A nova política de preços da Petrobrás

Tive oportunidade de ouvir um trecho da entrevista que o presidente da Petrobrás, Jean Paul Prates, concedeu à CNN hoje à tarde. O tema, como não poderia deixar de ser, era a nova política de preços da empresa.

Antes de comentar, deixe-me lembrar uma coisa básica: o Brasil não é autossuficiente em derivados de petróleo. Portanto, precisa importar para abastecer o mercado doméstico. Se praticar preços dos derivados acima da paridade internacional, estará abrindo espaço para importadores privados ganharem mercado interno, pois estes poderiam praticar preços mais baixos. Se praticar preços dos derivados abaixo da paridade internacional, estará gerando prejuízos para os seus acionistas, pois a diferença será paga com o caixa da empresa. Até aqui, matemática.

Vejamos o que disse Jean Paul Prates. Comecemos pelas coisas positivas. Prates afirmou que países que praticaram preços completamente fora da realidade, como Venezuela e Bolívia, não obtiveram bons resultados. Também disse que, se houver um aumento significativo dos preços no mercado internacional, a Petrobrás não será capaz de segurar a barra sozinha, precisando da ajuda de um Fundo de Estabilização (o que quer que isso signifique). São declarações corretas em si, mas que definem apenas o que a Petrobrás NÃO VAI fazer. A coisa fica complicada quando tentamos entender o que a empresa VAI fazer.

– Presidente, se não é PPI (preço de paridade internacional), o que é?

– Será um modelo dinâmico (programação linear) considerando variáveis geográficas e custos de produção, e também o preço internacional.

O Chat GPT ou o Rolando Lero não responderiam pior. Não se tira nada daí, o que nos permite dizer que não há realmente uma regra. O preço será o que der na telha da diretoria da empresa.

O presidente da Petrobrás bateu várias vezes na tecla de que o PPI era um mito, um preço teórico que nunca foi realmente seguido. Lembra um pouco as críticas aos modelos econômicos, que nunca refletem exatamente a realidade. Claro! A realidade é dinâmica, e nenhum modelo tem a pretensão de replicá-la com exatidão. Mas os modelos nos permitem pensar e racionalizar a realidade, dar um norte. O PPI é isso, os acionistas da Petrobrás sabem mais ou menos o que esperar das finanças da empresa quando olham o preço do petróleo. Agora, não mais. O preço considerará outras variáveis, em um modelo opaco e sem transparência.

A Petrobrás, agora, está alinhada ao governo do PT: não vai ser um desastre completo, mas também não vai para as cabeças. Ficará ali, em uma posição medíocre, uma sombra do que poderia ter sido. Assim como o Brasil.

PS.: Marina Silva não curtiu.

Ainda os preços dos combustíveis

Já tive a oportunidade de escrever um longo artigo sobre esse “fundo de estabilização”. Aqui vai só mais um breve comentário.

O comentário é o seguinte: qualquer truque usado para diminuir os preços dos combustíveis, receba o nome que receber (fundo de estabilização, subsídios, manipulação dos preços por parte da Petrobras) significa uso de recursos públicos que, de outra forma, poderiam estar sendo usados para outras finalidades.

Por exemplo, o projeto de lei prevê o uso de recursos do pré-sal para o fundo de estabilização. Lembra que o pré-sal foi apresentado aos brasileiros como um passaporte para o futuro, com seus recursos sendo usados para levar a nossa educação a outro nível? Pois é, agora vai servir para tornar mais barato o combustível usado pela classe média. Estaremos literalmente queimando o nosso futuro.

Alguns defendem essa inversão de valores com base em um suposto efeito inflacionário do aumento dos preços dos fretes, o que prejudicaria os mais pobres. Os “mais pobres”, como sempre, são usados como escudo para defender os interesses dos “menos pobres”.

Bem, em primeiro lugar, está longe de ser certo que preços menores ou maiores de fretes chegam ao preço final das mercadorias. Há várias empresas no meio, que podem absorver esses custos em seus balanços, a depender da força da demanda por seus produtos. Mas, e principalmente, se for para aliviar a barra dos mais pobres, seria muito mais efetivo gastar esse dinheiro diretamente com eles, subsidiando comida e gás de cozinha, ou aumentando o Bolsa Família, algo muito mais barato do que manter um certo nível de preços para os combustíveis consumidos por todo o país.

Na verdade, já temos um fundo informal de estabilização. No momento em que o governo Bolsonaro decidiu cortar o PIS/COFINS dos combustíveis, o dinheiro não arrecadado, e que poderia estar sendo usado para outros fins, está servindo para manter mais baixos os preços. Ao decidir manter o corte do imposto “por enquanto”, o governo Lula, na prática, decidiu manter o fundo de estabilização informal. Neste caso, os dois governos se dão as mãos no tipo de uso que fazem do orçamento público.

Ilusão de controle

Serão mais dois meses de Isenção de impostos federais para os combustíveis. Assim, o novo presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, terá tempo de assumir e implantar uma “nova política de preços”, eufemismo para canetar para baixo os preços praticados pela empresa em suas refinarias.

Prates, no entanto, é um técnico, muito especialista na área. Ele conta com a ”sazonalidade” do preço do petróleo no mercado internacional, que, como “todos já conhecem”, cai com a aproximação do fim do inverno no hemisfério norte.

Fiquei confuso: afinal, pra que uma “nova política de preços” se o preço do petróleo “vai cair”? A “velha política de preços” é que dependia do preço do petróleo no mercado internacional. Esperava-se que a “nova política” não dependesse desse tipo de ”sazonalidade”.

Aliás, vejamos se o técnico Prates sabe do que está falando. No gráfico abaixo, podemos observar o comportamento do preço do petróleo nos últimos 5 anos. Os círculos vermelhos indicam os 3 primeiros meses de cada ano, o período em que Prates afirma que os preços do petróleo sempre caem, dado o “fim do inverno no hemisfério norte”.

Surpreendentemente, essa sazonalidade “que todos conhecem”, só aconteceu em 2020, por causa da pandemia, não tendo relação com as estações do ano. Dos outros 4 anos, em um os preços andaram de lado e nos outros 3 os preços subiram nesse período, sendo que, em 2022, explodiram por causa da guerra na Ucrânia. Mas, como Lula é um cara de sorte, pode ser que a tal “sazonalidade” dê as caras esse ano, dando uma mãozinha para o governo.

Se Prates estivesse correto, seria muito fácil ficar bilionário. Bastaria, no fim de cada ano, vender contratos futuros de petróleo como se não houvesse amanhã. Depois de passado o inverno no hemisfério norte, recompraríamos os contratos com um lucro fabuloso, e sem risco. Como não pensamos nisso antes?

O que é estupefaciente, mas não surpreendente, é a ilusão de controle que esse governo tem. Eles se acham os ases da pilotagem, levando o carro da economia na ponta dos dedos em uma estrada sinuosa e escorregadia. Notem como a decisão sobre impostos e política de preços são tomadas com precisão de meses, pois “sabemos como os preços do petróleo se comportam”.

É muito óbvio que uma política de preços que depende da necessidade arrecadatória do governo e de uma suposta sazonalidade dos preços do petróleo não confere segurança alguma ao investidor. Mas esse não passa de um rapinador dos recursos nacionais, como afirmou o presidente em seu discurso inaugural. Então, que se limite a continuar fornecendo o seu capital para a construção da grande Petrobras, e não reclame.

Os planos estão na mesa

Jean Paul Prates deve ser o ministro das Minas e Energia em um futuro governo do PT. Para que ninguém reclame de que não foi avisado, ele deixa muito claras suas ideias. Que, de resto, são as velhas ideias do PT.

Segundo Jean Paul, a existência de estatais é imprescindível para sanar “falhas de mercado”. Por exemplo, não fosse a Petrobras, o Brasil não teria explorado petróleo em águas profundas. Ele “esquece”, obviamente, que os EUA tornaram-se o maior produtor de petróleo do mundo explorando o xisto sem que fosse necessária a presença de qualquer estatal. Também convenientemente esquece que nossa produção de petróleo está estagnada em cerca de 2 milhões de barris/dia faz anos. No início da década passada, com o pré-sal, a empresa previa uma produção de 4 milhões de barris/dia até 2020. Jean Paul cita também o gasoduto Bolívia-Brasil como uma obra que somente uma estatal poderia fazer. Sério?

Em 2013, uma outra “especialista” em setor elétrico resolveu mitigar “falhas de mercado” para baixar o preço da eletricidade. Não vou aqui entrar em detalhes técnicos, mas a MP 579, baixada pelo governo Dilma Rousseff, impôs perdas bilionárias às empresas do setor. Quer dizer, como se tratava de uma adesão voluntária, e as empresas privadas e estaduais não aderiram ao novo modelo proposto pela gênia da lâmpada do setor elétrico, a MP impôs perdas a apenas uma empresa, adivinha qual. Dica: termina com “bras”.

Resumo da ópera: a Eletrobras carregou sozinha o piano da redução das tarifas, e essa dívida bilionária está tendo que ser saudada através… do aumento do preço das tarifas. Realmente, estatais são muito úteis para fazer esse tipo de barbeiragem.

O que me deixa mais espantado é que o jornalista simplesmente “esquece” de perguntar ao ilustre deputado sobre este período. Parece que estamos diante de uma página em branco, que aceita qualquer desenho. É como se o governo Dilma, que foi um desastre para o setor elétrico, simplesmente não tivesse existido, e o PT tivesse carta branca para cometer os mesmos erros. Como disse o senador Prates, “o PT está comunicando desde já suas ideias”, para que ninguém se sinta enganado. Continua acreditando no “Lula pragmático” quem quer.