Missão impossível

Mariana Mazzucato é a nova musa dos economistas desenvolvimentistas brasileiros. Depois de décadas do domínio inconteste de Maria da Conceição Tavares, e preenchendo o vácuo que a professora da Unicamp deixou, a professora italiana vem dar um novo brilho às velhas ideias de sempre.

Mazzucato embala a sua teoria com o papel de embrulho do conceito de “missão”. O Estado seria o indutor do desenvolvimento ao determinar “missões” em torno das quais os agentes econômicos trabalhariam harmoniosamente, alavancando o crescimento econômico. Neste artigo no Valor (e em outro que já tinha lido), Mazzucato cita como exemplo a “missão” de colocar um homem na Lua, dada por John Kennedy em 1963, e que levou ao desenvolvimento das muitas tecnologias necessárias para o bom termo do empreendimento. Assim, um “pequeno” investimento do Estado (via NASA) alavancou muitos setores econômicos, multiplicando em muitas vezes a sua potência.

A ideia, como todas as ideias às quais se agregam uma narrativa ex-post, é muito sedutora. O problema é achar que o investimento estatal em uma “missão” é condição suficiente para que a mágica aconteça. É o mesmo que ver alguém riscando um fósforo e colocando fogo em um tanque de combustível, e tentar fazer o mesmo com um tanque de água. O ambiente empresarial e acadêmico dos EUA é um tanque de combustível, pronto a responder a qualquer estímulo, enquanto o ambiente brasileiro é um tanque de água. Pode riscar quantos fósforos quiser, a água não vai pegar fogo.

Vou listar aqui alguns problemas que a indústria enfrenta, e que não há “missão” que dê jeito:

– carga tributária que incide principalmente sobre o setor. A reforma tributária vai melhorar isso, mas vai levar alguns anos de transição.

– complexidade tributária (a reforma vai ajudar aqui também)

– insegurança jurídica, apesar do que possa dizer o presidente do STF

– ambiente de corrupção em vários níveis, sem punição

– protecionismo, que dificulta a atualização tecnológica

– falta de mão-de-obra bem formada

Além disso, a professora sugere usar as compras governamentais para “induzir” o crescimento. A fórmula é batida: o governo privilegiaria a compra de produtos nacionais, beneficiando o empresário local em detrimento da eficiência dos seus gastos. Como isso contribuiria para o crescimento permanece um mistério.

Enfim, as ideias da professora Mazzucato soam como música aos ouvidos de nossos burocratas e políticos. Afinal, ela passa a impressão de que finalmente encontramos a fórmula que garantirá a eficiência dos investimentos públicos. Nos nossos vários ciclos de planejamento central e investimento estatal (JK, ditadura militar, Lula/Dilma), a coisa começou com festa e terminou em um desastre profundo de recessão e dívidas impagáveis. Agora não! Agora temos “missões”, que é o que faltou nos ciclos anteriores. Assim é se assim lhe parece.

Não foi à toa que a bolsa caiu hoje, na contramão do mundo. Só não é pior porque, como sabemos, este é o governo Circo de Pulgas, em que se anuncia o maior espetáculo da Terra para depois entregar algo minúsculo e que não vai fazer muita diferença, a não ser para os amigos de sempre.

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