Soylent Green

Soylent Green foi traduzido no Brasil como “O mundo em 2020” apesar de passar-se em 2022.

O plot é mais ou menos o seguinte: em um mundo devastado pelo aquecimento global (sim, isso em 1973, não é um assunto novo) e pela superpolução, as pessoas não tem mais o que comer, a não ser um alimento chamado soylent. O mais comum é o laranja, mas o verde (daí o nome do filme) é mais raro e muito mais gostoso. Charlton Heston é um detetive que acaba por descobrir a origem do soylent verde. Mais não conto para não dar spoiler.

Filmado em 1973, lembro-me de ter assistido ainda criança e de ter ficado muito impressionado. A cena da foto é uma das mais impactantes, com escavadeiras sendo usadas para limpar ruas de pessoas que protestavam pela falta de comida, em uma Nova York superpopulada. Lembro-me de ter ficado aterrorizado, imaginando como seria o mundo em 2020.

O fato é que, quase 50 anos depois, vivemos em um mundo com muito mais fartura, com menos pobreza, onde as pessoas vivem mais e melhor. Sempre que ouço previsões catastróficas sobre como será o mundo daqui a 50 anos, lembro desse filme.

Feliz 2020 a todos!

Os direitos dos animais

Os fogos na Paulista serão sem barulho em respeito aos animais.

Há muitos hospitais naquela região. Mas os fogos não deixaram de ter estampido em respeito aos doentes.

Há muitos moradores naquela região, crianças e idosos. Mas os fogos não deixaram de ter estampido em respeito aos vizinhos.

Mas os animais, ah os animais… esses sim merecem respeito.

Ítalo não é exemplo de nada

A família de Ítalo Ferreira, o atual campeão mundial de surfe, tirou a Mega-Sena do esporte. Seu filho ganhou destaque e está ganhando mais dinheiro em alguns anos do que poderiam sonhar seus pais em ganhar em gerações.

Segundo a história contada no jornal, Ítalo começou no surfe aos 8 anos, quando pegava suas primeiras ondas na tampa do isopor do pai, que vendia peixes na praia. Segundo a reportagem, o pai o levava todos os dias para essa atividade.

Fiquei pensando: 8 anos, e o pai o levava todos os dias para a praia? Não estudava, o menino? Parece que sim, mas só terminou o primeiro grau. A reportagem diz que a família teve que ouvir “comentários tendenciosos” porque Ítalo não estudava, ficava só naquela vida de surf.

Ítalo e sua família tiraram a sorte grande, assim como alguns poucos jogadores de futebol e suas famílias. A imensa maioria dos brasileiros ainda depende do estudo para mudar de patamar de vida. Não, Ítalo não serve como exemplo de nada. Para cada Ítalo que dá certo, há milhões que estão condenados à miséria por não estudarem.

No final, a matéria, em tom de condenação, diz que não houve nenhum apoio do poder público para Ítalo treinar o surf. Quer dizer, o jornalista esperava que um Estado que não consegue sequer alfabetizar direito a sua população mais pobre, providenciasse pranchas de surf para meninos que não vão à escola, na esperança de produzir campeões mundiais. Era só o que faltava.

A estratégia inverossímil do governo

Bons e ponderados pontos levantados pelo amigo Victor H M Loyola, sobre as possíveis “explicações” para o não veto do juiz de garantias. A terceira, a única que ele considera plausível, caiu por terra com a informação de que Toffoli deu o seu aval para o troço. E Toffoli certamente está bem acompanhado no Supremo nesse ponto. De modo que, quem está esperando que alguma ADIN prospere, pode esperar sentado.

Ainda sobre o jabuti do juiz de garantias, plantado pelo Freixo/Paulo Teixeira no pacote anti crime do Moro, que não foi vetado por Bolsonaro, e gerou grande irritação entre sua base de apoio, li alguns contrapontos defendidos pelos governistas, dos quais somente um merece credibilidade.

– O primeiro contraponto é que se trata de uma boa ação. Para os defensores dessa tese, nem tudo que é proposto pela esquerda é ruim e essa seria uma das boas ideias. Esses em geral foram os apoiadores de primeiro momento, para os quais qualquer ação do presidente se justifica. A medida em si é péssima, tornaria o sistema judiciário ainda mais lento e custoso. Apoiá-la é algo esdrúxulo, a menos que você seja um psolista, petista ou similar;

– O segundo contraponto seria de que tal medida não iria alterar muito a estrutura do judiciário e que Bolsonaro estaria dando um exemplo à esquerda de que seu governo atende às demandas democráticas e não é autoritário. Essa teoria vai por água abaixo em todas as frentes, primeiramente por que a medida, se implantada, causaria um grande transtorno ao Judiciário. Em segundo lugar por que Bolsonaro nunca se incomodou com o ‘feedback’ de esquerdistas e jamais pensou em conquistar votos da banda de lá, pois isso é absolutamente impossível de acontecer;

– O terceiro contraponto é uma teoria plausível. Como tal medida é inconstitucional e será fatalmente julgada como tal, Bolsonaro teria preferido jogar o abacaxi no colo de quem a pariu, no caso, o Congresso. O problema é que ao fazer isso ele desagradou parte importante de sua base de apoio e não conquistou simpatia de um mísero antibolsonarista, nem no Congresso, tampouco entre os eleitores. E se ao final do dia, tanto vetar quanto não vetar a medida não faria diferença pelo fato dela ser inconstitucional, por que não manter a coerência e vetá-la, tal qual ele fez com outras 25 emendas do mesmo pacote anticrime?

Para os que consideram esse terceiro ponto um primor de estratégia eu faço algumas perguntas:

– Que força teriam Freixo e o PT no a Congresso para impor sua vontade? De que adianta passar de flexível com esses interlocutores? A oposição tem sido surrada ao longo do ano, não me parece que uma medida como essa teria o poder de arregimentar deputados de várias colorações;

– Se a medida será considerada inconstitucional, por que alimentá-la com debates inúteis ao invés de se posicionar com coerência? Por que preferiu agradar a uns gatos pingados e desagradar boa parte de seus simpatizantes?

São perguntas em aberto que desafiam o terceiro contraponto, que considero uma teoria crível. Mesmo que ela seja verdadeira, a atitude do presidente me desagradou. Não somente a mim, como a tantos outros, inclusive muito mais defensores do governo que eu. Sinceramente, se foi realmente uma estratégia, questiono a sua efetividade.

Agora nos resta torcer para que esse jabuti caia da árvore. Nossa justiça já é extremamente custosa e lenta.

Setores da sociedade

O termo “setores da sociedade” é uma óbvia cortina de fumaça para dar ares de respeitabilidade ao pessoal que plantou a notinha.

Quais seriam esses “setores da sociedade”? Seriam os professores? Os sem-teto? As donas-de-casa? Ou seriam os petistas e todos os encalacrados na justiça que podem pagar advogados a peso de ouro? Façam suas apostas.

O Facebook usa os seus dados. Assim como toda a indústria de publicidade.

Editorial do Estadão diz, horrorizado, que o Facebook usa os dados do usuário “mesmo contra a sua vontade” para, vejam só, “ganhar dinheiro”.

Não lembro de ter tido a opção de assinar o Estadão “sem anúncios”. Eles vêm junto com a assinatura do jornal quer eu queira, quer não. Recebo um monte de anúncios “contra a minha vontade”.

Da mesma forma, o Facebook não dá a seu usuário a opção de não utilizar seus dados pessoais para receber seus anúncios. Ocorre que os smartphones vêm com um mecanismo para bloquear o GPS de certos aplicativos para os quais o usuário não deseja franquear a sua localização. O que Zuckerberg afirmou é que o Facebook tem condições de saber a localização do usuário por outros meios. O importante aqui é notar que, em momento algum, o Facebook permite que o usuário escolha não compartilhar os seus dados. Seria um suicídio empresarial, assim como um jornal que desse a opção de um jornal “sem anúncios” para o seu assinante.

– Ah, mas é diferente. O jornal não usa os dados pessoais dos seus leitores, os anúncios vão simplesmente encartados no jornal para quem o compra.

O jornal usa os meus dados pessoais sim. Ao vender espaço publicitário, o jornal descreve o seu leitor: classe A-B, nível universitário, morador preponderantemente dos bairros X, Y, Z. O Facebook faz exatamente a mesma coisa, segmenta os seus usuários com base em seus dados, só que com muito mais eficácia.

O Facebook é um aplicativo “gratuito”. E, a essa altura do campeonato, devem ser muito poucos os que acreditam que a gigante das redes sociais seja uma entidade filantrópica, em que seus funcionários vivem de água e luz. Todo mundo sabe que seus dados são o preço para usar “gratuitamente” a ferramenta, assim como sabem que a publicidade do jornal é o que paga o salário dos jornalistas.

Para aqueles que se sentem incomodados em compartilhar os seus dados, a solução é simples: deixe de usar o Facebook e qualquer outra rede social, da mesma forma que um assinante incomodado com os anúncios pode deixar de recebê-los ao deixar de ler o jornal. É sempre melhor o usuário decidir o que fazer do que o governo decidir por ele.

A inflação do governo

Claudia Safatle repercute estudo da CNI sobre a inflação brasileira nas últimas duas décadas (1999-2019). A conclusão é bem interessante.

Os três grupos de preços que mais subiram nos últimos 20 anos foram “serviços médicos e hospitalares” (374%), “energia elétrica” (358%) e “transporte público” (352%). O IPCA nesse período acumulou aumento de 240%.

Nestes três grupos temos o dedo do governo. No primeiro, além dos preços dos planos de saúde serem regulamentados pela ANS, o número de médicos é limitado pela autorização governamental para a prática da profissão. Nos outros dois grupos, os preços ou são diretamente estabelecidos pelos governos (no caso do transporte público), ou o são indiretamente, através da agência reguladora e das regras dos leilões de energia. Ainda no caso de preços regulados, uma parte do aumento dos preços teve a ver com a redução de subsídios por parte dos governos (no caso do transporte público) ou aumento de impostos embutidos (no caso da energia elétrica). Ou seja, o aumento de preços serviu para financiar os governos.

Dizem que se o capitalismo fosse deixado nas mãos dos mercados, viveríamos em uma selva. No caso brasileiro, pelo menos seria uma selva mais barata.

“Não vota mais em mim”

Não faço parte do “bando de internautas constitucionalistas e juristas” que estão criticando a falta de veto ao juiz de garantias. Não entendo nada disso. Mas o grupo Prerrogativas entende. E estão comemorando. Para mim, é o que basta.

Sim, o juiz de garantias vai me prejudicar, na medida em que introduz uma 5a instância no combate ao crime, em uma já morosíssima justiça. “Não vota mais em mim”. Ok.

Percentuais perdidos

Essa é para não dizerem que pego no pé de jornalista só por causa da Língua Pátria. Também a matemática é duramente maltratada nas redações desse nosso Brasil varonil!

Obviamente, o jornalista quis dizer “25,6 requerimentos por deputado”. Afinal, foram 256 requerimentos feitos por 10 deputados, o que resulta em 25,6 requerimentos por deputado. Mas aí um sinal de % se meteu lá no meio. E acabou ficando na informação de outros partidos: 13,1% do PCdoB e 3,6% na média da casa. Percentual do que? Do total de requerimentos da casa? Não né, o percentual de requerimentos do PSOL é de 256 sobre 1825, o que resulta em 14%. Se não houvesse a informação dos 256 requerimentos para 10 deputados do PSOL, estaríamos tentando entender a informação até agora.

Ok, ok, esse sinal de % pode ter sido um erro de digitação do estagiário.

A agência TASS do bolsonarismo

A antiga União Soviética contava com uma agência de notícias oficial, a TASS. Obviamente, todas as notícias eram pró-regime. Mesmo diante de fatos negativos, os bravos editores da agência não se deixavam intimidar. Tudo, absolutamente tudo, se dava de acordo com os planos do Kremlin. A piada que corria é que a explosão de um foguete soviético seria noticiada assim: “o foguete XYZ explodiu em sua base de lançamento rigorosamente conforme o planejado. Os engenheiros comemoraram o sucesso da missão”.

Ao ler por aí as justificativas para que Bolsonaro não vetasse o juiz de garantias, não consegui deixar de lembrar da agência TASS.