Interlocutor construtivo

“Esse Tarso Genro, que é do PT e prefeito de Porto Alegre, me parece que é um dos melhores do PT, se não for o melhor. Quero ter uma conversa com ele […], porque acho que ele pode ser um interlocutor mais construtivo dentro do PT.”

FHC, setembro 1996

FHC é o principal culpado pelo fato de termos sofrido 13 anos de governo do PT.

Estamos no mesmo ponto

“… a Previdência, tal como ela é hoje, não dá, porque os professores vão se aposentando na média com menos de 50 anos (…) Então, teríamos que resolver de uma maneira racional, como estamos propondo nas várias reformas. (…) posso ganhar, posso perder, mas, se perder, como elas (as reformas) estão certas, mais adiante o problema voltará com mais força, e vai acabar quebrando tudo. (…) mas tem razão o professor de Minas que disse: ‘Vai ser difícil, porque a resistência corporativa é grande e as pessoas vão resistir bastante às mudanças’.”

FHC, agosto 1996

Mais de 20 anos depois, estamos no mesmo ponto.

Organizando o capitalismo

“…acho que temos que organizar o capitalismo brasileiro, e o BNDES é o grande instrumento para essa organização.”

FHC – Diários da Presidência – Maio 1996

Em um blind test, juraria que era a Dilma dizendo isso.

Curioso notar que esse pensamento vem relatado como consequência de uma reunião com ninguém menos que Emílio Odebrecht, considerado por FHC como “muito competente em termos empresariais”, apesar “da firma Odebrecht ter ficada marcada pela corrupção na CPI dos Anões do Orçamento”.

E esse era FHC, o presidente mais lúcido que o Brasil já teve. Depois nos perguntamos porque o Brasil avança com essa lentidão exasperante.

A criatura de FHC

O ano é 1995, maio. FHC enfrenta, por onde quer que vá, protestos da CUT. Pequenos, mas bastante ruidosos. Os petroleiros estão em greve, e os protestos são contra as reformas.

FHC anota em suas memórias: “Isso é […] uma atitude que não é nem revanchista, é passadista, de gente que precisa de movimentação e crê que tem diante de si um inimigo, como se fosse o inimigo histórico. Essa coisa tão patética hoje em dia, até porque eu não sou Collor, não tem por que fazer esse tipo de agressão, e muito menos à Ruth, que tem uma atitude bastante aberta.”

FHC faz o diagnóstico correto: para o PT, ele era o inimigo. Mas, ingenuamente, acredita que, não sendo Collor, merece o respeito de Lula. Tanto é assim, que fez corpo mole nas eleições de 2002, pois seu candidato “in pectore” é Lula. Lula é o seu projeto político: depois de colocar a casa em ordem, entregaria o poder a um operário com mentalidade contemporânea, que seguiria, com mais legitimidade do que ele próprio, a trilha por ele iniciada, com o objetivo de situar o País como uma moderna democracia.

Foi passar a faixa, e ouviu de Lula pela primeira vez as palavras que marcariam dali em diante a relação entre os dois: “herança maldita”. Era a punhalada nas costas por parte de sua criatura. Ali ficava claro que o inimigo era sim ele. FHC e o PSDB eram a única alternativa real de poder. E, portanto, deviam ser destruídos.

Dilma foi uma criatura de Lula, e por isso nunca vamos perdoa-lo. Mas Lula é, de certa forma, uma criatura de FHC, fruto do idealismo (ingenuidade?) de FHC. Tendo entendido a natureza do escorpião, preferiu olhar para o outro lado, e ignorar as evidências que se acumulavam desde o início, como ficou claro no trecho acima. Hoje, FHC se diz decepcionado com Lula. Tarde demais. Se chegamos ao ponto que chegamos, FHC tem uma parcela significativa de culpa. Pois abriu mão do poder em nome de uma espécie de “quitação de dívida histórica” e, depois, abriu mão de seu papel de principal líder da oposição.

Separando o público do privado

Quer saber porque o Brasil é do jeito que é?

Estou lendo o 1o volume das memórias de FHC na presidência. Logo no início, ele reclama que a imprensa pegou no seu pé por conta de uma viagem de seu filho, Paulo Henrique, ao Uruguai, em avião oficial, quando ele mesmo estava em missão oficial no país. Tratava-se de um avião da segurança, que viajava “vazio”. Portanto, a “carona” de seu filho não havia custado um tostão adicional aos cofres públicos.

Não ocorre a FHC que trata-se, sim, de um privilégio inadimissível. Que o seu filho só viajou de graça porque o papai era presidente da república. Que qualquer outro brasileiro que quisesse viajar de graça em avião oficial, mesmo que esta viagem “não custasse nada aos cofres públicos”, não teria este direito.

FHC é o que de melhor produziu a elite política nacional. Mas mesmo ele não consegue separar o público do privado. Imagine o resto. O nosso subdesenvolvimento não é improvisado.