Estou lendo Anatomia de um desastre, dos jornalistas Cláudia Safatle, João Borges e Ribamar Oliveira, contando a história da maior recessão brasileira de todos os tempos.
Logo no início tem um capítulo chamado “Momento mágico”, em que os autores contam o ápice do governo Lula, o ano de 2010, quando o Brasil cresceu 7,5%, e tudo parecia ser possível. Mal se sabia que ali estava se plantando a semente da maior recessão da história.
Mas não é este o ponto agora. Chamou-me a atenção outro aspecto levantado pelos jornalistas: o fato de Lula usar recorrentemente a expressão “momento mágico” em seus discursos. Lula é um grande comunicador, e sabe o poder das palavras, dos slogans. Obviamente, devem se basear em fatos, caso contrário não se sustentam. E era um fato que o Brasil estava crescendo, e a renda dos trabalhadores estava aumentando. Mas Lula também sabia que precisava capitalizar em cima daquilo, e usou e abusou do slogan “momento mágico”, embalando os brasileiros em um clima de ufanismo, que se somava à melhora econômica. Não bastava a renda maior. Era preciso que o brasileiro soubesse quem era responsável por aquilo. E a repetição do slogan “momento mágico” ajudava a criar essa aura de “podemos tudo”, que persiste até hoje. É essa a imagem que o brasileiro guarda do governo Lula, com nostalgia.
O contraste com o governo atual é gritante. Temer é a antítese de Lula em termos de comunicação pessoal e, além disso, a comunicação do governo é inexistente. Fosse Lula, estaria martelando na cabeça do povo a “herança maldita” que recebeu. Por muito menos, fez isso com FHC do início ao fim do seu mandato.
Qual o único político que tem feito isso com maestria? Sim, ele, João Doria. O único tema nacional que ele toca é lembrar a todos que o PT é uma quadrilha que pilhou o Brasil, e que Lula é o chefe da quadrilha, sem vergonha e cara de pau. Não importa se as pessoas sabem disso ou não, se concordam ou não. Ele repete, repete e repete. É seu slogan. Aquele que vai usar na sua campanha presidencial.
Nada é mais importante, nada mexe tanto com o imaginário da população, nada desmonta de maneira mais humilhante o discurso de Lula, a ponto de obrigar militantes do PT a defender uma certa leniência moral, como se roubar fosse algo relativo, justificável em alguns casos (para quem não sabe sobre o que estou falando, leia o artigo do Bresser Pereira na Folha hoje). Lula ainda não respondeu pessoalmente. Ainda. Quando o fizer, saiba que Doria ganhou.
Lembro da campanha para governador de 1998, quando Covas enfrentou Maluf no 2o turno. Covas espalhou outdoors pela cidade, com a foto de um menininho, e a frase: “Papai, é feio roubar?”. Ganhou a eleição.