela queda do presidente. Estou apenas cobrindo todas as possibilidades)
3) Na impossibilidade de passar medidas importantes, o Congresso é fechado, limpando-se o caminho para as reformas necessárias, sem precisar “negociar” com bandidos. Para quem acha isso um exagero, li muitas manifestações nesse sentido neste fim de semana.
Enfim, e para encerrar, vocês não vão mais ler aqui que Bolsonaro “deveria fazer isso”, ou “deveria fazer aquilo”. Bolsonaro é o que é, e trairia seus eleitores se fosse ou fizesse outra coisa.
Vamos ver onde isso tudo vai dar.