Palavras de ordem vazias

As mulheres ganham menos do que os homens. Esse é um fato irrefutável, demonstrado pela estatística do IBGE.

Por que isso acontece? De acordo com o projeto de lei a ser enviado ao Congresso hoje, o culpado é a misoginia do empresário, que paga menos para a mulher por pura maldade. A solução, então, é agir com o rigor da lei, de modo que a misoginia “doa no bolso”, segundo a ministra Simone Tebet. De acordo com essa lógica, o empresário continua atuando fora da lei porque a punição é branda, o que o leva a fazer um cálculo de risco-retorno.

Talvez a ministra nunca tenha tocado uma empresa, então vamos explicar a ela como a coisa funciona na prática. Qualquer empresário tem como objetivo principal maximizar o seu lucro. Claro, há outros objetivos nobres, como gerar empregos e ajudar as pessoas, mas se não procurar maximizar o seu lucro, todos os outros objetivos que porventura existam não poderão ser cumpridos. Maximizar lucros é condição necessária para todo o resto.

Pois bem. Imagine que fosse possível, de maneira sistemática, pagar menos para as mulheres do que para os homens para a mesma função e experiência. Ora, é não menos que óbvio que qualquer empresário que busque maximizar seus lucros contrataria somente mulheres. Teria a mesma função sendo realizada, com uma folha de salários menor. A contratação de homens que ganham mais serviria apenas para exercitar uma espécie de misoginia doentia, às custas de seu próprio lucro. “Ah, mas não há mulheres suficientes para preencher todas as vagas, a contratação de homens é mandatória”. Sim, mas nada impediria que o empresário maximizador de lucros pagasse o mesmo salário baixo para os homens que paga para as mulheres. Se paga a mais para os homens, às custas de sua própria lucratividade, deve ser por algum motivo. A legislação parte do pressuposto de que é misoginia pura e simples.

Falta uma informação fundamental na reportagem: o número de processos por desigualdade salarial que resultaram em ganho de causa para a mulher. Ou seja, em que a empresa foi condenada a pagar uma multa. Dei uma googlada e não encontrei essa informação. Por que é importante? Ora, se o número for expressivo, isso significa que as empresas, de fato, estão abusando da legislação, e multas maiores poderiam inibir o seu mau comportamento. Mas, como desconfio de que o número de processos seja irrelevante, o aumento das multas serve apenas como palanque para que feministas de ocasião, como Simone Tebet, possam posar de “defensora das mulheres”. O resultado da nova legislação será inócuo.

A estatística do IBGE não mente. De fato, as mulheres, na média, ganham menos que os homens. No entanto, atribuir a uma suposta misoginia dos empresários o problema serve somente para inflamar a militância sem realmente resolver o problema. As mulheres merecem mais do que palavras de ordem vazias.

Shame on you!

Entrevista com a ministra Simone Tebet sobre um projeto de lei, a ser apresentado hoje, que endurece as penas por remuneração desigual entre homens e mulheres.

No final da entrevista, a ministra demonstra, inconscientemente, por que as mulheres, na média, ganham menos que os homens. Ao tentar justificar por que a remuneração igualitária teria impacto positivo sobre a atividade econômica, Tebet afirma que “a mulher não guarda, ela gasta o dinheiro com material escolar, supermercado e exames”.

A afirmação é absurda em si. Quer dizer então que, nas famílias em que a mulher não trabalha, ninguém faz supermercado, realiza exames e os filhos ficam sem material escolar? E mesmo nas famílias em que a mulher trabalha, esses gastos saem exclusivamente do salário da mulher?

Mas o pior não é nem o non sense da afirmação. A ministra reproduz o preconceito de gênero que procura combater. Por que, afinal, teria que ser a mulher a pagar o supermercado e o material escolar dos filhos? Essa associação demonstra que, mesmo para uma militante tão vocal sobre os direitos da mulher, fazer supermercado e cuidar dos filhos continuam sendo “tarefas da mulher”. Shame on you, Tebet!

A dura realidade das mulheres comuns no mercado de trabalho

A jornalista Natuza Nery coloca-se como exemplo de como a maternidade pode tornar as mulheres mais produtivas (pelo que entendi, porque ficam gratas pelo acolhimento da empresa em que trabalham e procuram compensar trabalhando ainda mais).

Natuza Nery é uma das principais jornalistas da principal empresa de comunicação do Brasil. Seu passe deve ser bem caro e seu salário deve lhe permitir contratar mais de uma babá. Poucas mulheres no Brasil realmente podem se comparar profissionalmente com Natuza Nery. Esse fato simples e facilmente verificável não a impede, no entanto, de se colocar como exemplo para todas as mulheres do Brasil, e de comparar a Globo com todas as empresas do Brasil.

Essa declaração de Natuza foi feita a respeito de uma frase do novo ministro das Minas e Energia, Adolfo Sachsida, que ousou afirmar que as mulheres ganham menos provavelmente porque engravidam, o que, obviamente, foi classificada como uma fala machista.

Tive oportunidade de escrever um post a respeito desse assunto, em que recupero alguns artigos acadêmicos que levantam a possibilidade de que mulheres ganhem menos do que homens com mesma idade porque a maternidade lhes exige dupla jornada, o que, na média, poderia atrasar ou até mesmo interromper suas carreiras. Podemos gastar rios de tinta e horas de TV falando sobre a injustiça dessa situação, mas essa é a situação, e há muito pouco o que a maioria das empresas pequenas e médias possa fazer a respeito.

Lacrar sendo uma jornalista superstar da Rede Globo, ainda mais quando quer passar a mensagem de que esse presidente não passa de um misógino, é fácil. Difícil mesmo é tratar um assunto desses com objetividade.