O presidente classificou as manifestações convocadas para o dia 15 como “espontâneas”, “bem-vindas” e “pró-Brasil”. Vejamos:
1) Esses atos podem ser tudo, menos espontâneos. O único ato espontâneo do qual participei foi logo após a divulgação do papo reto entre a ex-presidenta e o ex-presidiário. Dirigi-me espontaneamente à Paulista e lá encontrei uma multidão espontânea, sem nenhuma convocação. Todas as outras manifestações foram convocadas por grupos organizados. Esta não é diferente.
2) Quando Vera Magalhães revelou que o presidente havia repassado as convocações via WhatsApp para um grupo restrito, foi um deus-nos-acuda. Foi chamada de mentirosa para baixo. Ao chamar de “bem-vindas” as manifestações, o presidente não deixa a jornalista mentir sozinha. A revelação de Vera era grave, pois significava que o presidente estava avalizando um ato popular contra os dois outros poderes. Não é nada disso, dirão, trata-se de um ato “a favor do Brasil”. Se é isso, por que a irritação contra a jornalista?
3) O presidente e seus apoiadores têm um peculiar entendimento do que seja “pró-Brasil”. “Pró-Brasil” é tudo aquilo que está de acordo com a agenda do presidente, e contra o Brasil é tudo o que vai contra a agenda do presidente. Seus 56% de votos válidos no 2o turno ter-lhe-iam dado o dom de traduzir tudo o que os brasileiros querem. Nesse contexto, o Congresso deve ser um mero carimbador das decisões presidenciais. Este é o significado de fundo do “pró-Brasil”.
Bolsonaro afirma que aqueles que dizem que as manifestações são contra a democracia estão mentindo. Bem, os atos servem para mostrar aos congressistas que o povo está ao lado do presidente e, portanto, devem votar de acordo com a pauta do Executivo, para não atrapalhar o Brasil. Por mais que eu analise, não consigo distinguir entre um Congresso que aprova tudo o que o sai do Executivo de um Congresso fechado. O efeito final é exatamente o mesmo.
O Congresso venezuelano continua aberto e funcionado, aprovando tudo o que sai da caneta de Maduro. E não falta povo na rua para apoiar esse estado de coisas.
O trecho abaixo é da coluna de Vera Magalhães, hoje, no Estadão. Ela escreve sobre o exemplo do Chile, e que a equipe econômica liberal do governo Bolsonaro deveria ser, digamos, mais “sensível” à desigualdade de renda.
Destaquei o trecho acima para demonstrar que esse pessoal combate moinhos de vento. Quais seriam esses “próximos passos” depois da reforma da Previdência que vão “mexer numa rede de proteção social construída ao longo de sucessivos governos?”. Mistério.
Se há alguma coisa que mexeu em rede de proteção social, esta foi a reforma da Previdência. Mas não é disso que Verá trata, nem seria louca de fazê-lo, uma vez que está claro para todos que o modelo é insustentável. Então, ao que ela exatamente se refere? À reforma tributária, que pretende simplificar a vida de quem cria riqueza no País? À reforma do Estado, que pretende retirar privilégios de funcionários públicos para que sobre mais dinheiro para a “rede de proteção social”? Às privatizações e concessões, cujo dinheiro arrecadado também servirá para reforçar políticas sociais? Quais seriam esses “balões de ensaio” que revelam a maldade de Paulo Guedes e equipe? Vera Magalhães não se dá ao trabalho de esclarecer.
O artigo de Vera não é uma exceção, é a regra. Todas as críticas ao tal “modelo liberal” tem como denominador comum uma má-vontade política em relação ao governante de turno. Todos os governantes responsáveis fazem a mesma coisa quando falta dinheiro, mas alguns são “queridinhos”, enquanto outros são os “malvados”. Tudo se resume a quem faz, não ao que é feito.
Só pra relembrar o trecho onde a jornalista Vera Magalhães louva a “lacração” de Marina Silva no debate da RedeTV. Ela não estava sozinha, a performance da candidata da Rede foi cantada em verso e prosa por todo o jornalismo “bem-pensante” do país. Enfim, alguém havia tomado coragem para enfrentar o Ogro!
Deu muito resultado mesmo. Estamos vendo nas últimas pesquisas.
Antes de comentar a nota abaixo, permitam-me relembrar o que escrevi aqui mesmo no dia 19/08:
“Vera Magalhães, no mesmo artigo, define bem a campanha de Alckmin até o momento, a não ser por um detalhe, que comento adiante. Segue o trecho:
“De que vale Geraldo Alckmin juntar 44% do tempo de TV da propaganda eleitoral, um arsenal de deputados e senadores, se quando colocado diante do eleitor ao vivo se comporta como um candidato a prefeito de Pindamonhangaba, enfileirando siglas, falando de matas ciliares, chamando sparrings para fazer pergunta porque não tem coragem de ficar tête-à-tête com aquele que lidera a eleição no Estado em que ele governou quatro vezes? Por que ele acha que esse discurso mole, em tom monocórdio e sem mostrar qual seu projeto de País, sem fixar uma miserável ideia-guia que seja, vai fazê-lo crescer?”
É isso. Alckmin parece perdido.
Para entender essa eleição, é preciso ter em mente que ela corre em dois eixos: esquerda x direita e establishment x anti-establishment. Bolsonaro é claramente direita e anti-establishment. Marina é esquerda e anti-establishment. Os dois lideram as pesquisas no momento, sugerindo que o voto anti-establishment está na frente. Ciro e Álvaro Dias tentam passar por anti-establishment, mas sem o sucesso dos dois primeiros.
Do establishment temos Alckmin e Haddad. Haddad à esquerda e Alckmin…, bem, este é o problema.
O candidato do PSDB se propôs, e isso ficou claro desde o início, a encarnar o candidato de “centro”, que apela aos “isentos”, àqueles que não gostam de radicalismos. Como diria o inefável Kassab, nem direita, nem esquerda, nem em cima, nem embaixo. O resultado é essa gelatina sem sabor que vemos. O brasileiro médio não parece muito disposto a discursos conciliatórios no momento.
Alckmin vem também tentando atacar Bolsonaro no campo da “competência e experiência”, o que resulta nesse discurso insosso que Vera Magalhães descreve muito bem. Além disso, “experiência” não conta muito quando as coisas vão mal (13 milhões de desempregados!). A pergunta óbvia é: se você é tão competente quanto diz, por que as coisas estão essa zerda de dar gosto? Além disso, a experiência é prima-irmã do establishment, e Bolsonaro explora bem esse parentesco.
Geraldo Alckmin precisa se decidir de quem quer roubar votos. Para roubar votos de Bolsonaro, ser “de centro” e “ser mais competente” parece não estar funcionando até o momento. Uma outra tática possível seria atacar as esquerdas em geral e o PT em particular com uma virulência maior do que o capitão. Foi o que fez João Doria em São Paulo com sucesso.
É neste ponto que a análise de Vera Magalhães falha: Alckmin não ganha nada confrontando diretamente Bolsonaro no campo da esquerda, como fez Marina. Este campo já está muito congestionado, até o Meirelles apareceu defendendo as mulheres! Ele precisa mostrar para o eleitorado perdido de São Paulo que é o melhor candidato para enfrentar a esquerda no 2o turno. Para isso, ele precisa atacar a esquerda no 1o turno. Se ele atacar Bolsonaro, ele próprio parecerá pertencer à esquerda, disputando votos com Ciro, Marina e Haddad para enfrentar Bolsonaro no 2o turno. É uma tática mais arriscada.”
Pois é. O gênio político percebeu o que já estava claro desde sempre. Inclusive, a questão do voto útil anti-petista ainda no 1o turno, dada a potencial maior rejeição a Bolsonaro, coisa que também analisei aqui há alguns dias.
No entanto, pode ser muito pouco, muito tarde. Escrevi isso em 15/08:
“O PSDB, com raríssimas exceções, não soube capitalizar o sentimento anti-petista surgido com o mensalão. Digo “surgido” não porque não existisse antes, mas era um fenômeno muito mais restrito. O mensalão mostrou a verdadeira cara desse partido, mas um não sei que de cumplicidade ideológica misturada com o receio de parecer troglodita aos olhos da inteligentzia nacional, fez com que o PSDB colocasse panos quentes sobre o mensalão, sovando o que seriam mais 10 anos de governos petistas.
Hoje, o discurso do PSDB não é muito diferente. “A lei é para todos” é um mote que está longe de satisfazer o anti-petismo. Levar um saco de lixo com a estrela do PT como fez Bolsonaro é o mínimo que se esperava. Não fizeram em 2005, não estão fazendo hoje. Aliás, hoje seria tarde demais. O PSDB perdeu o bonde da história.”
De qualquer forma, só resta a Alckmin o discurso do voto útil anti-petista. Será crível? Será suficiente?
Vera Magalhães, hoje novamente no Estadão, continua sua patacoada sobre a “vitória de Marina sobre Bolsonaro” no debate. Peço, por favor, que quem não tenha visto, procure no YouTube esta parte, e veja com seus próprios olhos. Esta é a melhor vacina contra fake news.
Mas não é sobre isso que quero escrever. Vera, no mesmo artigo, define bem a campanha de Alckmin até o momento, a não ser por um detalhe, que comento adiante. Segue o trecho:
“De que vale Geraldo Alckmin juntar 44% do tempo de TV da propaganda eleitoral, um arsenal de deputados e senadores, se quando colocado diante do eleitor ao vivo se comporta como um candidato a prefeito de Pindamonhangaba, enfileirando siglas, falando de matas ciliares, chamando sparrings para fazer pergunta porque não tem coragem de ficar tête-à-tête com aquele que lidera a eleição no Estado em que ele governou quatro vezes? Por que ele acha que esse discurso mole, em tom monocórdio e sem mostrar qual seu projeto de País, sem fixar uma miserável ideia-guia que seja, vai fazê-lo crescer?“
É isso. Alckmin parece perdido.
Para entender essa eleição, é preciso ter em mente que ela corre em dois eixos: esquerda x direita e establishment x anti-establishment. Bolsonaro é claramente direita e anti-establishment. Marina é esquerda e anti-establishment. Os dois lideram as pesquisas no momento, sugerindo que o voto anti-establishment está na frente. Ciro e Álvaro Dias tentam passar por anti-establishment, mas sem o sucesso dos dois primeiros.
Do establishment temos Alckmin e Haddad. Haddad à esquerda e Alckmin…, bem, este é o problema.
O candidato do PSDB se propôs, e isso ficou claro desde o início, a encarnar o candidato de “centro”, que apela aos “isentos”, àqueles que não gostam de radicalismos. Como diria o inefável Kassab, nem direita, nem esquerda, nem em cima, nem embaixo. O resultado é essa gelatina sem sabor que vemos. O brasileiro médio não parece muito disposto a discursos conciliatórios no momento.
Alckmin vem também tentando atacar Bolsonaro no campo da “competência e experiência”, o que resulta nesse discurso insosso que Vera Magalhães descreve muito bem. Além disso, “experiência” não conta muito quando as coisas vão mal (13 milhões de desempregados!). A pergunta óbvia é: se você é tão competente quanto diz, por que as coisas estão essa zerda de dar gosto? Além disso, a experiência é prima-irmã do establishment, e Bolsonaro explora bem esse parentesco.
Geraldo Alckmin precisa se decidir de quem quer roubar votos. Para roubar votos de Bolsonaro, ser “de centro” e “ser mais competente” parece não estar funcionando até o momento. Uma outra tática possível seria atacar as esquerdas em geral e o PT em particular com uma virulência maior do que o capitão. Foi o que fez João Doria em São Paulo com sucesso.
É neste ponto que a análise de Vera Magalhães falha: Alckmin não ganha nada confrontando diretamente Bolsonaro no campo da esquerda, como fez Marina. Este campo já está muito congestionado, até o Meirelles apareceu defendendo as mulheres! Ele precisa mostrar para o eleitorado perdido de São Paulo que é o melhor candidato para enfrentar a esquerda no 2o turno. Para isso, ele precisa atacar a esquerda no 1o turno. Se ele atacar Bolsonaro, ele próprio parecerá pertencer à esquerda, disputando votos com Ciro, Marina e Haddad para enfrentar Bolsonaro no 2o turno. É uma tática mais arriscada.
Marina, por outro lado, ganha muito atacando Bolsonaro. O campo dela é o da esquerda, e ela precisa mostrar para este campo que é a mais competente para bater o capitão no 2o turno. Assim, temas como mulheres e armas, tão caras à esquerda, são a sua matéria-prima natural. É justamente o inverso de Alckmin.
Enfim, apesar de todo o seu arsenal, esta eleição não será fácil para Alckmin. Ele juntou muitos exércitos no tabuleiro, mas parece que está em busca de uma estratégia para vencer a guerra. Ou melhor, parece não saber que guerra está lutando.
PS.: toda essa análise pode ir por água abaixo depois de iniciada a campanha na TV. Alckmin tem arsenal para fazer uma guerra de “rolo-compressor”, em que mesmo uma estratégia equivocada é compensada pelo tamanho descomunal dos exércitos. Por isso, essa eleição está completamente aberta.
Eu assisti ao mesmo trecho do debate que Vera Magalhães descreve acima, e tive uma impressão completamente diferente.
Bolsonaro estava respondendo a uma questão sobre as mulheres feita por Marina. Em determinado momento, Marina tenta interromper a fala de Bolsonaro, o que não estava previsto nas regras do debate. Foi o único incidente desse tipo na noite. Bolsonaro interrompeu sua resposta para chamar a atenção de Marina sobre o cumprimento das regras.
Qual foi minha percepção? A de que Marina não aguenta pressão e pode espanar na primeira crise de governo. Já Bolsonaro, descontando-se sua chucrice, se mostrou senhor da situação. Já Vera Magalhães viu “pressão” sobre Bolsonaro, assim como de resto o próprio Estadão, que estampou esse embate na capa.
Bem, “pressão” sofreram todos os candidatos que contam, e não acho que Bolsonaro tenha se saído pior ou melhor ao lidar com isso. Como eu disse ontem, não acho que ele tenha ganhado ou perdido votos depois do debate.
Mas essa é a minha percepção, e Vera Magalhães pode ter outra, sem problemas. O que não pode é espalhar fake news, como destacado no texto acima.
Fui ver o tal programa com a Luciana Giménez. É fácil de achar, está no YouTube. A pergunta era essa: “você disse que mulheres devem ganhar menos que homens porque engravidam. Confirma?”
Bolsonaro então se justificou dizendo que o que ele havia dito para o repórter do jornal é que empregadores haviam dito isso para ele, e que o repórter havia colocado isso na conta dele.”
Ok,Bolsonaro pode estar inventando isso. Ainda que, do jeito que ele defende suas ideias, por mais polêmicas que sejam, parece-me que ele não teria dificuldade em confirmar se fosse verdade. Mas sigamos, o problema vem em seguida.
Não satisfeita, como boa jornalista, Luciana pressiona Bolsonaro, perguntando se ele próprio achava aquilo certo ou errado. Depois de enrolar um pouco, Bolsonaro diz: “Eu pagaria o mesmo sem problemas, tem muita mulher que é competente”. A primeira parte sai mascada porque ele fala rápido e, principalmente, porque a última parte da resposta, “tem muita mulher competente” é repetida alto por Luciana, como se fosse uma confissão de machismo. Ela repete com ênfase: “Tem muita mulher competente! Olha o que você acabou de dizer Bolsonaro! Você é um ogro!” Ora, se ele tivesse dito que pagaria menos, isto é que seria o foco da atenção, e não a frase “tem muita mulher competente”. Luciana pega essa frase porque não há mais nada de concreto.
Podemos até discutir se o que Bolsonaro disse transpira machismo ou não. Mas ele não disse, como afirma Vera Magalhães, que acha certo que mulheres recebam menos que homens, “apesar de” existirem mulheres competentes. Isso é militância sobrepujando-se ao jornalismo, é fake news com pedigree.
A democracia nos garante a escolha do candidato que melhor (ou menos pior) se adeque às nossas convicções e desejos. Mas deixa de funcionar se é baseada na mentira.
PS.: Bolsonaro não é meu candidato. Mas a imprensa, desse jeito, está fazendo um esforço danado para que eu considere essa possibilidade, talkey?