Fim de governo melancólico

O MTST bloqueava avenidas para chamar a atenção da sociedade para os “problemas sociais”. Eram, com razão, chamados de barderneiros, impedindo o direito de ir e vir de cidadãos que não tinham nada a ver com aquilo.

Obviamente, os bloqueios de estradas por parte de caminhoneiros devem ser igualmente condenados. Afinal, os fins não justificam os meios, ou a causa não justifica a baderna. Os cidadãos presos nas estradas não têm nada a ver com aquilo.

É só óbvio que o silêncio constrangedor de Bolsonaro, fechado em copas no Palácio, dá margem a esse tipo de manifestação. Fim de governo melancólico.

Estou mais tranquilo agora

Os movimentos pró-democracia estão preocupados com o 7 de setembro. A tal ponto que abriram diálogo com os militares, para garantir que os arroubos autoritários não passem de ameaça.

Estou mais tranquilo agora. Os guardiões da nossa democracia não dormem, estão ”em vigília”. Eu realmente temia que o povo das manifestações do 7 de setembro, insuflado por Bolsonaro, Carla Zambelli e Carluxo, pegasse em armas e, com o apoio das nossas Forças Armadas, tomasse de assalto o Congresso e o Supremo, instaurando uma ditadura sangrenta e violenta.

Mais tranquilo ainda fiquei, sabendo que movimentos sociais pacíficos, como o MTST, estão prontos a cerrar fileiras ao lado dos verdadeiros democratas. No dia 10, o MTST e outros movimentos sociais e sindicatos democratas estarão nas ruas defendendo a nossa democracia. Segundo a reportagem, “também” estarão apoiando a candidatura Lula. Mas isso é algo secundário. O que importa, de fato, é saber que a sociedade civil, representada pelo MTST, continua firmemente ao lado da democracia contra os arroubos autoritários do bolsonarismo.

Na vida tudo passa. Esse grave momento de ameaça às nossas instituições ficará para trás, graças à vigília dos democratas. Então, quando voltarmos à nossa normalidade democrática, o governo poderá voltar a comprar votos no Congresso, saquear nossas estatais e apoiar movimentos sociais que, democraticamente, queimam pneus na Marginal Tietê e invadem propriedades privadas. Seremos, novamente, uma democracia plena, orgulho dos brasileiros.

Ligue os pontos

Três notícias hoje no jornal:

1. PT e PSOL se pintam para a guerra contra a proposta do prefeito de São Paulo de reforma da previdência dos servidores municipais. Hoje o déficit do sistema é de R$ 6 bilhões por ano.

2. Membros do MTST ocupam a B3 em protesto contra a fome.

3. A prefeitura diminui de 1000 para 750 as marmitas diárias distribuídas no programa Rede Cozinha Cidadã.

Ligue os pontos.

Distribuindo a miséria

Quantos imóveis desocupados existem no centro de São Paulo? 1.000? 2.000? 10.000?

Quantas famílias moram em condições “indignas”? (para usar o jargão, ainda que careça de precisão: o que faz uma moradia ser digna?). Certamente muito, mas muito mais famílias do que os imóveis desocupados e passíveis de invasão.

Então, fica a pergunta: por que esses que invadiram têm mais direito a um apartamento no centro da cidade, e não outros que moram nas inúmeras favelas ou na periferia profunda da cidade? Porque chegaram primeiro? Porque fazem parte de um “movimento” e “lutaram” pelo seu direito? O que aconteceria se todos os necessitados “lutassem” pelos seus direitos dessa maneira, ao mesmo tempo? Suspeito que o resultado não seria bonito de se ver.

Não existe solução fora da lei e da ordem. A lei é o que protege o mais fraco do mais forte, e permite que a civilização exista. Fora disso, é a lei da selva. E na lei da selva, o mais forte fisicamente vence. Ou você tem dúvida de quem conquistaria seus apartamentos se todos “lutassem” ao mesmo tempo?

Além disso, vimos como, na prática, o mais forte vence: “coordenadores” usam práticas de milicianos para achacar os pobres coitados. Fora da lei, não há salvação. Para ninguém.

E qual a solução, então? Não existe solução fácil. Todas já foram tentadas e redundaram em fracasso. O último exemplo vem da Venezuela: anos e anos de políticas populistas, que prometiam vida “digna” para todos, sem construir as bases para isso.

E quais são as bases? Em primeiríssimo lugar, o respeito à lei e à propriedade, sem o qual não há condições para o investimento produtivo. Quem vai colocar seu dinheiro e seus talentos para produzir se corre o risco de ver o fruto do seu trabalho ser “conquistado” por “movimentos sociais” ou ser confiscado pelo Estado?

É preciso ficar claro, de uma vez por todas: não existe criação de riqueza sem investimento produtivo, e não existe investimento produtivo sem proteção à propriedade. E, se não existe criação de riqueza, a única coisa que a “justiça social” conseguirá distribuir será a miséria.

Atalhos que não funcionam

O MTST, que mais uma vez atazanou os paulistanos hoje, é muito fácil de entender.

Há um grupo de bem-nascidos que chegaram à conclusão de que essa estória de democracia representativa é coisa de burguês. O que realmente vai mudar a vida do pobre é a revolução do proletariado. E eles são a vanguarda dessa revolução.

Pois bem, falta o povo. Como cooptá-lo? Aí vem a grande sacada: a bandeira é a moradia, e o modus operandi é a invasão. Basta, como bastou, convencer alguns incautos de que eles têm o “direito” à moradia (como, aliás, já tive oportunidade de ouvir em entrevistas com esses pobres coitados). Assim mesmo, o direito, que passa por cima de todos os outros direitos.

A dinâmica, portanto, é esta: invade-se e, com governantes as mais das vezes covardes ou coniventes, obtém-se aquele terreno, que é distribuído aos que mais participam das manifestações ligadas ao movimento. Assim, temos um ganha-ganha: o movimento obtém uma massa de manobra para suas manifestações, e os manifestantes obtém moradia. Claro, quem perde é a sociedade, em vários sentidos: no seu direito de propriedade, no seu direito de ir e vir.

Ultimamente, a tática atingiu requintes de crueldade: com o programa Minha Casa Minha Vida – Entidades, os manifestantes não precisam mais invadir terrenos. Nã-nã-não. Agora, o governo patrocina a baderna. E os manifestantes furam a fila do MCMV. Sim, porque os imóveis do MCMV-Entidades poderiam ser distribuídos para pessoas igualmente necessitadas, mas que simplesmente não participam de manifestações. O critério para receber uma casa passa a ser “fazer parte da revolução”, sem precisar esperar em uma fila. Afinal, fazer fila é coisa de trabalhador que não tem tempo para fazer a revolução.

O problema da moradia é muito grave no Brasil. Assim como o problema da saúde, da educação, da segurança, e uma longa lista de etcéteras. A única solução permanente para todos esses problemas é o aumento da renda per capita do país, que só se alcança com aumento da produtividade do capital e do trabalho. Enquanto pessoas forem capazes de fazer apenas serviços básicos por falta de formação, o seu destino é não ter acesso aos bens reservados àqueles que são mais produtivos. Não há milagre. Qualquer outra solução é simplesmente não sustentável. Todos os países que tentaram um atalho se deram mal. Muito mal. O último e trágico exemplo é a Venezuela.

Assim, por mais que corte o coração a situação dessas pessoas, não é desrespeitando o Estado de Direito que se vai resolver o problema. Aliás, pelo contrário: em um país onde a lei não vale para todos, os mais prejudicados são sempre os mais pobres.