O monotrilho que ligaria o aeroporto de Congonhas até outros modais de transporte foi contratado em 2011 para ser entregue para a Copa de 2014. Geraldo Alckmin era o governador na época, e só saiu do Palácio dos Bandeirantes 8 anos depois. A sucedê-lo tivemos João Doria, que ficou quase 4 anos à frente do governo paulista. Nem Alckmin, nem Doria conseguiram entregar o monotrilho, ainda que, no caso deste último, existe a desculpa da pandemia.
Como sabemos, Geraldo Alckmin, hoje, está exercitando a sua habilidade de fazer belos discursos e não entregar nada no Ministério da Indústria e Comércio. Doria voltou para o ramo de show business, que é a sua praia.
Vamos ver agora se Tarcísio resolve. Pelo menos parece que é do ramo. O presidente do metrô (empresa que irá operar a linha depois de pronta) pronunciou sábias palavras: “não vamos celebrar o anúncio da retomada das obras. A sociedade paulistana espera a entrega”. No dia em que os políticos brasileiros inaugurarem tantas obras prontas quanto canteiros de obras, seremos um país rico.
O governador teve uma “excelente” ideia: vamos mover o fluxo para junto de um equipamento de assistência a drogados. Assim, quem sabe, o pessoal voluntariamente se apresente para tratamento. A ideia deve partir do pressuposto de que os drogados não buscam tratamento porque não têm dinheiro para o ônibus…
Minha mãe mora no Bom Retiro, não muito próximo mas também não muito distante desse local. Com que tranquilidade eu deixaria minha mãe, que tem quase 80 anos, morando sozinha nessa região? Eu tive uma outra ideia: que tal montar um centro de reabilitação ali no Morumbi, próximo ao Palácio dos Bandeirantes, e levar o fluxo para lá? Equipamentos de apoio a drogados são como presídios e usinas nucleares: todo mundo acha muito importante existirem, desde que não seja na sua vizinhança.
A reportagem traz a infalível entrevista com um especialista, no caso, uma antropóloga.
Claro que houve rasgados elogios ao programa do então prefeito Haddad, o “de braços abertos”, que teria sido desmontado por almas insensíveis como as de João Doria e Bruno Covas. Não lhe ocorre que, se o programa estivesse realmente funcionando, não precisaria haver ação alguma. A lógica da especialista é estranha, pois supõe que Doria e seus sucessores agiram para criar um problema para si próprios. E o mais hilário é a antropóloga pedir desculpas por usar a palavra “civilizado” para referir-se a uma cracolândia sob controle, um termo que pode ser considerado higienista. É como se tivesse usado o termo entre aspas, para dizer aquilo que todo mundo gostaria de dizer, mas que ficaria muito mal na boca de alguém tão sensível às causas sociais.
O fluxo é formado por seres humanos, que merecem ser tratados com toda a dignidade. O problema, claro, está no local escolhido para serem tratados com toda a dignidade. É muito fácil falar quando não se tem o problema na porta de casa.
“Cavalo selado passa só uma vez”. Esse dito popular, que serve como um alerta para não perdermos as raras boas oportunidades que o destino nos reserva, cai como uma luva para a política. No jogo político, são raras as oportunidades de se destacar, de sair da pilha e tornar-se um “top of mind” da população. Tarcísio de Freitas soube perceber o cavalo selado da reforma tributária, montou e saiu maior do que entrou nesse processo.
O governador de São Paulo, fazendo a leitura correta do cenário político, percebeu que a reforma tributária já estava encaminhada, e seria tolice simplesmente cruzar os braços e esperar pelo desfecho. Ao invés disso, foi à luta: mobilizou a bancada paulista e outros governadores, e conseguiu emplacar uma regra favorável aos grandes estados na composição do Conselho Federativo. Portanto, nem a composição ficou refém dos pequenos estados, nem as regras ficaram para lei complementar, que eram dois dos receios legítimos de quem torcia o nariz para a ideia.
Confesso que normalmente não boto muita fé em tecnocratas alçados ao poder político pelas mãos de um padrinho poderoso. Está aí o exemplo de Dilma, um desastre político. No entanto, Tarcísio passou pelo seu primeiro teste: mostrou capacidade de articulação, composição e liderança, requisitos indispensáveis para quem almeja governar.
Claro que Bolsonaro e suas hostes não gostaram nada. Um ideológo bolsonarista tuitou que Tarcísio é um “neo tucano”. O governador de São Paulo já recebeu o fatwa do aiatolá da Barra, e seu nome, daqui em diante, será maldito em todos os cantos do reino bolsonarista. Foi uma jogada de risco do governador, considerando que Bolsonaro ainda mobiliza uma parcela relevante do eleitorado. De qualquer forma, as eleições de 2026 ainda estão distantes, e muita água vai rolar. De tudo isso, fica a mudança de patamar de Tarcisio de Freitas, de uma apadrinhado de Bolsonaro para alguém com luz própria. Não é pouca coisa.
No sábado passado, dia 24/06, comentei aqui um artigo de Mailson da Nóbrega, a respeito da reforma tributária, que criticava a pretensão de autonomia dos estados em detrimento de mais eficiência e produtividade.
Dois dias antes, 22/06, no mesmo Estadão, Felipe Salto havia feito um duro ataque ao Conselho Federativo, órgão a ser criado para a gestão do IVA. Eu havia lido o artigo de Salto, mas naquela momento ainda não havia percebido do que realmente se tratava. Destaco abaixo o trecho central do artigo, atacando a retirada da autonomia dos estados.
Mailson, dois dias depois, ataca o cerne da questão: é justamente a autonomia dos entes subnacionais que cria o pesadelo tributário em que vivemos e diminui a nossa produtividade.
Salto não diz explicitamente porque os estados fazem tanta questão de gerenciar seus próprios impostos. Aliás, nem se dá ao trabalho de definir o que seja “gerenciar”. Mas dá duas pistas em seu texto, ao apontar os problemas que o Conselho Federativo vem resolver: o risco de crédito dos entes subnacionais (um estado não repassar para o outro um crédito tributário) e a guerra fiscal entre estados. Para ambos, Salto sugere “punições severas”. Ora, e desde quando “punições severas” seguraram gestoras públicos? A LRF não impediu que estados virtualmente quebrassem, e depois encontrassem abrigo em um STF muito sensível a questões sociais. Um dos pilares do Plano Real foi justamente o fim dos bancos estaduais, ralos através dos quais os estados exerciam a sua autonomia. Ninguém pensou em substituir a privatização dos bancos estaduais por “punições severas”. A coisa só funciona com base na arquitetura da solução, não na base de leis punitivas, das quais o Brasil está cheio.
Salto sugere, ao invés da reforma tributária, uma reforma infraconstitucional do ICMS, mudando sua incidência da origem para o destino, e deixando assim, intacto, o manicômio tributário. Afinal, para que manter a autonomia, se não for para ter 27 diferentes legislações tributárias, que tanto infernizam a vida do empreendedor, principalmente o industrial? Tanto é assim, que o tal Fundo de Compensações que está sendo negociado entre União e Estados servirá justamente para compensar os efeitos do fim da guerra fiscal. Com a autonomia, os entes subnacionais poderiam continuar alegremente sua marcha batida para o precipício.
É triste ver o governador Tarcísio de Freitas liderando essa resistência dos estados. Em 1997, o “socialista” Mário Covas liderou, com não poucas resistências, o processo de privatização dos bancos estaduais, ele mesmo patrocinando a privatização do Banespa, e, alguns anos depois, a incorporação da Nossa Caixa ao Banco do Brasil. Hoje, o “liberal” Tarcísio de Freitas lidera no sentido oposto, o de manter o status quo que mina a nossa produtividade. A questão, como se vê, nao é ideológica, mas de estatura do governante.
Assim como hoje, há 4 anos Gilberto Kassab ganhava o status de “homem forte” do governo de São Paulo. Foi alvejado por uma operação da PF antes de levantar voo, pediu licença do cargo que nem chegou a exercer e sumiu. Foi emergir somente este ano, levando o seu PSD a apoiar Tarcísio em São Paulo e a ficar neutro no plano nacional.
Tarcísio, assim como Doria, foi comer na mão de Kassab para formar uma base no legislativo. Que diferença para o discurso anti-política de 2018, em que os bolsonaristas enchiam a boca para cantar em verso e prosa as virtudes da Nova Política. Qualquer ponderação em contrário (e fiz várias ao longo de 2019) era recebida com a foto das malas de dinheiro no apartamento de Gedel Vieira Lima, sugerindo que negociação política era sinônimo de corrupção. Bolsonaro, o campeão da honestidade e pureza, jamais iria capitular para o sistema político, pois o povo nas ruas iria sustentá-lo.
Que diferença quatro anos fazem. Bolsonaro uniu-se a Ciro Nogueira (!) e Valdemar da Costa Neto (!!!) e Tarcísio, a mais preciosa joia do bolsonarismo, uniu-se a Kassab, em um reconhecimento implícito (nunca explícito!) de que a tal Nova Política era uma grande bobagem.
Não existe velha política e Nova Política. Existe política e corrupção. A política é a nobre arte da negociação para alcançar o bem comum. A corrupção é a transformação dessa negociação em negociata. Assumir que toda negociação é, em princípio, uma negociata, levou à patética Nova Política, um beco sem saída.
Amigos, estou inaugurando hoje a Gutercheck, a agência de verificação das agências de verificação. Aqui você terá a leitura correta da mensagem dos candidatos, substituindo as interpretações robóticas e literais das agências por uma interpretação política. Porque acredito que a política não pode ser substituída por algoritmos.
Começamos hoje com o Estadão Verifica, que checou as informações citadas por Tarcísio de Freitas em sua sabatina no jornal.
Tarcísio: “o Brasil é o único país do mundo que cresce com deflação”
Estadão Verifica: “apesar de ter deflação em um mês, no ano temos inflação”
Gutercheck: o candidato estressou a inflação de curto prazo em seu discurso. Qualquer brasileiro sabe que temos inflação, não deflação, para isso não precisamos de agência de checagem. Ou a agência queria que o candidato do governo afirmasse que temos uma inflação de 12 meses muito alta? Para isso já temos seus adversários.
Tarcísio: “temos o melhor resultado do emprego em mais de 10 anos”
Estadão Verifica: ”em dezembro de 2014 tivemos desemprego de 4,3%, bem menor que os 9% projetados pelo candidato”
Gutercheck: em primeiro lugar, de acordo com a PNAD do IBGE, o desemprego foi de 6,6% em dezembro de 14, então nem acertar o número eles acertam. Ainda assim, menor que os 9% do candidato. Mas o ponto principal é que o candidato quis estressar que fazia muito tempo que não tínhamos um desemprego tão baixo, o que é verdade. A última vez que tivemos desemprego de um dígito foi em dezembro de 2015, ou seja há vários anos. O discurso do candidato quis enfatizar esse tempo, e usou “mais de 10 anos” como uma forma de fazê-lo. Lembremos que ele não é um professor dando aula, ele é um político procurando passar uma mensagem.
Tarcísio: “o governo Bolsonaro gerou 4,7 milhões de empregos de 2020 para cá”
Estadão Verifica: “o número correto é 3,9 milhões de empregos”
Gutercheck: na ponta do lápis, nem um nem outro estão corretos. Pra começar, “desde 2020” é uma expressão ambígua. Se considerarmos os anos de 2021 e 2022 (até junho) são 4,2 milhões de vagas. Se considerarmos o ano de 2020 na conta, são 4,4 milhões. Se considerarmos desde julho de 2020, quando a economia começou a se recuperar do pior da pandemia (que acho que é a mensagem que o candidato queria passar), são 5,6 milhões de empregos. Mas todas essas contas são bobagem. A mensagem política é que o governo Bolsonaro criou “milhões” de empregos desde a pandemia. Se foram 3,9, 4,7 ou 5,6 milhões, é irrelevante para o discurso político. A exatidão do número só importa para gente que tem na picuinha a sua razão de viver.
Márcio França rendeu-se às evidências e vai concorrer ao senado na chapa de Haddad. Sua candidatura, no final, era uma candidatura de si próprio. Enquanto Haddad representa Lula, Tarcísio representa Bolsonaro e Garcia tem a máquina do governo, França só tinha a seu favor o recall da última eleição. A tendência, já captada em pesquisas, era perder votos para Tarcísio e, principalmente, Garcia.
Com Márcio França fora do páreo, praticamente consolida-se um 2o turno entre Haddad e o vencedor entre Tarcísio e Garcia. Esse confronto entre o 2o e o 3o lugares é, na minha opinião, uma espécie de final antecipada. O antipetismo do interior do estado é um teto quase intransponível para qualquer candidato do PT no estado. Portanto, meu palpite é que o próximo governador será Tarcísio ou Garcia.
Tarcísio tem a vantagem e a desvantagem de estar colado a Bolsonaro. A vantagem óbvia é ter um piso alto, por conta do eleitorado cativo do mito. A desvantagem é o anti-bolsonarismo, que é uma força que extrapola o simples petismo, e pode significar um teto baixo de votos. Aliás, eu diria que Haddad está torcendo para ter Tarcísio no 2o turno. Tarcísio aumentaria suas chances se conseguisse, de alguma maneira, descolar sua imagem da de Bolsonaro. Não perderia os votos da base bolsonarista e poderia ganhar alguns votos daqueles que rejeitam o presidente. Foi o movimento que Zema, por exemplo, fez em Minas, não aceitando uma composição com Bolsonaro no 1o turno. Mas, para Zema, é mais fácil do que para Tarcísio.
Garcia, por sua vez, tem a vantagem e a desvantagem de ter a máquina do governo. A vantagem óbvia é ser o representante de uma teia de apoios construída nos últimos 30 anos pelo PSDB no estado. A desvantagem é a fadiga de material. O PSDB, tal qual o conhecíamos, acabou em 2018, com a votação nacional pífia de Alckmin, e Doria sendo eleito aos 45 minutos do 2o tempo pendurado nas bolas de Bolsonaro. Se Tarcísio é um forasteiro em São Paulo, Garcia é um forasteiro no PSDB, tendo se filiado ao partido apenas em 2021. Daquele velho PSDB que dominou a política paulista nas últimas décadas, restam apenas as 4 letras. Será o suficiente para empurrar a candidatura de Garcia?
Enfim, o cenário da eleição em São Paulo vai se afunilando. O mais provável, na minha opinião, é que tenhamos o repeteco da polarização nacional aqui também.
Já disse aqui mais de uma vez: Gilberto Kassab é uma das raposas mais felpudas do cenário político nacional. Quando fundou o seu partido, o PSD, afirmou que não seria “nem de esquerda, nem de direita, nem de centro”. É isso. O PSD é um partido que fareja o poder e cola nele.
Pode-se não apreciar o estilo, mas não deixa de ser útil observar os movimentos de Kassab para entender para onde sopram os ventos da política. Hoje, por exemplo, o presidente do PSD afirma que, em São Paulo, é “anti-petista” e ”anti-tucano”. Kassab foi ministro de Dilma e secretário de Doria, mas isso são meros detalhes. E, para justificar as conversas com Tarcísio de Freitas, afirma que o ex-ministro da infraestrutura “não é bolsonarista”. Kassab quer manter distância regulamentar de Bolsonaro, o que não o impede de fazer acordos com o “não-bolsonarista” Tarcísio.
Enfim, tudo isso para dizer que Kassab, a essa altura do campeonato, poderia muito bem estar pulando no barco de Haddad, mas está conversando com Tarcísio. A conversa com França é só para disfarçar, França tem poucas chances de ir ao 2o turno contra Haddad no congestionado quadro eleitoral paulista. Se Kassab escolheu o barco de Tarcísio, é porque o cheiro de poder está mais forte por lá.
Duas notinhas, uma em seguida da outra, definem o que será a eleição para o governo de SP.
Na primeira, enterra-se a possibilidade de impugnação da candidatura do carioca Tarcísio de Freitas. Ao contrário do paranaense Sérgio Moro, Tarcísio alugou imóvel em uma cidade do estado. Portanto, tinha endereço fixo, suficiente para provar seu “vínculo” com o estado. Como se vê, não era muita coisa o que precisaria ser feito para conseguir provar o domicílio eleitoral. Mas, em uma carreira política marcada pelo improviso, Moro nem sequer isso conseguiu.
Na segunda nota, fica claro que o próximo governador será um desses três nomes: Tarcísio de Freitas, Márcio França ou Rodrigo Garcia. Qualquer um dos três se beneficiará do voto antipetista no 2o turno. É provável que Haddad possa atrair o voto anti-bolsonarista se o seu adversário for Tarcísio de Freitas, mas não creio que esse contingente seja suficiente para lhe dar a vitória. Para tanto, seria preciso que chegasse ao 2o turno com mais de 40% dos votos, o que parece bem improvável. Contra Márcio França ou Rodrigo Garcia, a derrota de Haddad seria ainda mais acachapante, pois não contaria com o voto anti-bolsonarista.
Enfim, treino é treino, jogo é jogo, eleição é uma caixinha de surpresas, mas acho que o quadro eleitoral paulista está bem delineado.
Muito bacana a história do ministro da infraestrutura, Tarcísio Freitas.
Foi chefe do DNIT (do DNIT!) na gestão Dilma Rousseff, liderou a PPI na gestão Temer e agora chefia um ministério-chave para o crescimento econômico brasileiro na gestão Bolsonaro.
Tarcísio Freitas é a prova acabada de que pode haver servidores públicos excelentes em qualquer governo.