Analisando a “extrema direita”

Fernando Gabeira, como quase sempre, lúcido.

Sempre tive prevenção ao uso do termo “extrema direita” para qualificar qualquer um que não fosse social-democrata ou esquerda no Brasil. No entanto, no contexto do artigo, ”extrema direita” está bem colocado, pois se refere aos baderneiros do 8 de janeiro. Neste caso, são extremistas sim, assim como é extremista a esquerda que invade propriedades.

Gabeira afirma que a análise do 8 de janeiro está muito rasa, limitando-se aos seus aspectos folclóricos. E, eu acrescento, a frases de efeito, tipo “não passarão!” Por debaixo desse extremismo folclórico, encontra-se uma camada gigante de ressentimento, medo e revolta.

Há alguns dias, manchete estampava resultado de uma pesquisa que apontava que 40% das forças policiais, apesar de não apoiarem os eventos de 8 de janeiro, concordavam com suas motivações. A pesquisa foi divulgada como evidência de como a ideologia da extrema direita havia penetrado nas forças de segurança. Alarme geral!

No entanto, seria de se espantar que essa pesquisa resultasse em algo diferente. Em números redondos, 40% da população votou em Lula, 40% votou em Bolsonaro e 20% se absteve ou não compareceu. Portanto, 40% da população vê algum mérito nos protestos, ainda que possa discordar veementemente dos métodos adotados. E os policiais não vieram de Marte, são apenas uma amostra da população.

O único senão dessa análise de Gabeira é confundir, talvez de maneira não intencional, esses 40% da população com a “extrema direita”. O fenômeno, como ele mesmo diz, é muito maior do que essa meia dúzia de aloprados que achou que poderia derrubar a República a golpe de marretas. E, como afirma Gabeira com rara lucidez para um analista de esquerda, o Lula que assumiu a presidência só piora o problema, ao querer implementar uma agenda que ignora completamente os 40% que querem vê-lo pelas costas.

Sim, eleição é “one takes all”, e Lula foi o eleito, estando no seu direito de implementar a agenda que lhe bem aprouver. Mas, ao ignorar a sua estreita margem de manobra, Lula se arrisca a perder tudo. Gabeira pressente isso, ao comentar sobre as eleições de 2026. O espantalho Bolsonaro vai desaparecer. Mas os 40% que aceitaram votar até em Bolsonaro para evitar o PT continuam por aí. É muita gente para que Lula se sinta tão autoconfiante.

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