De todos os apoios políticos recebidos por Bolsonaro até o momento, provavelmente o mais inesperado e doído para os petistas tenha sido o de Rodrigo Garcia. Todas as cabeças iluminadas do partido, entre políticos e intelectuais, já haviam pulado para o colo de Lula antes mesmo do 1o turno, explícita ou implicitamente. FHC puxou a fila, com aquele aperto de mão infame com Lula vários meses antes das eleições. Ali foi o momento em que o médico finalmente fechou os olhos ao moribundo, encerrando a longa agonia do partido. Os resultados dessas eleições são apenas o fétido odor de um cadáver insepulto.
A adesão de Rodrigo Garcia ao bolsonarismo pode ser tudo, menos surpreendente. Garcia entrou para o partido, pelas mãos de João Doria, apenas em 2021, depois de ter construído toda a sua carreira política no Democratas, hoje também um partido extinto, engolido pelo que restou do PSL não bolsonarista, formando o União Brasil. O plano de Doria era lançar-se à presidência e deixar em seu lugar o vice. Para tanto, se fazia necessária a migração para o PSDB, pois essas eram as 4 letras mágicas que dominavam a política paulista há quase 30 anos. Tratou-se de uma migração por conveniência, não por convicção, como é regra na política brasileira.
Doria não era desse PSDB chorado por Bucci ou pelo editorial do Estadão. Apesar de ter uma longa história no partido, Doria não pertencia a essa intelectualidade prima-irmã do petismo. Por isso, não teve escrúpulo de abraçar-se com Bolsonaro em 2018, para salvar uma eleição quase perdida. Depois, o seu anti-bolsonarismo de ocasião não passou despercebido do eleitorado e do mundo político (que age de acordo com suas bases), soando como uma manobra artificial (mais uma) mais do que convicção. O final da história conhecemos.
Garcia, portanto, foi o implante de Doria no PSDB em uma cirurgia delicada com vistas ao seu projeto político. O (ainda) governador de São Paulo tem sua base política no interior do estado, que votou majoritariamente em Bolsonaro. É realmente muita ingenuidade achar que um político vai se posicionar contra o sentimento de sua base de eleitores em nome da “pureza ideológica” de um partido morto e a que sequer pertence de coração.
Fiquem portanto tranquilos Eugênio Bucci e o editorial do Estadão. O verdadeiro PSDB (FHC, Serra, Alckmin, José Aníbal, Tasso, Malan, Arida, etc) está apoiando Lula contra “aquele-que-não-se-pode-nomear”, honrando, assim, as cores do partido. Garcia é um forasteiro, não representa o PSDB. O fato de ser um dos poucos quadros do partido com alguma perspectiva de futuro político é mero detalhe.