A Superliga e o STF

Essa história da Superliga me faz lembrar o Clube dos 13.

Em 1987, os 13 principais clubes do futebol brasileiro resolveram criar um campeonato próprio, a Copa União. A CBF, à época, organizou, como sempre, o seu próprio campeonato. Chamou a Copa União de “módulo verde” e o seu campeonato de “módulo amarelo”. Verde e amarelo, sacou?

Segundo as regras estabelecidas pela CBF, o campeão brasileiro deveria sair do enfrentamento entre os campeões dos dois módulos. O Flamengo, campeão da Copa União, recusou-se a entrar em campo para enfrentar o Sport, campeão do torneio da CBF. A CBF declarou o Sport como campeão brasileiro de 1987. A coisa foi parar (como tudo no Brasil) no STF, que em 2018 declarou definitivamente o Sport como o campeão brasileiro daquele ano.

Essa discussão toda pode parecer bizantina, mas teve efeito prático importante em outra polêmica fundamental: quem deveria levar definitivamente para casa a taça das bolinhas. Essa taça estava reservada para o primeiro pentacampeão brasileiro desde 1971. Caso o título de 1987 valesse, a taça deveria ter sido entregue ao Flamengo, que teria vencido seu quinto título brasileiro em 1992. No entanto, com o título de 1987 sub-júdice, o São Paulo ganhou o seu quinto título em 2007, reivindicando a taça. Apesar de o STF já ter pacificado a questão sobre quem foi o campeão brasileiro de 1987, esta disputa da taça das bolinhas ainda está sem decisão final. O STF acabará tendo que decidir sobre esta importante questão também.

Fico imaginando como a UEFA e os clubes europeu vão se virar sem ter um STF para decidir essas questões.

A face feia de uma boa administração

Os títulos do Flamengo estão sendo creditados à estupenda administração do clube. A mesma responsável pela tragédia que vitimou os garotos da base em seu CT.

Sim, eu sei que lembrar esse tipo de coisa em meio à festa do clube não é nada agradável. E eu não o faria se não insistissem nessa história de “o clube mais bem administrado do Brasil”. Um clube bem administrado não mata seus atletas de base. Ponto.

Ganhar títulos é só a faceta mais vistosa de uma boa administração. Mas está longe de ser a única.

Mais um time hegemônico

Leio e ouço algumas análises colocando o Flamengo como virtual campeão brasileiro em todos os próximos anos. Com o tamanho de sua torcida e a casa financeiramente arrumada, não vai ter pra ninguém.

Não consigo deixar de me lembrar das mesas redondas depois da Copa de 2014. A seleção da Alemanha era o resultado de um longo planejamento, que começara logo após ter perdido a Copa em casa em 2006. Em 2010 havia novamente sido eliminada na semifinal, mas isso fazia parte do planejamento, que havia sido feito para que a Alemanha atingisse o seu auge em 2014. Foi o que aconteceu, com os 7×1 e o título do torneio. As mesas redondas eram unânimes em apontar a Alemanha como a nova força hegemônica do futebol mundial. Tudo isso para cair na primeira fase da Copa de 2018.

O São Paulo foi tricampeão brasileiro nos anos de 2006, 2007 e 2008. E havia sido campeão da Libertadores e do Mundial em 2005. O papo era o mesmo: um time muito bem administrado, que seria força hegemônica dali em diante. O fato é que não ganhou mais nada desde 2008.

O Palmeiras da Parmalat foi outro time “hegemônico”. Ganhou os brasileiros de 1993 e 1994 e parecia que não ia ter pra mais ninguém. Teve.

O Flamengo montou um belo time e aparentemente está sendo bem administrado. Mas já vivi muito tempo para assistir a vários times “hegemônicos” que, mais cedo ou mais tarde, perdem o brilho e dão lugar a outro. O futebol brasileiro é como o país: muito instável, hoje está sendo bem administrado, amanhã estará sendo mal administrado. É da natureza do que acontece por essas bandas.

Os flamenguistas têm toda a razão em comemorar este ano de 2019, um ano perfeito. Mas não vamos tirar conclusões precipitadas. Foi um ano bom, sem dúvida. Mas não quer dizer nada sobre os anos que virão.

A pior injustiça é a lentidão da justiça

Uma justiça lenta é a pior forma de impunidade.

O desenvolvimento de um país passa pelo desenvolvimento de suas instituições. E talvez a instituição mais importante seja uma justiça que funcione.

O Brasil continuará sendo o país da impunidade e um país subdesenvolvido enquanto o sistema judiciário for essa piada de mal gosto.