Se tem uma palavra que vem me irritando profundamente nos últimos tempos é “diálogo”. Em si virtuosa, a palavra vem sendo usada completamente fora do seu significado, igualando desiguais.
Hoje mesmo ouvi a palavrinha em três ocasiões, dita por jornalistas da Globo News ao se referirem à situação na Venezuela, à tentativa de invasão da Alerj e à invasão propriamente dita da Câmara dos Deputados. “Falta diálogo”, é o mantra repetido, colocando nos ombros de todos os agentes o ônus da culpa pela situação. “Falta aplicação da lei”, eu diria.
Imagine sua casa sendo invadida por um ladrão. Você é assaltado, e o ladrão foge com seus pertences. No dia seguinte, a cobertura da Globo News enfatiza a “falta de diálogo” entre você e o ladrão, sem o qual a situação fugiu do controle, o que não interessa a ninguém. Absurdo, não?
Pois é. É exatamente isto que o uso da palavra diálogo usada fora de seu significado faz: igualar desiguais. Diálogo supõe duas partes iguais com interesses divergentes, e que têm legitimidade para dialogar. O que temos?
Na Venezuela, temos um chefe de poder executivo que vem interditando todas as formas de contestação ao seu mandato. Diálogo? Boa sorte Papa Francisco.
Na Alerj e na Câmara, grupos invadiram o recinto onde deputados fazem o diálogo de acordo com regras democráticas, pactuadas pela sociedade. Se qualquer grupo se achar no direito de invadir o parlamento, será a lei da selva, onde o mais forte fisicamente se impõe. Como dialogar com a truculência?
Nos episódios de invasão das escolas, a palavra diálogo também foi muito usada. Diálogo com quem? Com os invasores? Quem os fez representantes da sociedade para dialogar com as autoridades constituídas? Por que os interesses dos invasores são melhores ou mais representativos do que os de outros atores sociais, incluindo os pagadores de impostos que sustentam as escolas?
Antes do diálogo, a aplicação da lei. Depois, conversamos.