Reportagem do Valor traz a informação de que, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento Social, 99,98% da população de São Raimundo do Doca Bezerra (MA) recebem o bolsa-família.
Considerando que a população do município é de 4.946 almas, e fazendo a conta, isso significa que apenas 1 habitante não recebe o benefício. Fiquei tentando imaginar quem seria. Seria o prefeito? Um dos vereadores? O dono da vendinha entrevistado, que afirma que sem o bolsa família o comércio não sobrevive na cidade? O gestor do bolsa família na cidade? (sim, existe essa figura)
A reportagem apoia o programa, citando estudos que mostram que o IDH subiu mais em cidades onde o bolsa família beneficia mais de um terço da população.
É provável que o impacto seja positivo sim. Mas é necessário que o benefício seja concedido a quem realmente precisa. Não parece ser o caso de São Raimundo do Doca Bezerra.
Caminho pelas ruas domingo de manhã. Moro em um bairro residencial com muitas casas e ruas tranquilas.
Estou assim, a caminhar, quando ouço um homem chamar.
– Senhor, senhor, fica com um cartãozinho meu, se precisar de pintura.
Minha primeira reação foi de negar a necessidade e continuar meu caminho. Alguns passos adiante, mudo de ideia. Não porque precise de pintor nesse momento. Mas porque não podia perder a chance de prestigiar a alma do capitalismo.
O Gleison Almeida poderia estar dormindo em seu barraco na favela. Poderia estar em um acampamento do MTST. Poderia estar bebendo no bar. Poderia estar mendigando. Poderia estar fazendo “justiça social” nos semáforos das ruas.
Mas Gleison Almeida não se conforma com sua sorte. Acorda cedo (sabe-se lá onde mora) para estar pintando portão às 9:00 de um domingo.
E chama um estranho na rua para fazer a sua propaganda.
O capitalismo é um sistema realmente cruel. Nele, os que querem trabalhar, os que são criativos, os que não se acomodam, levam vantagem. Um horror.
Não podia deixar de compartilhar os contatos do Gleison. Não conheço as suas qualidades como pintor. Mas é provável que um sujeito que sabe instintivamente jogar com as regras do capitalismo deva entregar um bom serviço. Porque faz parte dessas regras.
Este é Eugenio Bucci, mais um intelequitual “não petista e não lulista”, defendendo o indefensável hoje no Estadão.
Este é só um trecho. O artigo todo é um monumento à desfaçatez.
Começa por cobrar dos juízes uma visão mais, digamos, “política” da história toda. Depois, relembra o impeachment de Dilma por “filigranas contábeis ultracomplexas” para dizer que a justiça começou a perder credibilidade aí. Como se o impeachment tivesse sido julgado pelo TRF-4 ou pelo STF e não pelo Congresso!
A seguir, diz que há “dois pesos e duas medidas” pois Temer continua aí com crimes muito mais graves e claros. Novamente, como se Moro e o TRF4 tivessem algo a ver com Temer! Eles adorariam julga-lo, tenho certeza. Em seguida, veio esse trecho aí embaixo.
Sério mesmo que um cara inteligente como Eugenio Bucci acha que o povo não entende que é impossível uma empreiteira instalar uma cozinha Kitchen de 140 mil e um elevador privativo em um apartamento não vendido?
Depois, vem o trecho em que Eugenio se contradiz: se o apartamento nunca foi ocupado por Lula, a história com o sítio é outra coisa, pois era casa de veraneio da família. Mas Eugenio não se dá por vencido: o caso em foco no TRF4 era o triplex, não o sítio. E sobre o triplex “não há provas”. Ora, ele inicia o artigo cobrando dos juízes uma visão, digamos, mais holística da coisa toda, mas quer que os juízes usem viseiras quando se trata de crimes absolutamente correlatos!
No parágrafo seguinte, cobra punição também para outros ex-presidentes que teriam levado vantagens ainda maiores. Não se dá ao trabalho de nomeá-los, porque certamente levaria um processo. A justiça funciona com provas, não na base de bravatas.
Para coroar, critica a rapidez do TRF4, afirmando que pode passar a impressão de que a justiça tem lado.
Aliás, essa é a grande desonestidade desse artigo: nunca é Eugenio Bucci que acusa ou desconfia. É o “povo”, que não entende as filigranas jurídicas. Um “fosso” estaria sendo criado entre a justiça e o “povo”, ameaçando a legitimidade das eleições e a os fundamentos da democracia. Ele, Bucci, estaria ali como um analista “isento”, somente alertando para os perigos da condenação de Lula “sem provas”. Bem, ele deve estar se referindo ao povo que ele conhece, aquele da Fefeléti. O povo mesmo sabe quanto custa fazer uma reforma em um imóvel, e que ninguém dá nada de graça para ninguém.