Nem a realidade os detém

Fernando Haddad, no primeiro debate entre os candidatos ao governo de SP, afirmou que é completamente contra a privatização da Sabesp. E foi além: afirmou que as tarifas de energia elétrica e das telecomunicações são altas por causa da privatização.

Fazendo um pouco de arqueologia jornalística, não foi difícil encontrar pérolas do tempo das telecomunicações estatais. A reportagem abaixo é de 27/12/1992.

Ao ler a reportagem nos lembramos que as linhas telefônicas eram consideradas investimentos, que competiam com o dólar paralelo, o ouro e as ações, e sua cotação dependia da perspectiva de a Telebrás conseguir ou não suprir a demanda por linhas.

Mas o mais cruel é observar que as linhas mais caras eram justamente aquelas localizadas na periferia. Guaianazes, São Mateus, Itaquera e Parelheiros lideram os preços. Para se ter uma ideia, R$ 45 milhões (preço da linha nessas regiões) era equivalente a aproximdamente US$ 3,1 mil, já considerando a cotação do dólar no paralelo. Imagine pagar o equivalente a R$ 16 mil para ter uma linha telefônica fixa! Ou seja, a estatal prejudicava mais justamente os mais pobres. Nenhuma surpresa aqui.

É difícil fazer um paralelo com a energia elétrica, pois se trata de um mercado mais complexo e que não foi totalmente privatizado (a Eletrobrás só foi privatizada agora). Mas você pode estar certo de que o raciocínio é exatamente o mesmo. Não tenha dúvida de que, caso uma boa parte das empresas de energia elétrica não tivesse sido privatizada, o preço das tarifas seria, hoje, o menor dos nossos problemas. Estaríamos pagando o preço que fosse para garantir fornecimento. E, claro, os mais pobres seriam os mais prejudicados.

Depois de todas as evidências empilhadas nos últimos 25 anos, só defende a existência de estatais quem quer um cabide de emprego para uso político ou quem sofre de uma cegueira ideológica que impede de enxergar a realidade tal qual é. Fernando Haddad pertence a este segundo grupo, o mesmo que incluia Dilma Rousseff. São os mais perigosos, pois nada os detém. Nem a realidade.

O fim de uma aventura

Em 1997, o governo FHC realizou a maior privatização da história do Brasil: a do setor de telecomunicações. A telefonia fixa, na época o filé mignon, foi dividida em 4 grandes áreas: Embratel, comprada por uma empresa americana e depois vendida para a Telmex mexicana, a Telesp, adquirida pela Telefónica espanhola, o conjunto de empresas da Região Sul, arrematada pelo consórcio liderado pela Telcom Itália (TIM) e, por fim, todo o restante, do RJ ao Amazonas, vendida para o único grupo nacional concorrente, liderado pela construtora Andrade Gutierrez. Este grupo chamava-se Tele Norte Leste, mudando de nome para Telemar e, por fim, para Oi.

O leilão da parte Norte do país foi o único sem concorrência, e saiu sem ágio algum. Grampos que vieram à tona posteriormente revelaram que o então ministro das Telecomunicações, Luís Carlos Mendonça de Barros, chegou a combinar com a Previ a formação de um consórcio concorrente para que houvesse alguma disputa. O ministro caiu por conta do escândalo, mas a história se encarregaria de mostrar que ele estava certo.

A grande preocupação do governo e do mercado era a falta de um operador de telefonia no consórcio vencedor, além de problemas de, digamos, governança, no grupo carinhosamente apelidado pelo mercado de Telegangue.

De todas as operações de telefonia no país, a Oi sempre foi a mais problemática. Mas o fato de constituir um grupo nacional próximo aos círculos do poder foi lhe dando sobrevida. Em 2009, o governo Lula mudou a Lei Geral de Telecomunicações para permitir que grupos pudessem controlar a telefonia em diferentes regiões geográficas. Foi uma mudança sob medida para que a Oi comprasse a Brasil Telecom, operadora da região Sul que havia sido vendida para a TIM na privatização. Era a época da política de “campeões nacionais”, regada a muito dinheiro do BNDES. O custo para a Oi foi relativamente baixo: a instalação de uma antena vizinha ao famoso sítio de Atibaia. Bem mais barato que um triplex, por exemplo.

Mas a verdade econômica acaba se impondo, mais cedo ou mais tarde. Com a migração da tecnologia para a telefonia móvel e a briga de foice no escuro nesse mercado, que deixou de contar com exclusividade geográfica, prevaleceram as empresas mais bem administradas. E não há dinheiro do BNDES que dê jeito em uma má administração.

O leilão de ontem representa o melancólico fim da aventura brasileira no ramo das telecomunicações.

Grande dia!

Para não dizerem que só trago más notícias.

Depois de 3 anos dormindo nos escaninhos do Senado, finalmente foi aprovado o marco legal que traz o setor de telecomunicações brasileiro para o século XXI.

Grande dia!