Insistindo no erro

Errar uma vez é humano, duas vezes é burrice. Esta nova greve dos metroviários em São Paulo é, portanto, prova de burrice. Com as linhas privatizadas funcionando normalmente, o caos gerado pela greve só reforça o caso pela privatização junto à população. Isso é tão óbvio que a pura e simples burrice parece ser a única explicação plausível para essa nova greve.

O prefeito de São Paulo e candidato à reeleição, Ricardo Nunes, agradece a munição contra o seu adversário, Guilherme Boulos, patrono natural da baderna.

Pimenta nos olhos dos outros

Depois desse artigo de Eugênio Bucci, as definições de “pimenta nos olhos dos outros é refresco” foram atualizadas. Destaquei abaixo os trechos mais importantes, mas o artigo todo merece ser lido.

Comecemos com a avaliação do mestre em relação à “justeza” da greve. Lembremos que Bucci está do outro lado da mesa. Então, a pauta dos grevistas, segundo sua visão, já foi, ou está sendo, amplamente atendida. Portanto, a greve não tem sentido. Bem, essa é a postura de 100% dos que estão do outro lado da mesa em qualquer greve. Os “estudantes” têm uma pauta de 23 reivindicações distribuídas em 5 eixos. Bucci abordou duas questões. E as outras 21??? Não, meu caro Bucci, do ponto de vista dos grevistas, a greve é mais do que justa. Não deixa de ser curioso que o defensor dos “direitos democráticos” não se coloque a favor de uma greve em que grande parte das reivindicações ainda não foi atendida.

Mas a coisa piora. Segundo Bucci, a truculência dos grevistas só serve à “extrema direita anti-democrática”, que seria contra a universidade pública e gratuita. Entendam bem: não é que essa esquerda seja truculenta e anti-democrática. De maneira alguma. É que, no caso, esses métodos típicos da esquerda truculenta e anti-democrática são um tiro no pé, pois dão razão aos que acham erradamente que a universidade é um antro da esquerda truculenta e anti-democrática. Entenderam?

Aliás, essa é a mesma crítica que temos ouvido à respeito da greve dos metroviários: não é que a população seja refém dos metroviários, é que a greve passou a impressão de que a população é refém dos metroviários e, portanto, foi um tiro no pé. Ou seja, procura-se separar o exercício da truculência, que é inerente a esses movimentos, do movimento em si, como se isso fosse possível.

É comovedor o malabarismo que Bucci faz entre a crítica à greve e ao direito que os alunos têm de fazer greve. Nada contra o direito, mas ESSA greve é injusta e irresponsável, capice? Aliás, Bucci vai na mesma linha que adotei em meu post de ontem: os alunos estariam “treinando” seus posicionamentos políticos na universidade, seria uma espécie de campo de testes para os líderes políticos de amanhã, em um ambiente controlado. Sem dúvida! Boulos está aí para não nos deixar mentir. Portanto, greves são “uma força” da universidade, não uma fraqueza. Mas não ESSA greve.

Não Bucci. A legitimidade de uma greve não é função do que você acha justo ou injusto. Ou bem nenhuma greve de alunos financiados pelos impostos dos desdentados é justa, ou qualquer greve é justa. O gênio foi tirado da garrafa por pessoas como você, que defendem que os alunos tenham uma “vivência política” na universidade, como se os partidos políticos não tivessem seus próprios interesses, desconectados dos interesses da universidade. Agora, resta fazer malabarismos em artigos de jornal.

Brincando de greve

Reportagem no site da Adusp (Associação dos Docentes da USP) nos dá detalhes da greve que não existem nas matérias dos grandes jornais. Para dar o devido crédito, cheguei nesse site através da menção em reportagem de ontem do Estadão.

Em primeiro lugar, ficamos sabendo que Eugênio Bucci (sim, ele mesmo) está na mesa de negociações pelo lado da reitoria. Muito legal ver o champion da democracia lidando com as consequências do tipo de pensamento que representa.

Em segundo lugar, delicioso ver que as negociações não passaram sequer das preliminares, a pauta que seria discutida. Pudera, irmão: “23 reivindicações em 5 eixos” é coisa pra dedéu. Aliás, ouviu a palavra “eixo”, já sabe que é coisa de planejamento estatal. O programa do PT está cheio de “eixos”, e o recém-nascido plano de segurança pública do Dino tem mais “eixo” do que medidas concretas. Bem, os representantes da reitoria, incluindo Bucci, não toparam a pauta.

Mas o melhor vem agora: surpreendentemente, uma das líderes do movimento, Mandi Coelho, é filiada ao PSTU! Quem diria! A moça tem 28 aninhos e é diretora do Centro Acadêmico da Letras. Sua página no Facebook tem uma ilustração de Lênin, que, como sabemos, implantou a democracia na União Soviética.

Por fim, foram 11 os “representantes” dos estudantes nessa reunião com a reitoria, mas apenas os nomes de Mandi Coelho e Allan Terada são citados. Este último está terminando Geografia, e cursou o colegial no Colégio Santa Cruz, um celeiro de lideranças. Terada ameaçou “subir o tom” se as negociações não caminhassem, o que quer que isso signifique.

Sinceramente, essa greve me faz lembrar aquelas atividades de “ONU” no colégio, em que alunos assumem o papel de diplomatas para entender como a coisa funciona. Nessas dinâmicas nada está realmente em jogo, os atos dos “diplomatas-mirins” não têm maiores consequências para si mesmos ou para os outros. Nessa greve dos “estudantes”, também não há risco para os estudantes ou para a comunidade acadêmica. No final, ninguém será punido, ninguém repetirá de ano, todo mundo vai sair com seu diploma e os professores vão continuar recebendo os seus salários. Mas os “estudantes” terão vivido a experiência de uma greve, em que “negociam” com autoridades que entram no jogo para que os “estudantes” tenham uma experiência imersiva completa. Com a atividade lúdica encerrada, todos voltarão para a casa de seus pais, onde têm cama, comida e roupa lavada. Afinal, a vanguarda do proletariado merece.

A surpresa do reitor

Entrevista com o reitor da USP, onde alguns alunos e professores estão em greve. Não pude deixar escapar gostosas gargalhadas com a surpresa do reitor, ao constatar que os mesmos estudantes que “defenderam a democracia” ao se colocarem contra a reeleição de Bolsonaro, agora atuam na direção contrária, impedindo seus colegas, de maneira truculenta, de assistirem às aulas.

Não sei exatamente em que planeta vive o reitor, ao pensar que o PT e seus satélites têm alguma credencial democrática. O modus operandi dessa turma é esse aí: não tem debate, tem porrada. Só tem debate (como no caso da relação entre Planalto e Congresso) quando o outro lado tem um porrete maior. Aí, entra em cena o vitimismo: “ain, estão querendo impor na base da força”. Caso contrário, é isso que estamos vendo na USP: “estudantes” ligados a esses partidos políticos botando pra quebrar.

E ai de quem quiser “argumentar” ou “dialogar”. Fascista é o adjetivo mais elegante. A prova de que o reitor vive no mundo de Nárnia é a sua sugestão de que os alunos contra a greve compareçam às assembleias para votar. Como se essas “assembleias” fossem espaços democráticos. A condução dessas votações faria Arthur Lira parecer a Madre Teresa.

A parceria que os social-democratas (entre os quais o reitor) fez com os partidos de esquerda para vencer Bolsonaro não autoriza a ilusão de que todos estão no mesmo barco democrático. A democracia não venceu com Lula. Quem venceu foi essa mesma esquerda truculenta infensa ao diálogo, e que tanta surpresa causa ao reitor.

Quem é o patrão?

Greve é um direito inalienável de qualquer trabalhador. Mas, antes de tudo, trata-se de um fenômeno econômico. E, como qualquer fenômeno econômico, obedece a certas leis. O que nos permite, com algum grau de precisão, prever o seu resultado.

Qualquer greve envolve risco para ambas as partes do conflito: os patrões podem perder produção e faturamento, os empregados podem perder salário e até o emprego. A deflagração de uma greve ocorre quando os trabalhadores avaliam que o patrão tem mais a perder do que eles próprios.

O risco do patrão é tanto maior quanto mais difícil for a reposição desses trabalhadores em greve. Greves no setor metalúrgico, por exemplo, são uma dor de cabeça para os patrões, pois é difícil repor funcionários treinados durante anos em suas funções. Além disso, custa muito caro demitir um funcionário desses. Por isso, quanto mais especializado for o empregado, maior o risco do patrão durante uma greve. Dizemos, neste caso, que a barreira de entrada nesse mercado de trabalho é muito alta.

Com todo respeito aos motoboys, em uma atividade econômica em que qualquer um pode atuar alugando uma bicicleta, a barreira de entrada é muito baixa. O que significa que o risco da greve é muito maior para o empregado do que para o patrão. (Aqui estou usando a terminologia empregado-patrão em uma relação muito mais difusa do que a relação trabalhista clássica. Mas serve para o raciocínio). Em outras palavras: quanto tempo os motoboys podem ficar sem receber? Qual a chance de que outros motoboys se aproveitem da paralisação para entrar no mercado?

Uma greve explicita um conflito distributivo: o capital humano disputa com o capitalista, dono do capital físico, a renda gerada pela produção. Este conflito tem três possíveis resoluções: i) o capitalista mantém a sua renda, ii) o capitalista cede parte de sua renda para os empregados ou iii) a renda aumenta por meio do aumento do preço do produto. Neste caso, o consumidor é que transfere a sua renda para os empregados. A resolução desse conflito distributivo não depende da boa ou da má vontade dos agentes envolvidos. A realidade econômica se impõe. Se o patrão considerar que a renda que está auferindo é insuficiente para remunerar o risco do seu capital, ele fecha o negócio. Se os empregados considerarem que a renda que estão recebendo é insuficiente e conseguirem se colocar em outras empresas, o negócio fecha. Se o consumidor deixar de comprar o produto pelo novo preço, é o fim do negócio. Qualquer empreendimento de sucesso é o resultado de um tênue equilíbrio entre esses três agentes.

No caso dos motoboys, estes claramente estão de olho na renda do patrão. No caso, os aplicativos. A julgar pelos resultados da única companhia de capital aberto do ramo, o Uber, o capitalista ainda está fazendo prejuízo com o negócio. De modo que a margem para aumentar a renda dos empregados parece baixa. Poderia se tentar o aumento do preço do produto. Resta saber se o consumidor concorda com isso.

Aliás, por falar em consumidor, há muitos que se condoem das condições de trabalho dos motoboys e concordam com suas reivindicações. Neste caso, é fácil resolver: basta abrir mão individualmente de sua renda e pagar uma gorda caixinha para os motoboys que entregam os produtos em sua casa. Aliás, nessa relação, o verdadeiro patrão é o consumidor. O aplicativo é apenas uma tecnologia que une patrões e empregados.

Barbeiragem administrativa

Nos idos de 2013, na era da Petrobras grande de Dilma Rousseff e Graça Foster, a empresa adquiriu da Vale, por R$234 milhões, uma fábrica de fertilizantes em Araucária-PR. O negócio foi tão bom, que a empresa tentou vender a fábrica e não conseguiu encontrar comprador. Decidiu então “hiberná-la” (eufemismo para fechá-la), demitindo seus quase 400 empregados.

Os petroleiros, então, decidiram iniciar greve em “solidariedade”. Nota: além de todos os direitos trabalhistas, cada trabalhador demitido terá um bônus entre 50 e 100 mil, além de plano médico por dois anos.

O Petrolão foi pinto perto dos prejuízos causados pela barbeiragem da administração petista.

Greve assim, até eu!

Bolsonaro apoiou aumento para os policiais civis do DF. Nota: este aumento será pago por um remanejamento de recursos dentro de um Fundo específico, que serve para pagar as despesas do DF. Se este Fundo deveria existir ou não, já é outra discussão. Mas é de Lei, e é bancado por todos os contribuintes brasileiros. Fato é que este aumento específico será pago sem onerar o Orçamento Federal.

Bem, parece que este aumento serviu de estopim para um movimento reivindicatório de outras categorias do funcionalismo público federal. Como se precisassem de motivos ou desculpas para reivindicar aumentos salariais. Se não fosse isso, seria outra coisa qualquer.

Ameaçam com greve. Como se tivesse cabimento greve em serviço público. Quando funcionários da iniciativa privada fazem greve, estão lutando para abocanhar uma fatia maior do lucro do patrão. Para tanto, se sujeitam a ter corte de salários e até serem demitidos. Funcionários públicos, por outro lado, estão brigando para arrancar um naco maior dos impostos, que não são usados para engordar lucros, mas para manter serviços para a população que paga os impostos. Além disso, não correm riscos: não deixam de receber seus salários e muito menos podem ser demitidos. Greve assim, até eu.

Até compreendo que os servidores públicos possam estar passando dificuldades com o miserê que recebem. A alternativa a tomar como refém a sociedade em greves imorais é sair do seu atual emprego e procurar algo melhor na iniciativa privada. Boa sorte!

Idade da Pedra

Bancários em greve.

Dentro da agência, clientes fazem operações nos caixas eletrônicos.

Em casa, clientes fazem operações nos seus computadores.

Na rua, clientes fazem operações nos seus celulares.

O sindicato dos bancários ainda vive no século XX. Por isso são contra a reforma da Previdência.

Greve dos professores federais

O orçamento do MEC para as universidades federais é de R$33 bilhões, já descontando o contingenciamento.

Isso dá R$90 milhões por dia, considerando sábados, domingos e feriados.

Com R$90 milhões, seria possível construir 2.000 casas populares.

Não, os professores e estudantes que não trabalharão amanhã não irão devolver esse dinheiro para a sociedade que os financia.

Greve incompreensível

Eu realmente não consigo entender a lógica por trás de uma “greve” de motoristas de Uber.

Os aplicativos de transporte individual são das coisas que mais se aproximam do que chamamos de “livre mercado”. O Uber precisa lidar com duas forças competitivas: a concorrência com outros meios de transporte disputando seus passageiros e a concorrência com outros tipos de emprego disputando os seus motoristas. A empresa precisa cobrar o máximo de seus passageiros mas não a ponto de perdê-los para outros meios de transporte, e precisa pagar o mínimo para os seus motoristas, mas não a ponto de perdê-los para outros tipos de emprego.

Nesse contexto, a melhor greve dos motoristas é simplesmente abandonar o sistema. Mas, para isso, é preciso que esses motoristas tenham um emprego que remunere melhor o seu tempo. Ao fazer uma greve mas não abandonar o sistema, a mensagem que os motoristas estão passando para a empresa é que eles não estão contentes com a sua remuneração, mas não conseguem coisa melhor em outro lugar. A empresa agradece.

A remuneração dos motoristas somente vai melhorar quando a empresa começar a sentir dificuldade em atrair novos motoristas para o sistema, aumentando os preços dinâmicos e a insatisfação dos usuários. No Brasil, com 13 milhões de desempregados, parece que estamos muito, mas muito, distantes desse ponto. O que faz uma greve de motoristas ainda mais sem sentido.