Mulheres e a Olimpíada de Matemática

Questão de matemática: em uma população de 210 milhões de habitantes, qual a chance de se sortear aleatoriamente 6 pessoas do sexo masculino? A resposta é aproximadamente 1/2^6 ou 1/64. Quer dizer, de cada 64 tentativas, você vai conseguir sortear 6 homens uma vez. Não é lá uma probabilidade muito alta.

Mas isso é sorteio. No caso da Olimpíada de Matemática as pessoas não foram sorteadas. Elas conquistaram o seu posto no time brasileiro através de provas aplicadas nacionalmente. E somente homens conseguiram.

Esse não é somente um fenômeno brasileiro. A olimpíada deste ano, na Rússia, contou com 616 competidores de 138 países. Destes, apenas 56 eram mulheres. Ou 9,1% da amostra. 9,1% sobre 6 não dá um, o que demonstra que nossa amostragem não está fora da norma global.

Como não há como discriminar mulheres através de uma prova objetiva, restam duas explicações para este claro desvio: 1) maior facilidade natural dos homens para lidar com números e pensamento lógico ou 2) uma pressão social que, desde a mais tenra idade, convence as meninas de que a matemática é coisa de meninos.

A escolha entre uma ou outra explicação parece mais briga de torcida do que estudo científico, cada lado aferrado aos seus dogmas. Pode ser uma mistura das duas coisas. Se observarmos a evolução histórica da participação feminina nas Olímpiadas de Matemática (veja o gráfico abaixo), veremos um avanço ao longo dos anos. (Nos primeiros anos o número de participantes era muito pequeno, o que fazia o percentual feminino mudar abruptamente de um ano para o outro).

Este avanço pode estar associado a um maior incentivo à participação feminina e a uma educação, digamos, mais igualitária ao longo do tempo. Mas será que um dia chegaremos a 50%? Convenhamos que 10% de participação ainda é um nível muito baixo. E não só isso: se observarmos com cuidado o gráfico, vamos notar que a participação feminina está parada neste nível de 10% desde mais ou menos meados da década passada. Será que falta mais incentivo? Ou será que bateu em um teto natural? Só o tempo dirá.

Um outro indicador que poderíamos usar para identificar algum viés social é a comparação entre países onde teoricamente há menos “vieses sociais” com países onde a pressão social seria, digamos, maior. Separei, então, os países em grupos mais ou menos homogêneos. Este é sempre um exercício arriscado, pois os países podem variar bastante dentro desses grupos, mas resolvi tomar o risco. O resultado foi surpreendente.

Países considerados desenvolvidos (basicamente Europa Ocidental, Austrália, Nova Zelândia, Canadá e EUA) tiveram uma participação feminina de 9,0%, absolutamente em linha com a média. A surpresa veio da África sub-saariana, um grupo de onde não se esperaria um viés pró-feminino: ainda que a amostra seja pequena, observamos uma participação feminina de 17,9%! E os países muçulmanos tiveram uma participação feminina de 8,8%, basicamente em linha com a média. A América Latina machista, vejam só, teve uma participação feminina de 10,0%, enquanto os países da Ásia não-muçulmana tiveram uma razão de 6,4%. Uma surpresa para mim foi a participação feminina da Europa Oriental (países da ex-cortina de ferro), onde, segundo a propaganda comunista, as mulheres seriam incentivadas a terem um papel de destaque nas ciências: uma participação de apenas 5,8%. Mas a cereja do bolo veio dos países nórdicos. Destaquei Suécia, Noruega, Finlândia e Dinamarca: dos 24 participantes, apenas uma mísera representante do sexo feminino, uma participação de pífios 4,2%.

Enfim, se a crescente participação feminina ao longo dos anos na Olímpiada de Matemática pode se dever a um maior incentivo, a distribuição entre os países não parece corroborar esta ideia. Trata-se de uma questão em aberto. Como eu disse, acho que é uma mistura das duas coisas, mas tendo a achar que fatores naturais têm mais influência.

Por fim, uma outra questão de matemática: qual a chance, em uma população de 210 milhões de habitantes, de se sortear 6 pessoas, das quais 3 são de Fortaleza? Pois é, três dos 6 componentes da equipe brasileira vieram da capital cearense. Acho que seria interessante investigar o que tem na água da cidade.PS.: Parabéns aos rapazes que representaram as cores brasileiras na Olimpíada de Matemática!

Qual o seu gênero?

Baixei um aplicativo que promete me indicar filmes com alta probabilidade de me agradar. Chama-se Alfred.

Estou fazendo o cadastro, e me deparo com a pergunta sobre gênero. As possibilidades estão aí embaixo.

Foi a primeira vez que me deparei com uma lista completa de gêneros. Quer dizer, completa não, porque tem ainda a opção “outro”.

Não consegui identificar a diferença entre “Trans Homem” e “Homem Transexual”, ou entre “Gênero Variante” e “Gênero Fluido”. Mas certamente deve haver uma definição muito clara, que não deixa margem a dúvidas na hora de cravar a alternativa. Ou deixa, e isso faz parte do jogo.

Também não consegui alcançar o que viriam a significar “Neutrois”, “Genderqueer” ou “Gênero Não-Conformista”. Mas é que eu sou um puta ignorante nessas coisas, reconheço.

Qual o objetivo de uma lista dessas? A pergunta sobre gênero em um aplicativo desse tipo só pode ter o objetivo de tentar adequar as sugestões de filme com o gênero. Então, é necessário que haja alguma significância estatística: x% dos homens gostam de filmes assim e assim, y% das mulheres gostam de filmes assim e assim, etc. Pergunto: qual a chance de gêneros como “duplo-espírito” ou “neutrois” ter alguma relevância estatística?

Então, o objetivo só pode ser “lacrar”. Colocar como alternativa “outro” (o que já se tornou comum) já não é suficiente. Precisa ter uma lista de tudo, de modo a mostrar que o aplicativo está “antenado” com a modernidade.

Eu, como sou um brucutu pré-diluviano, desinstalei o aplicativo.

A suruba mal explicada

Silvio Santos está no ar desde 1964. 54 anos, portanto.

Chacrinha manteve um programa de 1956 a 1988, quando morreu. 32 anos.

Faustão mantém o Domingão desde 1989. 29 anos.

Ana Maria Braga mantém seu programa matinal desse 1999. 19 anos.

Jô Soares manteve seu talk show de 2000 a 2016. 16 anos. E, detalhe: foi ele que quis se aposentar.

Fátima Bernardes está há 6 anos no ar e o programa já cansou. Talvez porque falte didática para explicar porque poliamor não é suruba.