Vendendo o almoço para pagar a janta

A proposta do nobre deputado é equivalente a sugerir que uma família que vive acima de suas posses venda os seus imóveis para pagar a conta do supermercado. Você até sobrevive, mas daqui a poucos anos o problema reaparecerá ainda pior.

Não há atalhos para as famílias, empresas ou países que gastam mais do que ganham.

Regime de capitalização

O regime de capitalização já existe: chama-se PGBL. Neste instrumento, o trabalhador tem um incentivo fiscal para poupar em prazos mais longos. Temos, portanto, um sistema híbrido: para aposentadorias de até 5 salários mínimos, o sistema de repartição do INSS. Acima disso, a poupança individual em PGBLs. Não é isso que o Paulo Guedes quer?

Para que o atual sistema fosse realmente um substituto do regime de capitalização, seria necessário mudar o formato do PGBL: a liquidez precisaria obedecer regras muito mais rígidas do que os atuais 60 dias de carência. Em fundos de pensão fechados, o indivíduo somente tem acesso à sua conta se sair do emprego e, mesmo assim, se cumprir certos prazos. O grande segredo da poupança previdenciária é dificultar ao máximo o acesso ao dinheiro. O acesso ao PGBL poderia, por exemplo, estar atrelado ao momento da aposentadoria oficial, pelo INSS.

Obviamente, sob essas condições, o volume de recursos que temos hoje na indústria de PGBLs seria muito menor. As pessoas preferem liquidez, ainda que não tenham planos para o dinheiro. Ainda mais em um país instável como o Brasil.

O que Paulo Guedes quer é forçar essa poupança de longo prazo. Ao invés de dar murro em ponta de faca, tentando convencer os congressistas de algo que eles não entendem, talvez uma reengenharia da atual indústria de PGBLs, nos moldes do 401-k americano, pudesse ser um substituto aceitável.

Idade da Pedra

Bancários em greve.

Dentro da agência, clientes fazem operações nos caixas eletrônicos.

Em casa, clientes fazem operações nos seus computadores.

Na rua, clientes fazem operações nos seus celulares.

O sindicato dos bancários ainda vive no século XX. Por isso são contra a reforma da Previdência.

Fábula da Previdência

Coluna de Pedro Fernando Nery, descrevendo com maestria as agruras de quem financia o déficit da Previdência.
Abaixo, favela em formação na Av Rebouças, São Paulo, formada por pessoas que não têm nem ideia de que estejam financiando o déficit da Previdência.

Corporativismo

Depois da reunião com o representante dos procuradores, estão na fila para reunião com o relator da reforma da Previdência os representantes dos pedreiros, empregadas domésticas, atendentes de telemarketing, caixas de supermercados, motoristas e cobradores de ônibus, cabeleireiros, porteiros, zeladores, frentistas, faxineiros, taxistas, atendentes de loja, costureiras, cozinheiros, garçons, chapeiros, prostitutas, atores de filme pornô, jogadores de futebol, caixas de banco, vendedores ambulantes e pedintes.

Receio que, com toda essa fila para atender, o relatório da Previdência atrase.

Vai, FHC!

Além de elogiar um charlatão como o Eduardo Moreira, FHC, pra não variar, não coloca na reta. Afinal, ele é contra ou favor da reforma que está no Congresso? Muro, ninguém sabe. Só sabemos que FHC se tornou o rei das platitudes.

E ainda tem gente perplexa com a motoniveladora que passou por cima do PSDB nas eleições.

O risco de Bolsonaro

Tentei recortar algum trecho dessa entrevista, mas ela deve ser lida por inteiro. Não se trata de um representante da “velha política”, mas de um deputado fiel, um dos 4 que votaram em Bolsonaro para a presidência da Câmara em 2017. Acima, portanto, de qualquer suspeita.

Como já disse várias vezes aqui, Bolsonaro deve fazer a “boa política”, que é compartilhar espaços de poder, e não a “nova política”, que é colocar-se como a virgem no bordel. A outra alternativa é fechar o Congresso. Não há uma terceira.

Cenário se materializando

Ministério das Cidades recriado.

Cenário 2 se materializando.


Post de 23/03/2019

Cenário 1: Bolsonaro consegue impor a sua agenda com a força das ruas. 308 deputados votam a reforma da Previdência sem qualquer tipo de negociação. O pacote passa inteiro. A economia deslancha e Bolsonaro é reeleito em 2022.

Cenário 2: Bolsonaro cede e negocia cargos e pontos da reforma. A reforma passa com alguns descontos. A economia deslancha e Bolsonaro é reeleito em 2022.

Cenário 3: Bolsonaro, fiel à sua agenda, não negocia, e a reforma da Previdência não é aprovada. A economia vai para o buraco e Bolsonaro até tenta colocar a culpa no Congresso. Mas, como no Brasil, tudo é sempre culpa do presidente, Bolsonaro é derrotado em 2022. Se conseguir chegar até lá, claro.

Qual desses cenários é o mais provável?

Honestidade intelectual

Tabata Amaral não consegue entender como a esquerda pode fechar questão contra a reforma da Previdência, um sistema iníquo de concentração de renda.

Eu explico pra você, Tabata: trata-se pura e simplesmente de luta política por espaços de poder. É o mesmo motivo pelo qual o Centrão vai votar uma reforma “desidratada”, para evitar o fortalecimento do governo. O povo que se exploda.

Parabéns Tabata, por não entrar nesse jogo. Posso não concordar com todas as suas ideias, mas o primeiro passo para o consenso é a honestidade intelectual. E isso você tem.