Síndrome Respiratória Aguda Grave: 2020 vs. 2009

Fui dar uma olhada no site da Fiocruz, o InfoGripe, com os agora resultados definitivos da Covid-19 em 2020. São várias e diversas conclusões interessantes.

Este site é bem interessante porque fornece várias informações que você não encontra em nenhum outro lugar: histórico de doenças respiratórias, estratificação por idade e por gênero, evolução temporal, distribuição geográfica, etc.

Comecemos pela comparação entre esta epidemia de 2020 com a epidemia de H1N1 em 2009. Para poder comparar, considerei o total de óbitos por SRAG (Síndrome Respiratória Aguda Grave), que inclui a Covid e outras doenças respiratórias. Como não há motivo para crer que houve uma piora dessas outras doenças (na verdade deve ter havido uma melhora, devido às medidas de distanciamento social), a diferença entre 2009 e 2020 deve se atribuir somente à Covid.

Observe como a curva da H1N1 é muito mais aguda, atingindo o pico rapidamente na 28a semana epidemiológica (3a semana de julho, que corresponde à sazonalidade normal da gripe), caindo rapidamente depois disso. Já no caso da Covid-19, houve um aumento de óbitos que demorou cerca de 7 semanas para atingir o pico, para depois cair muito mais lentamente. Este pico foi na 18a semana epidemiológica, primeira semana de maio, o que não corresponde à sazonalidade da gripe comum. E o pior: houve uma retomada a partir da 45a semana epidemiológica (2a semana de novembro), que não tem NADA a ver com sazonalidade gripal. E estamos atingindo novo pico agora em março, em pleno verão. Ou seja, acho que já ficou claro que não se trata de uma gripe como outra qualquer, como era a H1N1.

Outro ponto: observe a escala desses gráficos. O pico em 2009 foi de 0,14 óbitos/100 mil habitantes/semana, enquanto o pico em 2020 foi de 3,6 óbitos/100 mil/semana, 25 vezes maior. O total de óbitos não está nestes gráficos, mas está no site: em 2009 tivemos um total de 2.297 óbitos por SRAG; em 2020 foram 294.179, a bagatela de 128 vezes maior. O número total é várias vezes maior do que o pico porque, como disse anteriormente, a curva demorou mais a subir e demorou mais cair, além de termos uma retomada no final do ano, fazendo com que a área debaixo da curva (que é o número total de óbitos) fosse bem maior em 2020 do que em 2009.

Uma observação sobre este número de 294.179 óbitos. No site da Fiocruz, é possível separar o número de óbitos por Covid do número de óbitos por influenza: por Covid foram 195.916 (número próximo aos 194.949 reportados pelo Ministério da Saúde em 31/12/2020), enquanto os óbitos por gripe foram meros 310. Onde está a diferença de quase 100 mil óbitos não classificados como Covid ou como gripe? Não sei. São mortes por SRAG sem diagnóstico. Será que este número de óbitos por Covid está sub-avaliado? Fica a questão.

Agora vamos a uma comparação por idade. Sabemos que a Covid afetou mais os mais velhos. Mas, quanto mais?

Veja no gráfico abaixo que a grande concentração de óbitos por Covid se deu na faixa de 60 anos para cima, ao passo que, em 2009, os óbitos estão bem distribuídos em todas as faixas etárias. Mais uma evidência de que não se trata de uma gripe comum, mas algo diferente.

Ainda analisando os efeitos nas faixas etárias, elaborei outro gráfico para mostrar o drama dos mais velhos: o número de óbitos acumulados por faixa etária. Observe que, enquanto o total brasileiro foi de 1.432 óbitos/milhão por SRAG, na faixa dos 60+ o número total atingiu incríveis 7.759 óbitos/milhão.

Finalmente, vamos a uma análise por gênero, que, pelo menos para mim, foi uma surpresa: enquanto a H1N1 vitimou proporcionalmente mais mulheres, a Covid mata proporcionalmente mais os homens. É o que podemos observar no gráfico de Proporção por Gênero. Portanto, se você pertence ao gênero masculino, tome mais cuidado: o vírus gosta mais de você.

Covid vs. H1N1

Fazia tempo que não pesquisava sobre a Covid. Talvez porque tenha se tornado um assunto batido, sem muita novidade. Fui olhar o site da Fiocruz, que faz o monitoramento da SRAG (Síndrome Respiratória Aguda Grave) no país. Gosto especialmente deste site porque saímos daquela discussão sobre “é Covid, não é Covid”. Aqui, a estatística é sobre SRAG, que pode ser Covid ou não. Como, ao que consta, não há outra doença respiratória grave por aí, grande parte dessa estatística deve ser Covid.

Pois bem. Comparei os números de 2009, ano da H1N1 e de 2020. 2009 havia sido o pior ano de SRAG até agora. Então, serve como parâmetro de um “ano ruim”. Duas coisas me chamaram especialmente a atenção:

1) O número de óbitos bateu o pico de 3,5/semana/100 mil habitantes, e ficou pelo menos 10 semanas na faixa de 2,5/semana/100 mil. Em 2009, o pico foi de meros 0,14/semana/100 mil, e caiu rapidamente.

2) Isso aconteceu com um número de casos não tão maior do que 2009: naquele ano, o pico foi de 6 casos/semana/100 mil, ao passo que, em 2020, foi de 10,5 casos/semana/100 mil. Podemos observar, também, que há um platô de casos em 2020, entre 9 e 10 casos/semana/100 mil que durou cerca de 15 semanas, coisa que não aconteceu com a SRAG em 2009, que atingiu um pico e logo caiu.

Observando estes dois pontos em conjunto, podemos concluir que:

1) A letalidade da SRAG em 2020 é muitas vezes maior que a letalidade em 2009. Tivemos taxa de óbitos cerca de 20 vezes maior em 2020 comparado com 2019, com um número de casos apenas 1,5 vez maior.

2) O surto de SRAG de 2020 é de natureza completamente diferente do surto de 2009: enquanto em 2009 o surto atingiu um pico e caiu rapidamente sem grandes medidas de isolamento social, o pico de 2020 persistiu durante muitas semanas, MESMO COM MEDIDAS DE ISOLAMENTO SOCIAL. Fico imaginando o que teria acontecido sem essas medidas.

Como eu disse, fazia tempo que não dava uma olhada nos números da SRAG. Olhando em retrospecto, estes números levam-me a concluir que a coisa é bem mais grave do que eu imaginava no início, quando fiz as primeiras análises com base nesses gráficos. A análise definitiva da catástrofe somente poderá ser feita quando tudo estiver terminado, usando estatísticas de causa mortis. Isso deve levar pelo menos mais um ano. De qualquer forma, parece que não é só uma “gripezinha”.

Estatísticas da Covid-19

Depois de 3 dias com número de óbitos na casa dos 400, hoje tivemos novamente um número abaixo de 200. Como eu acompanho a média móvel de 3 dias justamente para suavizar essas oscilações, fizemos um pico ontem e agora começamos a cair novamente.

A curva brasileira, além de ser mais baixa do que Europa/EUA, tem uma característica diferente: ela sobe em “ondas”, ao contrário das outras duas, que subiram sem respiro. Já é o quarto pico consecutivo ascendente. O curioso é que esses picos ocorrem mais ou menos semanalmente: foram nos dias 23, 29, 36 e agora 44 depois do caso #150. Parece que ocorre um represamento de casos com periodicidade semanal (fim de semana?).Os picos de Europa e EUA foram no dia 44. Ou seja, se for este o padrão, estamos no pico. Na verdade, mesmo depois de atingido o pico, a Europa ainda mostrou números de óbitos próximos do pico por cerca de duas semanas (até o dia 58), e só na última semana começa a cair mais fortemente (estamos no dia 65). Os EUA ainda estão próximos do pico (eles estão no dia 53). A queda demora a ocorrer, é muito lenta.

Se seguirmos o padrão de Europa/EUA, ficaremos nos atuais patamares de óbitos (oscilando entre 200 e 400/dia) por ainda duas semanas, para só então começar a cair. Caso o número de óbitos salte de patamar (para 600/dia, por exemplo, então significará que não estamos seguindo o padrão, e aí vai ser difícil fazer qualquer previsão). O número de óbitos per capita muito menor que na Europa/EUA é em si uma excelente notícia. Mas é preciso que continue assim, e não aumente sem limite.

Agreguei o gráfico mais atualizado da Fiocruz, mostrando a atualização dos casos de SRAG (Síndrome Respiratória Aguda Grave) até a 16a semana epidemiológica (hoje entramos na 18a). A curva vermelha vinha declinando mas voltou a subir, e atingiu o patamar de 5,25 casos/100 mil habitantes. Vale lembrar que o pico da H1N1 em 2009 foi de 5,75. Mas vale ressaltar que essa linha vermelha é uma estimativa, cujo erro provável é dado pelas linhas pontilhadas pretas. Portanto, ainda pode ser revista.

SRAG: diferenciação por estados

No post anterior, publiquei os gráficos com a evolução de casos de SRAG (Síndrome Respiratória Aguda Grave). Aqueles gráficos são do país inteiro. Há Estados muito melhores e Estados muito piores que a média.

O pior Estado é o Ceará. Com 10,6 casos/100 mil habitantes, é o que apresenta o maior índice no país (a média brasileira está em 4,0). E, como podemos ver no gráfico, não houve estabilização de casos até o momento.

Em São Paulo, o número de casos também fica acima da média (7,6), mas a curva já está caindo.

Já no Rio, o número de casos está um pouco acima da média (4,8), mas a tendência de elevação ainda não se reverteu.

Outros Estados onde a curva ainda não se reverteu são PA, RN, BA, GO, MG, ES e PR. Cabe destacar que para alguns Estados, principalmente no Norte/Nordeste, os dados são mais frágeis/defasados.

Estamos próximos do pico?

Saiu o último dado de incidência de SRAG (Síndrome Respiratória Aguda Grave), da Fiocruz, referente à semana epidemiológica 15 (05 a 11/04) – gráfico TOTAL.

Podemos observar que a linha vermelha (estimativa) começou a cair. Antes dessa última atualização, a semana 14 apresentava estabilidade, mas agora apresenta queda também, que se acelerou na semana 15. Ou seja, temos duas semanas de queda. A linha preta representa os casos notificados, e que podem ser revisados ainda.

Coloquei outros dois gráficos, mostrando os casos notificados de INFLUENZA e COVID.

Prestem atenção nas escalas: o gráfico TOTAL tem seu pico na 13a semana, em 4,5 casos para cada 100 mil habitantes. O pico da INFLUENZA é na 12a semana, com 0,1 casos, enquanto o pico da COVID é na 13a semana, com 0,8 casos. Ou seja, temos 80% dos casos de SRAG que simplesmente não foram identificados até o momento. Como teste de influenza é muito mais acessível, podemos concluir que a chance de ser Covid é bem maior.

Observe também que houve um pico de influenza fora da sazonalidade, entre a 10a e a 13a semana (01/03 a 28/03). Meu filho teve influenza, por exemplo, na primeira semana de março. Foi ao hospital e fez o teste para influenza, que deu positivo.

Já o gráfico da Covid mostra um pico e depois uma queda acentuada. Mas lembremos que esse gráfico representa somente os casos notificados, que demoram a chegar ao sistema. Esse gráfico ainda vai ter o seu aspecto bem modificado.

Em resumo: as medidas de distanciamento social fizeram com que os problemas com SRAG fizessem o seu pico na 13a semana (22/03 a 28/03), e começassem a cair desde então. E um pico (4,5) abaixo do pico da H1N1 em 2009 (5,75). Estes dados são animadores, e podem estar indicando que estamos já próximos do pico. Mas trata-se de um pico ainda muito alto, e que pressiona o sistema de saúde. E lembremos que se trata de estimativas, que podem ser revisadas tanto para cima quanto para baixo.

Síndrome Respiratória Aguda Grave

O site Info Gripe, mantido pela Fiocruz, apresenta estatísticas bastante completas de hospitalizações por SRAG (Síndrome Respiratória Aguda Grave). Isso inclui todas as doenças respiratórias, incluindo a Covid-19, mesmo que não notificada. Coloquei aqui 3 gráficos retirados do site, dos anos de 2009, 2016 e 2020.

Em primeiro lugar, observe como, em cada gráfico, há um “monte” no meio, com camadas verde, amarela e laranja. Esse “monte” representa os casos sazonais de gripe, com o pico no meio do ano. As cores representam a severidade crescente do surto. Este nível de severidade é a média dos anos “normais”: 2010, 2012, 2013, 2014, 2015 e 2017. Em 2009 e 2016 tivemos picos anormais, enquanto em 2011, 2018 e 2019 tivemos números bem abaixo da média.

Cada número no eixo x representa uma semana epidemiológica. Por isso, o gráfico vai até o número 52.Comecemos pelo gráfico de 2009. Este é o surto de H1N1. Observe que ele começa a acelerar na 28a semana epidemiológica, fazendo o seu pico 3 semanas depois. O pico da gripe sazonal é na 27a semana epidemiológica. ou um mês antes. Portanto, a H1N1 não respeitou a sazonalidade.

Em 2016, novo surto de H1N1, desta vez começando a acelerar na 9a semana e atingindo o pico 4 semanas depois. Bem distante, portanto, do “pico sazonal”. Observe também a escala: enquanto em 2009 o pico foi em 5,75 hospitalizações para cada 100 mil habitantes, em 2016 o pico foi 1,5. Portanto, em 2016 foi um “mini-surto”, comparado com 2009.Vamos para 2020. Em primeiro lugar, observe que a linha é vermelha, ladeada por duas linhas pontilhadas pretas. Isso acontece porque se trata de uma estimativa estatística, que depois se confirmará com os dados reais. Nos gráficos dos outros anos, já se trata de dados reais. Observe que a aceleração começou na 11a semana (08/03 a 15/03). Os dados vão até a 14a semana (27/03 a 04/04). Portanto, temos uma defasagem de uma semana nos dados, pois a 15a semana terminou ontem.

E o que podemos observar nos dados de 2020? Algumas coisas:

1) Se tivéssemos a mesma tendência de 2009, teríamos atingido o pico na 14a semana (27/03 a 04/04), com 5,75 hospitalizações/cem mil habitantes. No entanto, na 13a semana estávamos com uma estimativa de hospitalizações entre 2,75 e 6,25, com valor esperado de 4,25. Ou seja, houve claramente um achatamento da curva de hospitalizações. Tivemos 1,5 hospitalizações a menos do que a crise de H1N1 de 2009, na mesma época. Cabe ressaltar, no entanto, que esta estimativa é ainda bastante preliminar.

2) O surto não tem nada a ver com sazonalidade. Observe como a gripe sazonal provoca um número muito pequeno de hospitalizações se comparado com os surtos de 2009 e agora o de 2020. São 0,75 para cada cem mil habitantes no nível laranja, que é de atenção. Portanto, não cabe o receio de segurar o surto agora para deixá-lo crescer depois, coincidindo com a gripe sazonal. Os números da epidemia são tão maiores do que os da gripe sazonal, que este tipo de cálculo perde o sentido.

3) Se não houvesse “achatamento”, onde estaríamos agora? Se a regra fosse a mesma da H1N1, provavelmente estaríamos hoje (14a semana) em 7,5 hospitalizações/milhão de habitantes, ultrapassando o pico da H1N1. Mas o problema não é esse. O problema é onde iríamos parar. O pico da H1N1 ocorreu três semanas depois de iniciada a aceleração, pois se tratava de uma variante da influenza, que começou a ser tratada com tamiflu, remédio já conhecido. No caso do coronavírus, estamos tateando ainda, pois não é um tipo de influenza. Provavelmente, o pico não teria chegado ainda, não fossem as medidas de contingenciamento.

Em um post anterior, eu havia afirmado que acompanhar o número de hospitalizações poderia dar uma noção melhor do andamento da epidemia. Estas informações podem ajudar a entender o problema, ainda que sejam estimativas defasadas.