Maracanã

Bolsonaro vai levar o ministro Moro amanhã ao Maracanã. Será como nas arenas romanas, onde os assistentes pedem pela vida ou pela morte do gladiador. Bolsonaro espera que os polegares virem para cima.

Trata-se de um risco político calculado. Parece óbvio que, em um estádio lotado com torcedores que vestem as mesmas camisas que foram usadas nas manifestações de apoio à Lava-Jato, o apoio a Moro seja majoritário.

Faz sentido esse gesto do presidente? De certa forma, sim. Indubitavelmente, a Lava-Jato assumiu uma dimensão política, além da estritamente jurídica, sendo, inclusive, responsável remota pela eleição de um presidente da República. Então, é natural que ela seja defendida também no campo político, além do jurídico. Os vazamentos do Intercept têm objetivo político, o objetivo jurídico é subsidiário. Bolsonaro pretende defender a Lava-Jato no campo político com esse gesto.

Também pode haver gente que torça o nariz para essa “ligação direta” com o povo. Primeiro, porque o Maracanã de amanhã está longe de representar a totalidade do povo. Mas, mais do que isso, o problema seria conceitual: o presidente precisaria respeitar as instâncias institucionais, e não fazer ligação direta com o povo, que é a marca de governos populistas e, no extremo, ditatoriais.

Mas a popularidade faz parte das democracias. Se não fizesse, não haveria pesquisa de popularidade de presidentes. Esse canal direto, essa identificação do povo com o mandatário, faz parte do quebra-cabeças institucional. Um presidente impopular não consegue liderar o país. Temer foi uma exceção, e mesmo assim porque seu mandato foi muito curto.

Os aplausos no estádio, apesar do Maracanã não representar o povo, serão um símbolo político. Bolsonaro sabe que precisa desse símbolo para seguir em frente.

Jornalismo de fancaria

“Para a plateia de investidores que pagaram a partir de 1.500 reais pelo ingresso, os aplausos a Moro se justificam pelo bom momento do mercado acionário. Investidores têm preferido ignorar a onda de denúncias contra o ministro da Justiça e o constrangimento político causado por elas e focar a reforma da Previdência.”

Esta é a essência da reportagem da Exame sobre a participação do ministro da Justiça no evento da XP.

Segundo a Exame, ninguém ali estaria aplaudindo porque acha que Moro fez um bom trabalho, colocando um bando de bandidos na cadeia. Não. O pessoal está mesmo interessado é nos lucros da bolsa e, por isso, “prefere ignorar” a “onda de denúncias”.

“Preferir ignorar” significa ter consciência de que há algo muito errado mas, mesmo assim, deixar para lá, pois os lucros da bolsa são mais importantes. Com essa frase, a Exame sugere que os investidores são coniventes com um crime, pois “preferem” ignorá-lo, mesmo supostamente sabendo que existe.

“Onda de denúncias” é aquela frase que dá a sensação de que são muitas pessoas denunciando muitas coisas, como foi o caso, por exemplo, do Petrolão. Quando, na verdade, tem-se um jornalista comprometido com uma causa, que está usando material de origem duvidosa para denunciar uma coisa só: a suposta parcialidade de Moro. Não há onda nenhuma, há canalhice a conta-gotas.

Exame vai bem desse jeito. A julgar por essa reportagem e pelo uso de fontes duvidosas pela Veja, os novos donos da Abril vão ter trabalho para reconstruir o jornalismo por aquelas bandas.

Como você enfrentaria Bonnie & Clyde?

Atenção, contém spoilers!

No fim de semana passado, assisti Estrada Sem Lei, novo filme na Netflix. Conta a história de dois policiais aposentados (Kevin Costner e Woody Harrelson) que finalmente conseguem pegar o casal de assaltantes e assassinos Bonnie & Clyde.

Os dois policiais usam métodos, digamos, pouco ortodoxos: entram em jurisdições para as quais não têm mandato, invadem propriedades sem ordem judicial e por aí vai.

Em determinado momento, o personagem de Harrelson descreve como o personagem de Costner mata a sangue frio, em uma emboscada, um bando de assassinos ainda dormindo, pois estes se recusavam a se render. Aquilo claramente não fazia parte do código de ética da polícia, mas parecia ser a única forma de livrar os povoados daqueles bandidos.

A morte de Bonnie & Clyde se dá mais ou menos da mesma forma: uma emboscada, e tiros suficientes para matar um batalhão. O casal de bandidos já havia matado vários policiais a sangue frio, e o personagem de Costner sabia que era ele ou eles. De fato, o carro do casal estava cheio de armas, prontas a serem usadas.

Esta situação me remeteu à Lava-Jato. Um juiz e procuradores à caça de bandidos que não hesitam em usar todas as armas para fugir do longo braço da lei. Usaram métodos pouco ortodoxos? Talvez, há uma discussão a respeito. Mas a escolha está entre usar métodos pouco ortodoxos ou deixar os bandidos à solta, livres para continuar cometendo seus crimes.

Alguns dizem apoiar a Lava-Jato, elogiam os seus resultados, mas reprovam alguns de seus métodos. Não lhes ocorre que a Lava-Jato é uma coisa só, não dá pra separar os seus resultados de seus métodos. Para alguns tipos de bandidos, primeiro se “passa a bala”, depois se diz “mãos ao alto”. É isso, ou é se conformar em permitir esses bandidos soltos. Não há meio termo.

Não estou aqui dizendo que a Lava-Jato tenha usado ou não métodos pouco ortodoxos. Eu, sinceramente, não tenho condições técnicas para avaliar isso. A única coisa sobre a qual tenho certeza é que os bandidos que estavam sendo perseguidos eram dos mais ardilosos do país, e não seria com salamaleques que seriam presos.

Obviamente não se trata de uma discussão fácil, com uma solução preto no branco. São muitas nuances, mas colocar o juiz e os procuradores como bandidos e os bandidos no lugar de vítimas certamente não é uma delas. O que se discute é se se pode infringir as regras com o objetivo de fazer justiça em determinados casos, uma vez que o sistema judiciário brasileiro é feito de modo a não se conseguir condenar quem pode pagar bons advogados.

O filme mostra que Bonnie & Clyde eram adorados pela população, que os consideravam justiceiros contra os exploradores. Houve verdadeira comoção quando foram mortos, milhares de pessoas compareceram aos seus enterros. Sim, a vida imita a arte.

Moro na corda bamba

Provas obtidas por meios ilícitos não podem ser consideradas em um processo. Sendo assim, as supostas trocas de mensagens entre Moro e Dallagnol não serviriam, por exemplo, para anular a condenação de Lula. A qual, aliás, foi confirmada por duas instâncias superiores.

Mas o estrago político pode ser grande, a depender da disposição do Congresso, do Supremo e da opinião pública de acreditar nesses vazamentos e nos próximos que certamente estão por vir.

O cargo de Moro dependerá da disposição de Bolsonaro de segurar a bucha.

Mais corrupto do que nunca

O pessoal está focando na redução da pena.

Foco errado.

O STJ é o 2o tribunal que confirma a condenação de Lula dada pelo juiz Sérgio Moro. Lula é, cada vez mais, oficialmente corrupto.

PS: Não custa lembrar que a pena de Moro havia sido de 9 anos e meio. O STJ reduziu a pena em 8 meses (somente 7% abaixo da pena inicial).

Crimes correlatos

Reportagem de hoje no Estadão sobre os supostos “dissabores” de Moro em Brasília. Um dos exemplos seria a separação do crime de Caixa 2 do restante do pacote anticorrupção.

Como “prova” de que Moro voltou atrás em um posicionamento histórico, o jornalista contrapõe duas falas do atual ministro.

Aí você vai ler, e não é nada disso.

Na primeira fala, mais atual, Moro distingue os dois crimes, afirmando que ambos são graves. Na segunda, mais antiga, Moro diz que o caixa 2 é um crime grave, uma espécie de “trapaça eleitoral”. Fiquei procurando onde Moro dizia que caixa 2 é o mesmo que corrupção.

Que caixa 2 não é o mesmo que corrupção parece claro. Recursos de doações podem não ser contabilizados porque sua origem pode ter sido fruto de crime, qualquer crime, inclusive corrupção, mas não necessariamente. Pode ser, por exemplo, sonegação fiscal por parte do doador.

Que caixa 2 é uma “trapaça” eleitoral também parece claro. Um partido que não contabiliza os recursos que recebe tem vantagem ilícita sobre outro que contabiliza, pois amplia irregularmente o leque de potenciais doadores. Novamente, isso pode ou não ter a ver com corrupção, a depender da origem do dinheiro, mas são crimes diferentes.

Os dois textos de Moro, separados por 3 anos, são claros: ambos condenam o caixa 2 e nenhum deles diz que caixa 2 é equivalente a corrupção. Das duas uma: ou o jornalista que escreveu a matéria não consegue fazer a interpretação do texto e realmente acredita naquilo que escreveu, ou está de má fé. Assim como caixa 2 e corrupção, incapacidade de ler um texto e má fé são crimes diferentes, ainda que possam ser correlatos.

Comissão super-partidária

“Comissão supra-partidária”.

Hahahahshahhahahahshshhshshshshs

Alem dos intelequituais de sempre, temos a abrilhantar a tal comissão a presença do nobre advogado Mariz de Oliveira, defensor dos direitos humanos dos “criminosos-de-colarinho-branco-que-podem-pagar-advogados-milionários-para-adiar-ad-eternum-suas-condenações”. Não surpreende que o primeiro alvo da tal comissão seja o pacote do Moro.

Esse pessoal é muito previsível.

O “pobre e negro” usado como escudo

Isso que vai abaixo é uma crítica ao “plea bargain” proposto por Moro.

Fico imaginando quantos clientes pobres e negros o especialista em DIREITO SOCIETÁRIO atende em seu escritório.

Esta é, em geral, a tática dos advogados criminalistas e empresariais: escondem-se atrás do coitado que nem advogado tem, para criticar mudanças na lei que prejudicariam seus ricos e bem relacionados clientes. Cansa, viu!