Quando vamos aprender a fazer política?

Pedro Fernando Nery se notabilizou pela intransigente e bem embasada defesa da reforma da Previdência. Pode procurar em seus muitos artigos, tuítes e no seu livro, escrito em parceria com o também especialista Paulo Tafner, uma linha sequer defendendo a “economia” gerada pela reforma. Enquanto Paulo Guedes e o mercado financeiro insistiam na “reforma do 1 trilhão”, Nery sempre focou na injustiça do sistema, um dos maiores, senão o maior, mecanismos de concentração de renda do País.

Muitos se espantam de como uma reforma do porte da aprovada, que de fato vai economizar algo mais próximo de 1 trilhão do que dos 400 bilhões da reforma frustrada do Temer, foi aprovada em menos de um ano sem uma única manifestação contrária nas ruas. O que eu vou dizer carece de comprovação teórica ou empírica, é mais um feeling pessoal: acredito que o sucesso da tramitação se deu pelo deslocamento do eixo das discussões para a justiça social da reforma, ao invés de ficar girando no eixo meramente fiscalista. E esse deslocamento é mérito, entre outros, de Pedro Nery.

Essa longa introdução serve para chamar a atenção para o artigo de Nery, hoje, no Estadão, em que o autor repercute estudo do IPEA que mostra que os mais pobres perderam renda neste ano, apesar de o brasileiro médio ter recuperado renda. Ou seja, não é que todos enriqueceram mas os pobres enriqueceram menos. Os pobres, de fato, ficaram mais pobres.

Nery defende a constitucionalização do Bolsa Família e sua extensão para as crianças pobres. A primeira vez que ouvi alguém defender a constitucionalização do BF foi Aécio Neves na campanha eleitoral de 2014. Escolado pelo uso eleitoreiro que o PT fez do programa nas eleições anteriores, Aécio propôs que o BF tivesse caráter constitucional justamente para tirar essa bandeira do PT, para que o partido não pudesse dizer que só o PT garantia a existência do BF.

Nery não entra em considerações partidárias, mas diz essencialmente a mesma coisa. Ele propõe a constitucionalização para que o programa realmente funcione, tal como a Previdência funciona, sem que seja necessária a boa vontade do governo de plantão. E eu complemento: precisamos, a exemplo da reforma da Previdência, reconhecer o caráter concentrador de renda em que vivemos, e propor remédios permanentes para esse modelo. O preço de não fazê-lo é entregar de mão beijada uma bandeira óbvia para os partidos de esquerda. Ao constitucionalizar o BF, não deixamos o PT falando sozinho sobre justiça social.

Raymond Aron, em sua espetacular obra “O Ópio dos Intelectuais”, relata justamente a oposição que os revolucionários de esquerda faziam aos programas social-democratas de mitigação da miséria. Segundo os revolucionários, o proletário, ao ver mitigada a sua dor, estaria menos propenso a “fazer a revolução” que mudaria definitivamente o modo de produção. Lula, que sempre achou essa história de revolução uma grande bobagem, adotou o programa da social-democracia e o usou como ninguém para fins de perpetuação no poder. Enquanto isso, ficamos chamando o BF de “esmola”, o mesmo termo usado pelos revolucionários de esquerda. Quando vamos aprender a fazer política?

Juízes em causa própria

Texto retirado do Valor Econômico

A Associação dos juízes vai entrar no STF contra as regras de transição para a catchiguria determinadas pela reforma da Previdência.

Eles, como todo mundo que é contra a reforma, são a favor da reforma, desde que para os outros.

“Faltou debate”, argumentam. Sempre que alguém diz que “faltou debate”, é porque não conseguiu emplacar seu ponto de vista. Querem que o juiz prorrogue o jogo até que façam o gol salvador.

É triste que uma das categorias mais bem pagas do funcionalismo público demonstre tamanha insensibilidade.

A conta não fecha

Quase metade da folha de pessoal na cidade de São Paulo vai para pagar inativos. Ou seja, as despesas com pessoal têm metade da eficiência que poderiam ter.

Não vou aqui entrar no mérito da justiça ou não desses gastos. Estão na Lei, ponto.

Meu ponto é outro: esses gastos não são sustentáveis no tempo. Fizemos uma reforma da Previdência com anos de atraso, e que vai somente diminuir o ritmo da deterioração. Isso se Estados e Municípios entrarem. Senão, nem isso.

Quando metade da folha de pagamentos vai para inativos, é que já viramos uma Grécia. Portanto, o ajuste deveria ser tão draconiano quanto. Lá, houve cortes de até 30% no valor das aposentadorias. Caso contrário, vai acontecer no Brasil inteiro o que já está acontecendo em alguns Estados: devo, não nego, pago quando puder.

No Brasil, o Estado de Bem-Estar Social funciona bem somente para os servidores públicos, às custas do Mau-Estar Social do restante do País. O que está acontecendo agora é que o restante do País disse um basta.

PS.: você, servidor público, não se sinta ofendido por essa análise. Não tenho absolutamente nada contra você em particular. Meu ponto é só econômico: o País não consegue mais sustenta-lo. Está falido. Antes de matar o mensageiro, reflita sobre a mensagem, e comece a fazer uma poupança para tempos de vacas mais magras ainda, que virão.

A conta chegou

Nas discussões sobre a reforma da Previdência, sempre havia um parlamentar do Nordeste para lembrar que a previdência era uma “política de distribuição de renda”, e que havia cidades que viviam do que recebiam seus aposentados. Lembro de reportagens falando sobre isso.

Cai como uma bomba sobre essa narrativa, portanto, a notícia de que um prefeito do Nordeste decretou falência do município por não conseguir pagar sua dívida justamente com o INSS!

Não consigo pensar em exemplo melhor para demonstrar que o Estado não cria riqueza, apenas distribui. O dinheiro que entra no bolso dos aposentados de Bento sai do caixa da prefeitura de Bento. Se não há criação de riqueza, essa transferência de riqueza acaba se exaurindo no pagamento da máquina. No caso, 9 vereadores que ganham, cada um, R$ 12,9 mil! Com uma renda de mais de 12 salários mínimos, esses vereadores estão firmemente colocados entre os 1% mais ricos do Nordeste.

Evidentemente, a decretação da falência é apenas um show de pirotecnia do prefeito. O que ele certamente quer é chamar a atenção e conseguir mais dinheiro para manter a máquina funcionando. Fundir seu município com outros no mesmo estado de penúria e mandar para casa os vereadores e a si próprio, nem pensar! Afinal, é preciso distribuir renda.

Senso do ridículo

“A função do MP é árdua, desgastante, o volume de trabalho é enorme”.

O sujeito, pra dar uma declaração dessas no jornal para justificar aposentadoria especial, é porque há muito perdeu o senso de justiça. Ou do ridículo.

Passado maior que futuro

Leia aqui o artigo de Pedro Fernando Nery, publicado hoje no Estadão, sobre os gastos com “pensão por morte”. Depois disso, você vai pensar duas vezes antes de dizer que “não há mais onde cortar”.

A lacroeconomia de Piketty

Na quinta-feira, o Valor Econômico publicou artigo sobre a reforma da Previdência do famoso Thomas Picketty, autor do best-seller “O Capital do Século XXI”. Por esta obra, Picketty é considerado o patrono da causa das desigualdades causadas pelo capitalismo. Sim, não foi fácil, mas li este livro até o fim.

Quando li o artigo de Picketty e outros autores (incluindo um professor da (surpresa!) Unicamp) tive imediata vontade de escrever um post apontando seus vários erros. A começar pelo título malandro, que insinua que a reforma da Previdência estaria atendendo a interesses escusos. Quando começa assim, difícil chegar a boas conclusões.

Não tive tempo para escrever, pois demandaria muita pesquisa. E também pensei: bom, Pedro Fernando Nery deve também estar lendo este artigo e vai escrever algo muito melhor do que eu seria capaz. Batata!

Abaixo, o artigo de Picketty do dia 11, e a resposta de Nery, publicado hoje no Estadão. Não preciso dizer mais nada.

O lobby venceu!

Escrevi aqui comemorando os 379 votos na aprovação da reforma da Previdência. Me arrependi.

O projeto precisava de 308 votos para a aprovação. Obteve 71 votos de “gordura”. Para tanto, foram feitas várias concessões, entre as quais essa VERGONHA da aposentadoria dos policiais federais. Pergunto: quantos votos seriam perdidos se não fosse feita essa concessão? 30? 40? Ainda assim teríamos votos suficientes para a aprovação. E teríamos uma Nova Previdência com um pouco menos de privilégios.

Maia desfila como o “rei da Reforma”, mas na verdade concedeu muito mais do que o necessário para sair bem na foto. E nós, pobres mortais sem lobby, vamos pagar pela “paridade” e “integralidade” dos intocáveis da administração pública. 🤬🤬🤬