O elixir dos desenvolvimentistas

Neste artigo, três professores da FEA, com o pretexto de atacar o regime de capitalização da previdência, na verdade tentam nos convencer de que o problema da Previdência no Brasil se resolve com crescimento econômico.

Ao afirmarem que a reforma não gerará ganhos fiscais no curto prazo e que o problema da Previdência se manifestará apenas ao longo de 40 anos, os professores, na prática, descartam a reforma como algo fundamental. O problema, segundo eles, seria a falta de crescimento econômico.

Esta é a realidade fantástica em que vivem os economistas chamados “desenvolvimentistas”. Para estes, o crescimento econômico é uma espécie de elixir que está sempre à mão para que todos os desequilíbrios deixem de existir como que por mágica.

Imagine que uma família viva acima de sua renda. Ela começa a se endividar para manter o seu padrão de vida, com a confiança de que, no futuro, vai aumentar a sua renda de modo a pagar as suas dívidas. Aliás, ela começa a se endividar para montar um novo negócio, com a esperança de que este novo negócio seja capaz de gerar a renda necessária para pagar tanto as dívidas do negócio em si como as dívidas geradas pelo seu padrão de vida acima de suas posses. Este é o raciocínio dos economistas desenvolvimentistas. Para estes, é possível manter o padrão de vida dos aposentados com o aumento da renda futura das pessoa que trabalham. E se a renda não aumentar? Esta é a pergunta que se fazem os credores hoje.

Mas para estes heróis da resistência desenvolvimentista, a reforma da Previdência deveria ficar em segundo plano e o governo deveria focar fortemente na retomada do crescimento econômico. Afinal, com o crescimento, todo o resto se resolve. Seria uma espécie de moto-contínuo: o endividamento tem importância secundária, desde que se mantenha o crescimento econômico. Este se manteria porque todo mundo sabe que, sem crescimento, a dívida é impagável. Seria uma espécie de bicicleta: se parar de pedalar, todo mundo cai.

Aliás, foi o que aconteceu nos anos Dilma: um governo desenvolvimentista que patrocinou uma série de políticas pró desenvolvimento e deixou uma penca de esqueletos fiscais nos armários da República. Aos poucos, os agentes econômicos descobriram a natureza da brincadeira e pararam de pedalar.

É óbvio que o crescimento econômico é fundamental. Afinal, em casa onde falta pão, todo mundo grita e ninguém tem razão. O busílis é saber como fazer o país crescer. Aliás, o problema fiscal também afeta o crescimento econômico. Na medida em que os agentes econômicos começam a duvidar da capacidade do Estado de fazer frente às suas dívidas, começam a precificar um calote futuro, seja por via de suspensão do serviço da dívida, seja por via inflacionária. Este calote potencial é um claro inibidor de investimentos. E, sem investimentos, não há crescimento econômico. O equilíbrio fiscal não é condição suficiente para o crescimento econômico, medidas para o aumento da produtividade são igualmente fundamentais. Mas é condição absolutamente necessária.

A questão da previdência NÃO se resolve com crescimento econômico. É o justo contrário. Senão, a bicicleta não para em pé. Eu esperaria que os anos Dilma tivessem deixado isso claro. Pelo visto, não.

O sonho mirabolante

Já falamos sobre isso aqui.

Dizem que foi a Lava-Jato que matou as empreiteiras e nos jogou nessa recessão.

Nada mais falso.

Mesmo que não tivesse havido um pingo de corrupção, talvez levássemos mais tempo para chegar onde chegamos, mas chegaríamos do mesmo jeito.

Escolhendo o menos pior

Passei férias em Buenos Aires em janeiro de 2014. Alguns lugares aceitavam o real, ao câmbio de 4 para 1. Ou seja, um real comprava 4 pesos.

Ontem, esse mesmo câmbio fechou em 9 para 1. Hoje, um real compra 9 pesos.

E lembre-se, o real também se desvalorizou muito nesse período em relação ao dólar. Mas o peso argentino se desvalorizou muito mais.

Não por coincidência, Argentina e Venezuela são os dois países com as finanças mais em frangalhos na América do Sul. Anos e anos de políticas populistas, aquelas baseadas na premissa Unicampiana de que basta estimular a demanda para o país crescer, resultou em uma inflação estratosférica e na corrida contra a moeda. O dinheiro para estimular a demanda simplesmente acabou.

Brasil, Equador e Bolívia, apesar de fazerem parte do “circuito bolivariano” por muitos anos, não chegaram a este ponto. Lula, Correa e Evo tiveram a esperteza de se elegerem com um discurso de esquerda e governarem a economia com práticas de direita. Os três países estão longe de serem economias exemplares, mas não chegam perto de Argentina e, principalmente, Venezuela.

Dilma estava nos levando para o mesmo caminho. Ela de fato acreditava que a mão forte do Estado era fundamental para fazer a roda da economia girar. O país percebeu que a vaca estava indo para o mesmo brejo onde já estavam os dois países-irmãos, e resolveu impicha-la antes. Temer pode ter todos os defeitos do mundo, mas é preciso reconhecer que, com ele, aquela trajetória foi, ao menos, interrompida.

Agora temos uma eleição. É preciso distinguir, dentre os candidatos, aqueles que retomariam o caminho para o desastre. Considerando os que têm chance de vitória, Haddad e Ciro vestem esse figurino. Seus programas de governo são populistas na área econômica, e têm a fé no Estado como indutor do crescimento econômico como ponto em comum. O risco é que, tanto um quanto o outro, realmente acreditam nisso, assim como Dilma acreditava. É difícil encontrar um candidato que bata 100% com nossas preferências. Em uma eleição majoritária, é preciso, muitas vezes, votar no menos pior. Antes de votar, vou dar uma olhada na Venezuela e na Argentina. E vou procurar votar de forma a diminuir as chances de que o Brasil retome o mesmo caminho.

Economia = Matemática + Bom Senso

Certa vez, um professor meu da Poli definiu Engenharia como Física mais bom senso. Poderíamos fazer o mesmo paralelo entre Matemática e Economia: a Economia seria Matemática mais bom senso.

Uma das críticas mais comuns dos “desenvolvimentistas” é que os economistas ortodoxos seriam “cabeça de planilha”, ou seja, estariam presos à Matemática, não deixando espaço ao bom senso que faz a boa economia.

No entanto, ao ouvir certas propostas de “desenvolvimentistas”(como por exemplo, o governo tirar todos os nomes do SPC), parece o contrário: da Matemática retira-se o bom senso, e resta uma peça de ficção.

Um exemplo é a resposta universal que todo economista heterodoxo dá quando lhe perguntam de onde sairá o dinheiro para as suas políticas. Ora, do próprio crescimento econômico gerado pela política adotada, respondem. É o moto-perpétuo das políticas que estimulam a demanda. Se funcionassem, não haveria país pobre nesse mundo de Deus.

Quando não funcionam, os culpados são “a má-vontade da mídia”, “as pautas-bomba do Congresso”, “a sabotagem da plutocracia”, etc. Nunca as políticas adotadas.

Claro, a Economia é uma ciência humana, não se resume à Matemática. Mas assim como a Engenharia não pode desafiar a Física, a Economia não pode desafiar a Matemática. Mas desafiar a Matemática não é a única proeza dos economistas heterodoxos. A própria Economia sofre nas mãos desse pessoal. São sempre propostas de uma nota só: estimular o consumo e o investimento com recursos governamentais. Não consideram nada sobre o comportamento dos consumidores e das empresas, as consequências não intencionais das políticas adotadas, as expectativas racionais dos agentes, o papel das instituições, enfim, tudo que é mainstream nas economias mais desenvolvidas lhes é estranho.

Adaptando a equação do meu professor da Poli, a Economia seria Matemática mais bom senso. Para Ciro Gomes e os economistas do PT, a equação é outra: Economia não é nem Matemática e nem bom senso.

O PT com boas intenções

José Serra escreve hoje artigo no Estadão defendendo a concessão de subsídios por parte do governo.

Mas não qualquer subsídio. Somente aqueles que “propiciam benefícios diretos e indiretos”, que “passem com critérios de mérito”, que “sejam para projetos eficientes”.

Claro, José Serra seria um governante do bem. Em seu governo não haveria subsídios para projetos que não propiciassem benefícios, que não tivessem mérito e que não fossem eficientes. Dilma Rousseff assinaria embaixo.

Duas são as desculpas para o uso de subsídios, segundo Serra.

A primeira seria a alta “concentração bancária”. Meia dúzia de bancos dominam o crédito no Brasil e praticam spreads altíssimos, inviabilizando projetos de longo prazo. Não lhe ocorre que, quando entra um banco público praticando taxas mais baixas, os bancos privados, se pudessem, também baixariam as suas taxas, para competir com o novo concorrente. Não o fazem por dois motivos: 1) a taxa praticada pelo BNDES, via de regra, não paga o risco desses projetos e 2) é muito mais confortável para os bancos comprarem títulos públicos que pagam taxas maiores que as taxas subsidiadas, títulos esses que VÃO FINANCIAR OS SUBSÍDIOS! Ou seja, os bancos ganham dinheiro na maciota financiando o déficit público criado pelos subsídios.

Dilma levou esse raciocínio ao extremo, ao obrigar os bancos públicos a baixarem os spreads na marra também para as pessoas física, esperando que os bancos privados fizessem o mesmo. Esperou sentada. Os bancos públicos ganharam market share, e agora estamos discutindo uma capitalização da Caixa para cobrir o rombo dessa política irresponsável, que acaba sempre estourando no colo do contribuinte. Mas claro, Serra faria isso da “maneira certa”. Afinal, ele é um tucano, não um brucutu petista.

A segunda desculpa são as tais “externalidades positivas” criadas por projetos de infraestrutura. Um exemplo (não usado no artigo): uma estrada beneficia não somente quem passa por ela, mas todo o seu entorno. Seria injusto então cobrar pela obra somente de quem usa diretamente a estrada. Ok. Então, ao invés de cobrar somente do usuário, vamos cobrar de todo brasileiro, inclusive do favelado que mora a milhares de quilômetros da estrada. Haveria formas mais inteligentes de focar essa cobrança naqueles que se beneficiam mais de perto com aquela obra.

Mas Serra não usa esse exemplo, que até seria razoável. No artigo, ele usa o caso dos subsídios aos caminhoneiros como uma externalidade positiva! Ou seja, fomos feitos de reféns de uma determinada categoria profissional, e o preço do resgate (subsídios de R$10 bilhões) é saudado como um bom gasto do governo! É o fim da picada!

Serra vê o Estado como indutor do crescimento econômico, aquele que vai aonde a iniciativa privada não quer ir. Não lhe ocorre que a iniciativa privada não vai porque não vale o custo Brasil. Custo Brasil que só aumenta com os subsídios. Ao invés de investir em uma agenda para diminuir o Custo Brasil e, assim, baixar a régua para atrair a iniciativa privada, Serra prefere ignorar o Custo Brasil e colocar dinheiro do contribuinte em projetos que, ao final do dia, não se pagam, justamente porque os ganhos não compensam os riscos.

José Serra é o tucano típico, aquele que vai fazer as mesmas políticas econômicas equivocadas propostas pelas esquerdas, mas “da maneira certa”. Como se o problema fossem os ingredientes e não a receita.

Esta é a faceta econômica de um problema mais abrangente dos tucanos: a população vem descobrindo que não passam de petistas com os “ingredientes certos”. Ora, metade da população, se é para escolher políticas econômicas de esquerda, prefere a esquerda original. A outra metade não quer mais essa receita, mesmo que os ingredientes venham das mais puras e bem-intencionadas origens.

Alckmin deveria começar por aí sua análise de porque perdeu patrimônio político de maneira tão rápida em seu próprio Estado.

O moto-perpétuo dos gastos públicos

Entrevista de Laura Carvalho no UOL, desfilando o argumento favorito dos desenvolvimentistas: o moto-perpétuo dos gastos públicos.

Por esse “raciocínio”, bastaria o governo (qualquer governo) aumentar os gastos para aumentar a arrecadação de maneira mais do que proporcional. Assim, no limite, não há porque ter limite para o gasto público, pois este criaria a própria arrecadação.

Se fosse assim fácil, todos os países perdulários seriam riquíssimos. Não é o que vemos, pelo contrário. E quando este tipo de coisa não dá certo, é porque o investimento não foi feito “no lugar certo”.

E gente assim está na FEA-USP.

A tungada escondida

Ainda Ciro Gomes.

Pedro Nery, em excelente artigo hoje no Valor, usa as próprias ideias de Nelson Marconi (principal assessor econômico de Ciro) para desmascarar o que realmente significa o projeto “desenvolvimentista”.

O Santo Graal dos economistas desenvolvimentistas é um certo “câmbio de equilíbrio industrial”, que permitiria que a indústria local se tornasse competitiva. Em recente entrevista ao Valor, Marconi teria indicado que um câmbio entre R$ 3,80 e R$ 4,00 cumpriria este papel. (Não se iluda, este alvo é móvel, quando o câmbio chegar lá, o novo “câmbio de equilíbrio industrial estará mais para cima. Mas sigamos).

Pois bem: o que Pedro Nery vai garimpar em um livro do próprio Nelson Marconi, em co-autoria com Bresser-Pereira (!), é a admissão dos efeitos desse câmbio mais desvalorizado: diminuir os salários reais, via inflação. Ou seja, os trabalhadores precisariam ser convencidos a não terem seus salários reajustados, de modo a tornar as empresas mais competitivas com o novo câmbio! Caso contrário, aquela desvalorização real se torna apenas nominal, não servindo para aumentar a competitividade da indústria.

O trecho destacado abaixo descreve como Marconi resolveria a questão: através de um papo franco entre empresários e trabalhadores, intermediado pelo governo! Muito fofo. Faz lembrar as “câmaras setoriais” da Dorothea Werneck no governo Sarney, em que se tentava lidar com a inflação na base do papo.

Trabalhador: saiba que, quando alguém fala em “incentivos para a indústria” e “câmbio no lugar certo”, na verdade estão querendo tungar você.

Ponto fora da curva

A jornalista começa a entrevista tentando provocar a velha cantilena “desenvolvimentista”. Ioschpe corta de cara, dando nome aos bois do problema econômico brasileiro. O resto da entrevista é exemplar e, mesmo sendo presidente do Sindipeças, em nenhum momento chora pela falta de “incentivos” para a indústria.

Ioschpe é um ponto fora da curva. Se os empresários brasileiros pensassem como ele, o Brasil estaria em outro patamar de desenvolvimento.

Estamos sodidos

D E S M O N T E

M O D E L O

C R E S C I M E N T O

Este é José Serra, em artigo de hoje no Estadão.

Poderia ter sido escrito por Dilma Roussef ou Ciro Gomes.

E o mercado ainda fica animado com a perspectiva de algum cacique do PSDB chegar à presidência. Talvez porque as alternativas sejam ainda piores.

Temer, em comparação, parece um liberal raiz.

Estamos sodidos.