Faz parte do trabalho no mercado financeiro a leitura de muitos relatórios. Uma regra básica de qualquer relatório é o “esclarecimento de conflito de interesses”, ou seja, se o autor do relatório tem algum interesse particular na empresa que está analisando. Esse interesse pode ser a detenção de ações da empresa analisada no relatório ou um parente que trabalhe naquela empresa ou, o que é mais comum, se a casa de análise onde o analista trabalha tem algum contrato firmado com a empresa analisada. Neste último caso, inclusive, é prática comum a casa de análise deixar de produzir relatórios sobre aquela empresa específica.
Todos esses cuidados têm uma razão óbvia: como confiar na análise de alguém “conflitado”, como se diz? Podem ser até análises isentas, mas sempre restará a dúvida sobre a sua lisura, dado o conflito de interesses presente.
Esse ponto me veio à mente quando me deparei com artigo no Estadão de hoje do advogado Sérgio Eduardo Mendonça de Alvarenga.
Antes de ler qualquer artigo, a primeira coisa que faço é checar as credenciais de quem escreveu. Não se trata de fazer críticas ad hominem, gosto de ler contra-argumentos que desafiem minhas convicções, independentemente de quem escreve. Mas as credenciais fornecem dois elementos importantes para enquadrar o artigo: 1) o grau de conhecimento e especialização do autor do artigo e 2) seus potenciais conflitos de interesse.
Ao se qualificar tão somente como “advogado”, o Dr. Sérgio Alvarenga qualifica-se como alguém 1) especialista e 2) isento. Fui então ler o artigo, para daí tentar extrair algo que pudesse me fazer mudar de ideia a respeito das duas recém estapafúrdias decisões do STF: a mudança de foro e a suspeição de Moro. O que li foram afirmações a priori, interpretações particulares do direito, colocadas como verdades absolutas. E o que é pior, longe do alcance dos “leigos”, que não estariam aptos a entender as filigranas da ciência jurídica. Como se sob a capa do palavrório técnico dos operadores do direito não se escondesse uma realidade plenamente inteligível para quem é alfabetizado.
Depois de ler o artigo, fui atrás de saber quem era o “advogado”, autor do repto anti-Moro. Sérgio Alvarenga é genro e sócio de Mariz de Oliveira, do escritório de mesmo nome, que extrai seu sustento explorando competentemente as chicanas de nosso sistema judicial, com seus infinitos recursos à disposição de quem pode pagar caras bancas de advocacia. Além disso, foi (não sei se ainda é), advogado de Roberto Teixeira da Costa, compadre de Lula e seu “assessor” no rolo do sítio de Atibaia.
Advogar para Lula, para Teixeira da Costa ou para qualquer outro endinheirado não é crime, pelo contrário. Trata-se de uma profissão como outra qualquer. Afinal, todos têm direito ao devido processo legal com a ajuda de um advogado. O que não dá é escrever um artigo no jornal sem fazer o disclaimer de seus eventuais conflitos de interesse no caso, levando o leitor a achar que está diante de uma opinião isenta.