Quem será o verdadeiro presidente

Gilberto Carvalho revela o esquema:

1. Haddad é eleito.

2. O presidente Haddad indulta Lula.

3. Lula é nomeado ministro da Casa Civil.

4. Lula governa como o presidente “de facto”. Haddad passa a ser apenas um “presidente-fantoche”.

Se, em um hipotético 2o turno entre Haddad e Bolsonaro, eu ouvir alguém defendendo o voto em Haddad em nome da “governabilidade”, da “moderação”, da “modernidade”, da “preservação da democracia”, sou capaz de partir para as vias de fato.

O bode expiatório perfeito para governos incompetentes

“Temos que enfrentar os bancos. Bancos foram feitos para serem enfrentados. Nós não temos mais paciência com esses caras.”

Esse é Fernando Haddad, na Paraíba, ontem.

Banco é um troço muito simples: trata-se de um lugar que faz a intermediação entre pessoas com excesso de dinheiro e pessoas que precisam de dinheiro. A isso chamamos de crédito.

O crédito, segundo o programa do PT, deve ser a mola propulsora do novo ciclo de desenvolvimento do país.

Assim, ligando uma coisa à outra, o que Haddad disse foi: “vamos obrigar os bancos a fornecerem crédito barato”.

Lembro como se fosse hoje. Corria o ano de 2004 e, certo dia, meu finado pai me contou, todo contente, que tinha aberto uma conta no Citibank. Além do status, o banco lhe havia garantido uma linha de crédito no cheque especial de R$10 mil.

“Tenho conta no Bradesco há 30 anos, e o meu cheque especial tem mil reais de limite”, contou, não sem uma ponta de mágoa.

Pensei cá com meus botões: se o Bradesco, com 30 anos de histórico, deu só mil reais de limite, motivo deve ter.

Não deu outra. Pouco mais de 10 anos depois, coube a mim renegociar as dívidas de meu pai na esteira da maior recessão da história (isso foi anos antes do programa Limpa Nome do Ciro que o PT roubou). Adivinha quem era, de longe, o maior credor? Exato, o banco americano que achou que sabia dar crédito no Brasil. O resto é história: poucos anos depois, o Citi encerraria suas operações de varejo no país, ajudando a concentrar, ainda mais, o mercado bancário.

Intermediar crédito é uma arte. Significa antecipar a inadimplência esperada, e cobrar um spread suficientemente alto para compensá-la. Para isso, o histórico do cliente e uma certa previsão sobre o ciclo econômico são as únicas bases sobre as quais o banco se apoia.

Quando, em 2012, Dilma “perdeu a paciência” com os bancos e forçou a redução dos spreads por parte dos bancos públicos, os bancos privados recuaram e perderam market share. Pensei cá com meus botões: se os bancos privados não acompanharam a redução dos spreads, aí tem.

Foi só uma questão de tempo para que a inadimplência aumentasse, na esteira da maior recessão do País.

O curioso é que, no raciocínio do PT, tanto na época quanto hoje, o crédito mais barato faria “a roda da economia girar”, o que, por si só, garantiria o pagamento desses empréstimos. Faltou combinar com os russos, ou melhor, com os agentes econômicos, que se retraíram diante da crescente intervenção do Estado no domínio econômico. Se ontem foi o setor elétrico e hoje são os bancos, amanhã poderei ser eu a sofrer nas mãos de um governo discricionário. Ninguém investe em um ambiente desses e, sem investimento, a demanda criada pelo crédito fica pendurada na broxa.

Mas Haddad, claro, é diferente de Dilma. Ele sabe que não se reduz spread por decreto. Por isso, ele propõe um imposto sobre o spread. Alexandre Schwartsman, em recente artigo na Folha, demonstra que esse imposto aumentaria o spread justamente para os que mais precisam de crédito, pois o custo seria repassado pelos bancos.

No limite, os bancos saem do mercado, deixando de dar crédito. Talvez seja esse mesmo o sonho de Haddad e dos economistas do PT: um mercado de crédito dominado pelos bancos públicos, que teriam, ao mesmo tempo, sensibilidade social e sentido de missão. Sensibilidade e sentido que seriam pagos, no final do dia, pelo contribuinte, quando o Tesouro fosse chamado a capitalizar esses bancos para cobrir a inadimplência de empréstimos mal dados.

Bancos são o bode expiatório perfeito para governos incompetentes.

Fale com a ex-presidente Dilma

Da coluna de Maria Cristina Fernandes, hoje, no Valor:

“[…] resposta de um integrante do Centrão à indagação sobre como fariam para lidar com um Haddad presidente: ‘Vamos dar para ele um cartão com o telefone da ex-presidente Dilma’”.

O mesmo vale para Bolsonaro e Marina.

Corra para as montanhas

O mercado financeiro tem como esporte ser enganado.

Com Dilma foi a mesma coisa. Dilma veio com um discursinho de eficiência e rigor fiscal que encantou boa parte do mercado durante um bom tempo. A intervenção no setor elétrico foi um choque de realidade. Mesmo depois de tudo o que aconteceu, o mercado deu um voto de confiança quando Joaquim Levy foi apontado como ministro da Fazenda. Dilma havia, finalmente, se rendido à realidade.

Este é o problema do mercado: achar que todo político, mais cedo ou mais tarde, vai se render à realidade. Não lhes ocorre que, talvez, esse tipo de político ideológico realmente acredite na eficácia de medidas sabidamente ruins. Dilma se achava muito “pragmática”, palavra especialmente apreciada pelo mercado.

Lula foi o único petista capaz de surpreender e de ser realmente pragmático. Ou seja, sem escrúpulos de ganhar uma eleição com um discurso de esquerda e governar com um programa de direita. E sua ascendência sobre o partido lhe permitiu fazer isso por um tempo.

Haddad não tem ascendência sobre o partido e está longe de ser um pragmático. Trata-se de um scholar preso a esquemas ideológicos muito bem definidos.

Não se deixe enganar pelo canto das sereias. Se Haddad for eleito, corra para as montanhas.

Dilma 2: a missão

Mais um pouco sobre “transferência de votos”.

Por enquanto, Haddad é um nanico nas pesquisas. Quando começar a incomodar, as outras campanhas começarão a lembrar do outro poste de Lula.

Dilma será a pedra no sapato na estratégia de transferência de votos. “Já elegemos um poste de Lula, vamos repetir o desastre?” é um mote óbvio.

Não à toa, mais da metade dos que votam em Lula não votam em Haddad de forma alguma, conforme DataFolha e Ibope. Isso, antes da campanha dos adversários começarem a destruição (ainda que, como sabemos, o dono de metade do horário na TV ser um incompetente nessa matéria).

Então, o PT tem 2 desafios: ligar Andrade a Lula E convencer que Andrade não é Dilma 2, a missão. Vamos ver.

Erguendo o poste

A pesquisa de ontem do Ibope indicava que 28% dos eleitores de Lula votariam com certeza em um candidato indicado por Lula.

Na pesquisa de hoje do DataFolha, este número é de 31%.

Como Lula está com 37%-39% nas duas pesquisas, o potencial inicial de Haddad é de 10,4% a 12,1%, o que não seria suficiente para colocá-lo no 2o turno.

Já os que “talvez votem no candidato indicado por Lula” totalizam 22% no Ibope e 18% no DataFolha. Digamos que a propaganda do PT consiga converter metade desse contingente. Isso dá de 3,3% a 4,3% adicionais.

Ou seja, fazendo uma conta de padaria, Haddad sai com um potencial de 13,7% a 16,4%. Marina está com 16% no DataFolha e 12% no Ibope.

A questão que se coloca é: a propaganda do PT será eficiente para aumentar esse potencial? O PT tem dois desafios: fazer Haddad (ou o Andrade) conhecido e ligá-lo a Lula. Isso em menos de um mês.

O mercado ontem piorou por que já considera que o PT está no 2o turno. Eu continuo achando que os asseclas de Lula vão ter muito trabalho pra erguer esse poste.

Haddad virou Andrade

Complementando meu post de ontem sobre a potencial transferência de votos de Lula para Haddad.

A votação se dá em urna eletrônica. Ao contrário da cédula, onde aparece uma lista, na urna só se exige a digitação do número. O eleitor poderá ser instruído a votar “no Lula” digitando o 13. Isso aumenta as chances de votação no poste, que seriam menores se a votação fosse em cédulas.

A incógnita é o que o eleitor vai fazer quando não aparecer a foto do Lula, e sim do Andrade. Ele vai apertar “confirma”, ou vai achar que teve algum engano e anular o voto?

Transferência de votos muito difícil

Uma das grandes incógnitas desta eleição é o poder de transferência de votos de Lula para o seu poste.

Lula conseguiu fazer isto em 2010. Dilma, uma completa desconhecida até um ano antes das eleições, foi ungida e levada à vitória por seu padrinho. Convém relembrar como foi esse processo.

– Em junho/2005 (portanto, mais de 5 anos antes da eleição de 2010), Dilma assume a cadeira de ministra da Casa Civil, que pertencia a José Dirceu. A partir de então, começa a ganhar visibilidade no mundo político.

– Em março/2008 (2 anos e meio antes das eleições), Lula lança Dilma como a “mãe do PAC”, o mote que usará na campanha.

– Em setembro/2008, mais de dois anos antes das eleições, em pesquisa CNT/Sensus, Dilma já aparece com 8% das intenções de voto, contra 38% de Serra.

– Em maio/2010, 5 meses antes das eleições, Dilma empata com Serra nas intenções de voto.

– Em outubro/2010, Dilma vence as eleições no 2o turno, contra Serra, por 56% a 44%.

Então, vejamos:

– Dilma foi preparada como o “poste” de Lula durante mais de 5 anos, em uma construção lapidada dia a dia.

– o governo Lula chegou, no final de 2010, a 89% de aprovação, recorde mundial de popularidade de todos os tempos- a economia crescia a 7,5%- e, last but not least, Lula tinha a caneta na mão.

Hoje, temos um quadro um pouco diferente:

– Faltando pouco mais de um mês para as eleições, Haddad ainda não foi lançado candidato.

– Na pesquisa mais recente, Haddad aparece com 4% das intenções de voto.

– O último cargo público de Haddad, que lhe deu alguma visibilidade, foi o de prefeito de São Paulo, há pouco menos de 2 anos. Vale lembrar que perdeu a reeleição ainda no 1o turno.

– Haddad foi ministro da educação de Lula há longínquos 8 anos. A única coisa de que consigo lembrar foram as lambanças no ENEM (convenhamos, menos glamouroso que o PAC).

– o PT não tem a máquina federal na mão.

– o PT conta com 256 prefeituras. Em 2010, eram 558 prefeituras.

– o vice de Dilma era Michel Temer, com toda a máquina do PMDB. O vice de Haddad é Manuela D’Ávila.

– Em 2010, Lula era presidente do Brasil. Hoje, Lula está preso e incomunicável.

Claro, tudo sempre pode acontecer. Mas vamos convir que essa transferência de votos parece muito, mas muito mais complicada agora. O fantasma do Lula todo-poderoso, aquela entidade que domina a política brasileira com sua popularidade à prova de bala, parece turvar o discernimento dos analistas. Fala-se de transferência de votos como uma varinha mágica, em que Lula-Midas transforma em ouro até um monte de josta.

Lula gastou muita sola de sapato, planejou muito bem cada passo, para transformar seu poste em presidenta da república. Claramente não é o caso de Haddad, um tapa-buraco de última hora, apenas para marcar a posição do partido. Repito: tudo pode acontecer. Mas uma eventual ida de Haddad ao 2o turno seria uma grande surpresa, inclusive para Lula.