Tropecei com esse artigo (A uberização de nossas vidas) da colunista dO Globo, Ruth de Aquino. Resolvi escrever porque é o típico exemplo de mistura de pensamento mágico com ojeriza ao capitalismo de nossa elite bem-pensante.
Ruth escreve sobre um recém-lançado filme do diretor britânico Ken Loach, que costuma dirigir filmes com “críticas sociais”. Ruth assistiu ao filme em Paris, bien sûr.
O filme é sobre o último flagelo que se abateu sobre a humanidade: a “precarização” do mercado de trabalho. As críticas são as mesmas de sempre: por debaixo da ilusão da “vida sem patrão”, existe muita frustração e trabalho insano que destrói vidas. E, como sabemos, vidas humanas são muito importantes.
O foco está na vida dos entregadores, explorados pelas grandes empresas e aplicativos de entregas. O que eu realmente acho curioso é que entregadores sempre existiram, mesmo antes do surgimento da Amazon ou do iFood. Lembro de pedir pizza por telefone 25 anos atrás. Esses entregadores eram tão “explorados” quanto os atuais: ganhavam o seu suado dinheiro na base do “quanto mais entregas você faz, mais dinheiro você ganha”. Duvido que os restaurantes contratassem esse pessoal com carteira assinada. Mas nada se falava a respeito.
A situação dos pobres entregadores só chamou a atenção quando alguém teve a brilhante ideia de explorar a ineficiência gritante desse mercado, e ganhar bilhões com isso. A vida dos entregadores não mudou uma vírgula, mas agora alguém do Vale do Silício está fazendo fortuna com isso. Isso é que não pode. Isso é que não dá, meus amigos!
Mesma coisa com os taxistas. A maioria, pobres motoristas explorados pelos donos de frotas. Mas isso não tocava os espíritos sensíveis. Foi só aparecer o Uber, o belzebu do capitalismo selvagem, e todos os amantes da humanidade se condoem da situação dos explorados.
Ruth, e os outros arquitetos da felicidade humana, apenas na superfície sonham com um mundo onde o trabalho não é “precarizado”. No fundo, eles sonham mesmo é com um mundo onde alguns não ficam “ultraricos” (palavras dela) com a “exploração” do trabalho alheio.
Obviamente, todos gostaríamos que todos tivessem empregos bons e seguros e que pagassem bem. Mas, todos também queremos que nossas pizzas sejam entregues no menor tempo possível pelo menor preço possível. E, de preferência, ao toque de um botão. Uma coisa não é compatível com a outra.