O que faz as pessoas se levantarem de suas poltronas, onde poderiam muito bem estar assistindo à sua série favorita, para sairem às ruas? Este mês de junho marca os 10 anos em que as pessoas saíram as ruas sem uma pauta definida, o que causa perplexidade até hoje.
Entendo que o denominador comum dos manifestantes era a qualidade dos serviços públicos. O estopim foram os R$ 0,20, mas logo ficou claro que não era pelos R$ 0,20, mas pelos R$ 3,20 cobrados da população sem um serviço condizente. Extrapolando, serviços públicos péssimos em troca de nossos impostos. Mas o fundamental dessas manifestações foi a hostilidade a toda classe política. Bandeiras de partidos eram arrancadas, para deixar claro que os partidos eram parte do problema.
Mas, ao contrário de algumas análises que li por aí, minha avaliação é de que não se tratava necessariamente de manifestações anti-institucionais. A hostilidade aos políticos significava simplesmente que os políticos estavam do outro lado da mesa. Mas havia uma mesa, e havia o outro lado. Não estava em pauta uma virada de mesa.
O mesmo podemos dizer sobre as manifestações pelo impeachment, um instituto baseado em lei, por dentro das instituições. A narrativa de “golpe” se restringe aos petistas, estes sim, não muito afeitos à institucionalidade.
Já as manifestações em apoio a Bolsonaro tinham o espírito da virada de mesa. Bolsonaro ocupou o vácuo político deixado pela falta de resposta dos partidos políticos aos manifestantes de junho de 2013. Aquelas jornadas foram um aviso não correspondido, e que desembocou em Bolsonaro e seu discurso antissistema. Mesmo depois do capitão ter sentado no colo de Ciro Nogueira e Valdemar da Costa Neto, seus seguidores continuaram acreditando que aquilo se tratava de tática de curto prazo, com o grande objetivo de virar a mesa. Os eventos de 8 de janeiro foram uma tentativa tardia de “empurrar a história” nessa direção.
10 anos depois, os motivos que levaram às jornadas de junho continuam aí, intactos. 10 anos depois, os manifestantes estão mais céticos, mais cínicos. Talvez seja necessária uma nova geração de brasileiros, que não sofreram a decepção de verificar que a realidade não se move, independentemente do número de pessoas que saem às ruas, para que tenhamos manifestações semelhantes. Até lá, só nos resta escrever textões no Facebook.