A atleta Carol Solberg resolveu lacrar em entrevista à Sport TV, e soltou um “Fora Bolsonaro!” ao vivo e em cores. A Confederação Brasileira de Vôlei soltou nota de repúdio e estuda punição. A atleta e seus apoiadores defendem a “liberdade de expressão”, e acusam a CBV de usar dois pesos e duas medidas, na medida em que teriam permitido que os atletas Wallace e Mauricio fizessem propaganda para o então candidato Bolsonaro em uma foto da seleção brasileira de vôlei em 2018. Reproduzo abaixo a foto, a nota da CBV à época e a nota da CBV a respeito da manifestação da atleta Carol.
O que dizer?
Pra começo de conversa, liberdade de expressão é inegociável. Todo ser humano tem liberdade para expressar suas opiniões, desde que não seja apologia a crime. Não posso, por exemplo, defender o assassinato do Lula ou do Bolsonaro, isso está fora da esfera de “liberdade de expressão”.
Pois bem, tendo pacificado este ponto, resta saber se há outras limitações à liberdade de expressão. Sim, há. A palavra “expressão” tem como pressuposto alguém falar e alguém ouvir. Robinson Crusoé tinha uma liberdade de expressão absoluta, mas era inútil, pois não havia ninguém que o escutasse. Exercer a liberdade de expressão só faz sentido se há outras pessoas que escutem a sua opinião.
Esta é a chave para entender a limitação intrínseca da liberdade de expressão: a expressão de sua opinião tem efeitos diferentes a depender do palanque de que você dispõe.
Um exemplo: eu tenho uns 2 mil seguidores nessa página do Facebook. O que eu falo aqui atinge essas duas mil pessoas e talvez um pouco mais, a depender de quantos compartilhamentos são feitos. Esse é o meu palanque, eu falo o que eu quero. Ao mesmo tempo, trabalho em uma empresa de investimentos, onde escrevo os relatórios para os clientes. A empresa tem milhares de clientes. Posso escrever o que eu quero? Obviamente não. O palanque não é meu, é da empresa. Foi ela que construiu essa audiência. A minha expressão, ao me comunicar com essas pessoas, é a expressão da empresa. Os clientes são dela, não meus.
Portanto, a liberdade de expressão é limitada pelo palanque que cada pessoa conseguiu construir. Felipe Neto, por exemplo, fala todas as bobagens do mundo para os seus milhões de seguidores, e a ninguém ocorre limitar a sua liberdade de expressão. Afinal, esse palanque é dele, ele é que decide o que vai e o que não vai falar.
Vamos ao caso da moça do vôlei e a nota da CBV. Atletas, de maneira geral, só estão lá porque existe toda uma estrutura montada na base de patrocínios. Se a Carol gritasse “Fora Bolsonaro!” em sua página no Instagram, a polêmica seria zero. Mesmo porque, poucos teriam ouvido. O palanque construído pela atleta é muito pequeno. O que ela fez? Usou a audiência construída pela CBV para expressar a sua opinião. É óbvio que não dá. A CBV pode sim puni-la, pois é ela que manda no seu palanque.
O paralelo com o caso Wallace/Maurício é adequado, ainda que tenha sido distorcido pela atleta. A CBV não “defendeu a liberdade de expressão” dos dois atletas e ficou por isso mesmo. O que a CBV fez, à época, foi dizer que os atletas podem falar o que quiserem em suas redes sociais, mas não usar o palanque da seleção brasileira para fazer política. Ambos foram punidos com advertência, provavelmente o que vai acontecer com Carol Solberg.
Entidades esportivas não costumam gostar de ceder o seu palanque para manifestações políticas. Por sua própria natureza, a política separa em campos opostos, e a última coisa que essas entidades querem é divisão e boicote de patrocinadores e espectadores. Por isso, senhores atletas, usem seus perfis pessoais para manifestações políticas e evitem usar os campeonatos organizados pelas entidades esportivas. Esses palanques não lhes pertencem.