Conta a história que um diplomata francês e o ditador da União Soviética, Josef Stálin, estavam em uma reunião antes do início da guerra, onde discutiam um pacto de não agressão. Depois de ter desfiado todas as vantagens do pacto para a União Soviética, o diplomata achou por bem jogar mais uma carta na mesa: o Vaticano veria com bons olhos aquele acordo, e Stálin poderia contar com a boa vontade do Papa. No que Stálin respondeu com a frase que ficaria famosa, e que serve até hoje para descrever as relações de poder: “quantas divisões tem o Papa?”
No Brasil do século XXI, alguém poderia perguntar: “quantas divisões tem o STF?” Stálin vivia em um mundo e em um contexto político em que o número de soldados e armas era a medida do poder. O STF, por outro lado, só tem ao seu lado o arranjo institucional brasileiro. E este arranjo é mais forte do que a força das armas.
Bolsonaristas passam as horas e os dias acampados em frente aos quartéis, clamando por uma “intervenção militar”, eufemismo para golpe. Os militares têm à sua disposição muitas divisões. O que os impede de “resolver” a questão? Simples: as “divisões” que importam estão nas mãos do STF. Engana-se quem acha que o golpe de 64 foi realizada pelos militares. A sociedade civil, a opinião pública e a grande maioria dos agentes políticos queria se livrar de Jango. Os militares apenas operacionalizaram o processo. Foram as instituições brasileiras que expeliram Jango, não os militares.
Hoje, qualquer movimento militar seria recebido com absoluta resistência por parte das principais instituições do país e por parte relevante da opinião pública. O dia seguinte ao movimento seria recebido por uma resistência política fenomenal e pelo não reconhecimento do novo governo por parte de nossos principais parceiros. Viraríamos um pária internacional.
Alguém já disse que a guerra é a diplomacia por outros meios. Quando as instituições falham, a força bruta (o número de divisões) passa a fazer o papel da lei. No Brasil de hoje, as instituições estão firmes e fortes. Podemos não concordar com suas decisões ou seu modus operandi. Podemos, inclusive, achar que essas instituições estão levando o Brasil para o buraco. O que não podemos fazer é ignorar que elas existem. O STF, afinal, conta sim com muitas divisões.