O Facebook usa os seus dados. Assim como toda a indústria de publicidade.

Editorial do Estadão diz, horrorizado, que o Facebook usa os dados do usuário “mesmo contra a sua vontade” para, vejam só, “ganhar dinheiro”.

Não lembro de ter tido a opção de assinar o Estadão “sem anúncios”. Eles vêm junto com a assinatura do jornal quer eu queira, quer não. Recebo um monte de anúncios “contra a minha vontade”.

Da mesma forma, o Facebook não dá a seu usuário a opção de não utilizar seus dados pessoais para receber seus anúncios. Ocorre que os smartphones vêm com um mecanismo para bloquear o GPS de certos aplicativos para os quais o usuário não deseja franquear a sua localização. O que Zuckerberg afirmou é que o Facebook tem condições de saber a localização do usuário por outros meios. O importante aqui é notar que, em momento algum, o Facebook permite que o usuário escolha não compartilhar os seus dados. Seria um suicídio empresarial, assim como um jornal que desse a opção de um jornal “sem anúncios” para o seu assinante.

– Ah, mas é diferente. O jornal não usa os dados pessoais dos seus leitores, os anúncios vão simplesmente encartados no jornal para quem o compra.

O jornal usa os meus dados pessoais sim. Ao vender espaço publicitário, o jornal descreve o seu leitor: classe A-B, nível universitário, morador preponderantemente dos bairros X, Y, Z. O Facebook faz exatamente a mesma coisa, segmenta os seus usuários com base em seus dados, só que com muito mais eficácia.

O Facebook é um aplicativo “gratuito”. E, a essa altura do campeonato, devem ser muito poucos os que acreditam que a gigante das redes sociais seja uma entidade filantrópica, em que seus funcionários vivem de água e luz. Todo mundo sabe que seus dados são o preço para usar “gratuitamente” a ferramenta, assim como sabem que a publicidade do jornal é o que paga o salário dos jornalistas.

Para aqueles que se sentem incomodados em compartilhar os seus dados, a solução é simples: deixe de usar o Facebook e qualquer outra rede social, da mesma forma que um assinante incomodado com os anúncios pode deixar de recebê-los ao deixar de ler o jornal. É sempre melhor o usuário decidir o que fazer do que o governo decidir por ele.

Privacidade vs. Segurança

Os “especialistas”, quando consultados, insistem na ideia de que a violência não é necessária no combate à criminalidade, bastaria o uso de “inteligência”. Por inteligência entende-se aprimorar a capacidade de investigação, o que supostamente diminuiria a necessidade de confrontos com mortes, ao focar a ação nos bandidos, deixando inocentes de fora.

Pois bem, o governo de São Paulo está investindo em equipamentos de monitoramento, justamente para aumentar a “inteligência” no combate à criminalidade. Mas os “especialistas” alertam que esse tipo de coisa aumenta o isco de “esteorotipação” e da criação de “zonas de exclusão”, o que quer que isso signifique. Ou seja, para esses “especialistas”, a polícia deve agir com inteligência, mas com uma venda nos olhos. Isso aí não é inteligência, é o Neo cego lutando contra Matrix, só funciona em filme.

O autor da reportagem diz que o governo está comprando esse equipamento “sob o argumento” de melhorar o combate à criminalidade. Ao substituir a proposição “para” pela locução “sob o argumento”, o repórter faz a suposição de que o governo, na verdade, tem outras intenções. Pelo tom da reportagem, as verdadeiras intenções do governo são “criar zonas de exclusão” ao estereotipar a população pobre e bisbilhotar os cidadãos. Aliás, o título da reportagem faz menção aos “paulistas” de maneira genérica, não à bandidagem.

De fato, há um trade off insolúvel entre combate à criminalidade e privacidade. Mas, com as devidas salvaguardas legais (e os responsáveis pelo projeto as descrevem de maneira satisfatória, em minha opinião), se este for o preço a pagar para diminuir a criminalidade, podem me bisbilhotar à vontade, eu não tenho nada a esconder. Minha resposta aqui aos “especialistas” é a mesma que dou aos advogados criminalistas que alegam defender meus “direitos de cidadão” quando, na verdade, estão defendendo o direito dos bandidos de não serem presos: me incluam fora dessa.

Almoço de graça

Um dia, um milionário qualquer, entediado com o dolce far niente da vida de milionário, teve uma ideia: “vou desenvolver um app que envelhece a cara das pessoas. Todos darão gostosas gargalhadas e eu terei com que me ocupar durante um tempo”. E assim nasceu o FaceApp.

Só que não.

O FaceApp, um aplicativo “gratuito”, nasceu como todos os outros aplicativos “gratuitos”: com a intenção de usar a gigantesca base de dados de usuários que acreditam em “coisas de graça” para fazer negócios.

Os “reis” incontestáveis desse tipo de aplicativo são o Google e o Facebook. Mas estes são apenas a face mais saliente de uma indústria de apps “gratuitos”, onde o produto comercializado é o próprio usuário.

Já escrevi aqui que, se o Facebook quisesse, poderia criar uma versão paga do seu app, em que os dados do usuário pagante ficariam a salvo do comércio. Só não lançou porque, provavelmente, avaliou que a demanda ficaria próxima de zero. Aqui, quem pagaria para usar o Facebook? Ou o FaceApp? Pois é…

Fico realmente surpreso com a surpresa expressa na matéria. Uau, estão negociando com os dados dos usuários! Como se houvesse outra forma de monetizar o app. Parece até que o repórter acredita na parábola do milionário entediado.

A conclusão é uma só, como sempre: não há almoço grátis. Se um app é de graça, você está pagando de uma forma oculta. Não quer pagar? Saia da rede.