A primeira vez que ouvi falar de Gilberto Kassab foi nas eleições para prefeito de São Paulo de 2004. Vice na chapa de José Serra, Kassab assumiu o cargo em 2006, quando Serra saiu para ser candidato a governador. Nos dois anos que transcorreram até as eleições de 2008, Kassab conseguiu emplacar o grande marco da sua administração, a Lei Cidade Limpa, em que se proibiam outdoors e quaisquer outros tipos de publicidade externa na cidade. Foi uma lei bastante popular, que lhe garantiu a reeleição em 2008, contra nada menos que Geraldo Alckmin e Marta Suplicy. E reeleger-se na cidade de São Paulo não é para qualquer um: o último prefeito da cidade reeleito havia sido José Pires do Rio, no longínquo ano de 1928. Costumo dizer que a cidade de São Paulo é uma máquina de moer prefeito.
A aprovação da lei Cidade Limpa foi o que me fez definitivamente prestar atenção em Kassab. Não pela lei em si, mas pela forma como foi aprovada. O prefeito assumiu o cargo em março e já em setembro aprovou a lei. Detalhe: por UNANIMIDADE da Câmara dos Vereadores. Quer dizer, a lei que iria levá-lo à reeleição foi aprovada inclusive com os votos do PT! Ok, tem fisiologismo, toma lá, dá cá, tudo isso faz parte do “prefeiturismo de coalização”. Mas unanimidade? Havia aí um talento para a articulação política que merecia ser acompanhado.
Em 2010, eleito deputado federal, já em março de 2011 Kassab fundou o PSD para cooptar deputados do PSDB e do DEM então insatisfeitos com o fato de serem oposição ao governo Dilma. Ao ser perguntado sobre a posição ideológica do novo partido, Kassab definiu-se como “nem de direita, nem de esquerda, nem de centro”, definição lapidar para o que se convencionou chamar de Centrão.
O PSD foi criado para ser governo. Qualquer governo. Aliou-se ao PT, mas pulou fora do barco no impeachment. Apoiou a candidatura de Alckmin, mas Kassab já anunciou que está pronto a apoiar qualquer projeto do novo governo “pelo bem do país”.
Agora, Kassab faz mais um gambito que merece atenção: será chefe da Casa Civil do governo Doria. Vale lembrar que Kassab é cria de José Serra, de quem foi vice-prefeito, e a quem é ligado até hoje. O PSDB está conflagrado e a ida de Kassab para este posto chave indica que o campo de Serra entrou na órbita de Doria. Além disso, Doria conta agora com um articulador político de primeira, um ponto sabidamente fraco de seu perfil. A entrada de Kassab no gabinete de Doria é mais um sinal das pretensões nacionais do governador eleito de São Paulo.
Por fim, chama a atenção o fato de Kassab não ter nem sequer tentado negociar um cargo no governo Bolsonaro. O PSD, pela primeira vez desde a sua fundação, tem um governo pela frente que promete não trocar cargos por apoio no Congresso. A relação deverá se dar em outros termos, se é que se dará de alguma forma. Só o tempo dirá. Uma coisa, no entanto, parece certa: no dia em que Kassab se tornar oposição, é que o governo acabou.