O Centrão do STF

Quem assistiu ontem à posse do novo ministro da Justiça, pôde ouvir Bolsonaro rasgar altos elogios a Gilmar Mendes, presente à cerimônia.

Gilmar Mendes é o Centrão do STF.

Dois pesos, duas medidas

Em 18 de março de 2016, o ministro Gilmar Mendes suspendeu a nomeação de Lula como ministro da Casa Civil. Seu argumento: indícios de desvio de finalidade.

Ontem, o ministro Alexandre de Moraes suspendeu a nomeação de Ramagem como diretor-geral da Polícia Federal. Seu argumento: indícios de desvio de finalidade.

Ou bem ambos foram uma ingerência indevida de um poder abre o outro, ou foram um exemplo dos pesos e contrapesos que atuam em uma democracia saudável, em que o mandante de plantão não pode usar a máquina de poder para fins pessoais.

O moto-perpétuo, mais uma vez

Monica de Bolle volta a atacar o teto de gastos. Extraí os 3 primeiros parágrafos de sua coluna, que já dão uma boa ideia das ideias da moça.

Primeiro, e talvez principal, De Bolle deixa à mostra sua inclinação autoritária, ao dizer que os técnicos da equipe econômica não estão “pensando no País”. É típico de mentes autoritárias confundir suas ideias com verdades absolutas, ficando os seus opositores com o papel de “inimigos da Pátria” e não simplesmente pessoas honestas que têm ideias diferentes para o bem do País. Combina bem com o seu eterno candidato à presidência, Ciro Gomes. Em uma postura típica do coronel, De Bolle joga a afirmação falsa de que o teto prejudicou o repasse de verbas para o SUS, com uma frase que inicia com um “há quem argumente”. Ou seja, nem para assumir a autoria da inverdade.

Mas vamos à questão em si.

De Bolle se diz a favor da “ideia do teto”, mas não desse que está aí. É uma forma elegante de dizer que não é a favor de teto algum. O mesmo argumento que usavam os mais civilizados que eram contra a reforma da Previdência. E o que De Bolle mudaria no teto? A permissão para fazer investimentos. Bem, se for para isso, o teto já está furado. O governo Bolsonaro descobriu a brecha, ao capitalizar em R$7 bilhões a Emgepron, para que a Marinha pudesse construir seus brinquedos de guerra. Mas De Bolle quer uma permissão oficial, não chicanas.

Há dois problemas com essa ideia, um com relação ao teto em si e o outro com relação ao papel dos investimentos públicos.

Com relação ao teto em si, o problema é que não existe “meio-teto”, assim como não existe “meio-grávida”. Ou o teto existe e serve para tudo, ou não existe. Liberar “investimentos” é liberar tudo, no país do jeitinho. Por onde passa um boi, passa uma boiada, como diz o ditado. E o mercado sabe disso. Um teto furado não segura a chuva.

Em relação aos investimentos públicos, temos duas questões: a qualidade do investimento público e o seu papel no crescimento do país. Com relação à qualidade, é público e notório que o investimento público deveria se chamar “desperdício público”, pela sua incapacidade de seguir cronogramas e orçamentos. Isso, sem contar a roubalheira. Em relação ao seu papel no crescimento do País, acho que já tivemos exemplos suficientes de como isso não funciona. Sempre repito isso: fosse fácil assim, não existiria país pobre: bastaria se endividar até as tampas, investir o dinheiro, e depois recolher os impostos para pagar a dívida. Pena que ainda não inventaram o moto-perpétuo.

Não por outro motivo, De Bolle ficou indignada com as comparações que fizeram entre o programa Pró-Brasil e o PAC ou o PND. Esses programas demonstraram todos os pontos acima: desperdício de dinheiro público e incapacidade de fomentar o crescimento, com efeitos perversos sobre o endividamento. Mas, por alguma misteriosa razão, o Pró-Brasil seria diferente. É sempre aquela ilusão de que é possível construir um Estado nórdico no Brasil-sil-sil.

O que realmente importa

Esqueçam as chamadas dos jornais sobre a última pesquisa Datafolha. O foco das manchetes foi sobre a possibilidade ou não de abertura de processo de impeachment, e o apoio ao ex-ministro Sergio Moro. Isso tudo importa quase nada.

O que importa, de fato, é a aprovação do governo. E essa continua no mesmo lugar que estava em dezembro/2019, última pesquisa Datafolha sobre a aprovação geral do governo Bolsonaro. Quatro meses atrás, a diferença entre ótimo/bom e ruim/péssimo estava em -6 pontos. Na última pesquisa, feita após o affair Moro e o desgaste com o Covid-19, a diferença estava em -5 pontos. Não mudou absolutamente nada.

Mas todos sabemos que a Datafolha é comunista. Vamos aguardar alguma pesquisa que seja idônea.

Uma luz no fim do túnel

A seguir, uma reportagem do NYTimes de ontem, sobre uma possível vacina para o Covid-19. Em resumo: um trial da Oxford University foi muito bem com macacos, e começará a ser testado em seres humanos em maio. Se funcionar, poderemos ter uma vacina já em setembro, muito antes de todas as previsões.

Obviamente pode não funcionar. Mas acho que estamos precisando de alguma boa notícia no momento.

A running start for a vaccine at Oxford

Here’s promising news in the worldwide race to develop a vaccine to ward off the coronavirus. The Jenner Institute at Oxford University has one that seems to work in lab animals and is ready to test its effectiveness in humans, if regulators approve.

The institute had a big head start, our correspondent David D. Kirkpatrick reports. Its scientists had an approach that they already knew was safe: They had proved it in trials last year for a vaccine to fight MERS, a respiratory disease caused by a closely related virus.

That has enabled the institute to skip ahead and schedule tests of its new Covid-19 vaccine on more than 6,000 people by the end of May, hoping to show not only that it is safe, but also that it works.

Scientists at the National Institutes of Health’s Rocky Mountain Laboratory in Montana got very good results when they tried out the Oxford vaccine last month on six rhesus macaque monkeys. The animals were then exposed to heavy quantities of the coronavirus. After more than four weeks, all six were still healthy.

“The rhesus macaque is pretty much the closest thing we have to humans,” said Vincent Munster, the researcher who conducted the test.

Immunity in monkeys doesn’t guarantee that a vaccine will protect people, but it’s an encouraging sign. If the May trials go well and regulators grant emergency approval, the Oxford scientists say they could have a few million doses of their vaccine available by September — months ahead of other vaccine projects.

“It is a very, very fast clinical program,” said Emilio Emini of the Bill and Melinda Gates Foundation, which is helping to finance a number of competing efforts.

All in the genes: The Jenner Institute isn’t following the classic approach of using a weakened version of the disease pathogen. Instead, its approach starts with another familiar virus, neutralizes it and then genetically modifies it so that it will prompt the body to produce the right antibodies for Covid-19.

Researchers originally cooked up the technology in a quest to develop a vaccine for malaria, which is caused by a parasite. No luck there yet. But when the idea was borrowed to go after MERS, it worked well.

Qual o número real de testes?

O Brasil fez 151 mil ou 178 mil testes?

Querem saber? Isso aí é irrelevante.

O Brasil, a essa altura do campeonato, em que já se faz planos de sair da quarentena, já deveria ter acumulado pelo menos 1% de sua população testada. Para quem deveria ter feito pelo menos 2 milhões de testes, saber se foram 150 ou 180 mil não tem a mínima importância estatística. Continuamos no escuro de qualquer forma.

O primeiro a saltar do barco

Prova cabal de que Moro representava o combate à corrupção nesse governo é o aviso, por parte do Centrão e do PT, de que não contem com eles para dar o gostinho do impeachment ao ex-juiz. É o Petrolão indo à forra.

Marcos Pereira, líder do Republicanos e expoente do Centrão, já avisou: vamos respeitar as urnas.

Recortei reportagem de 2016, mostrando que o PRB (o então nome do Republicanos) foi o primeiro partido a entregar ministérios, dando apoio integral ao impeachment. Naquela época, “respeito às urnas” não constava no vocabulário.

Mas acho que a principal mensagem aqui é: dar cargos ao Centrão funciona até deixar de funcionar. Os partidos da “base” de Dilma sugaram até a última gota de sangue do governo, e depois abandonaram o barco sem mais. Vamos ver o que Bolsonaro vai fazer. Novamente, o diário oficial será o nosso guia.

Estatísticas da Covid-19

Depois de 3 dias com número de óbitos na casa dos 400, hoje tivemos novamente um número abaixo de 200. Como eu acompanho a média móvel de 3 dias justamente para suavizar essas oscilações, fizemos um pico ontem e agora começamos a cair novamente.

A curva brasileira, além de ser mais baixa do que Europa/EUA, tem uma característica diferente: ela sobe em “ondas”, ao contrário das outras duas, que subiram sem respiro. Já é o quarto pico consecutivo ascendente. O curioso é que esses picos ocorrem mais ou menos semanalmente: foram nos dias 23, 29, 36 e agora 44 depois do caso #150. Parece que ocorre um represamento de casos com periodicidade semanal (fim de semana?).Os picos de Europa e EUA foram no dia 44. Ou seja, se for este o padrão, estamos no pico. Na verdade, mesmo depois de atingido o pico, a Europa ainda mostrou números de óbitos próximos do pico por cerca de duas semanas (até o dia 58), e só na última semana começa a cair mais fortemente (estamos no dia 65). Os EUA ainda estão próximos do pico (eles estão no dia 53). A queda demora a ocorrer, é muito lenta.

Se seguirmos o padrão de Europa/EUA, ficaremos nos atuais patamares de óbitos (oscilando entre 200 e 400/dia) por ainda duas semanas, para só então começar a cair. Caso o número de óbitos salte de patamar (para 600/dia, por exemplo, então significará que não estamos seguindo o padrão, e aí vai ser difícil fazer qualquer previsão). O número de óbitos per capita muito menor que na Europa/EUA é em si uma excelente notícia. Mas é preciso que continue assim, e não aumente sem limite.

Agreguei o gráfico mais atualizado da Fiocruz, mostrando a atualização dos casos de SRAG (Síndrome Respiratória Aguda Grave) até a 16a semana epidemiológica (hoje entramos na 18a). A curva vermelha vinha declinando mas voltou a subir, e atingiu o patamar de 5,25 casos/100 mil habitantes. Vale lembrar que o pico da H1N1 em 2009 foi de 5,75. Mas vale ressaltar que essa linha vermelha é uma estimativa, cujo erro provável é dado pelas linhas pontilhadas pretas. Portanto, ainda pode ser revista.