Pedro Fernando Nery cai na provocação de Lula e se pergunta: será que nosso problema é que a “classe média” (definida pelo colunista como “aqueles que podem fazer escolhas”) consome demais?
Antes de começar, quero dizer que gosto dessa definição, aqueles que “podem fazer escolhas”. No mais miserável barraco da mais miserável favela brasileira você vai encontrar TV e celular. São escolhas, e essas pessoas entram na definição de Pedro Nery para a “classe média”. Sigamos.
Para início de conversa, é preciso reconhecer que, sem poupança não há investimento e, sem investimento, não há crescimento econômico. Este é o mais puro “supply side economy”, justamente o inverso do que Lula e sua camarilha econômica sempre propuseram, que o dinheiro “na mão do pobre” vira consumo e o consumo impulsiona o crescimento. Ciro Gomes pega bem essa contradição, ao chamar de “nacional-consumismo” o modelo econômico do PT, em contraponto ao seu “nacional-desenvolvimentismo”.
Mas voltemos à questão: o brasileiro “que pode fazer escolhas” consome demais? O que seria esse “consumir demais”? Lula refere-se à “ostentação” da classe média (vamos esquecer por um momento o relógio de R$80 mil que o pai dos pobres humildemente ostentava). Pedro Nery refere-se ao pouco gosto que “aqueles que podem fazer escolhas” têm pelo ato de poupar. Somos um país de consumistas.
Isso é verdade. Nosso nível de poupança é dos mais baixos do mundo. Mas o grande despoupador chama-se governo. No breve período de 15 anos em que fabricamos superávits primários (deve ter sido o único período na história do Brasil), usamos esta poupança para pagar os juros da dívida, fruto da despoupança dos anos anteriores. E, desde 2014, temos produzido novamente déficits primários. E de onde vem essa poupança que serve para pagar os juros da dívida e o déficit primário? Sim, vem da poupança dos que “podem fazer escolhas”.
O incentivo à poupança é baixo no Brasil. Temos uma história marcada por confisco e constantes surpresas inflacionárias. Assim, as pessoas que “podem fazer escolhas” escolhem consumir hoje a guardar o dinheiro para um amanhã que não sabem se vai chegar. Somos uma sociedade consumista, a começar do governo, o maior consumidor de todos.
Lula crítica a “ostentação” da classe média por motivos ideológicos. Ele mesmo deve achar esse discurso uma bobagem, mas falando aos seus, divide o mundo em “burguesia” e “proletariado”, sendo que seu partido é a vanguarda do proletariado. É permitida à vanguarda usar um relógio de R$80 mil, na medida em que está trabalhando para a libertação do proletariado de seus grilhões. “Ostentação” é uma categoria que se aplica somente à burguesia, que trabalha para a manutenção de seus privilégios. Pedro Nery toma esse discurso de Lula como uma chamada à poupança. Nada mais longe da realidade.