Uma contradição em termos

Claudia Safatle repercute, em sua coluna no Valor Econômico, a virada das estatais sob os governos Temer e Bolsonaro, em contraste com o desastre das gestões petistas. Safatle conhece bem o assunto: junto com Ribamar Oliveira, escreveu o livro Anatomia de um Desastre, sobre os anos Dilma, leitura obrigatória para quem quiser ter um retrato daqueles tempos, e uma das fontes que utilizei para a série de posts A Economia na Era PT.

De um prejuízo de R$ 40 bilhões em 2015, hoje as estatais geram lucro de R$ 180 bilhões. A estrela, como não poderia deixar de ser, é a Petrobras, que anunciou mais um lucro recorde nesse trimestre. Safatle faz apenas uma descrição de todas as iniciativas tomadas para essa virada, mas acho que não chega ao fundo da questão.

Quem olha os números frios pode ser tentado a concluir que se trata apenas de incompetência ou de roubalheira. Também é, mas creio que se trata de algo mais. A questão de fundo é a visão de mundo do PT. Segundo essa visão, as estatais são um instrumento para a implementação de políticas públicas, com a grande vantagem de não dependerem do processo chato de aprovação do orçamento no Congresso. A Petrobras perdeu muito, mas muito mais dinheiro com o congelamento de preços dos combustíveis (política monetária), com investimentos em refinarias e outras iniciativas (política industrial e política externa) e com manobras envolvendo o Tesouro para adiantamento de dividendos (política fiscal).

Tenho defendido aqui que, de fato, se uma estatal não serve para fazer política pública, então por que raios precisa ser estatal? Não por outro motivo, Bolsonaro já anunciou que vai trabalhar pela privatização da Petrobras em um segundo mandato. E, também, não por outro motivo, Lula e os petistas criticam toda e qualquer privatização. Trata-se de uma visão de mundo. A qual, aliás, é compartilhada pela maioria dos brasileiros.

Ter estatais que “dão lucro” é quase uma contradição em termos. Significa que não estão cumprindo a única função que lhes dá razão de existir, que é servir como instrumento para o governo implementar suas políticas por fora do orçamento. Lula e o PT estão aí para nos lembrar disso.

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