De graça, se assim lhe parece – 2

Ontem mesmo escrevi um post sobre como somos o país dos trouxas que se acham espertos, porque pensamos que não pagamos por serviços que têm o seu preço oculto.

O STJ agregou mais um serviço que terá seu preço embutido no produto final, e os trouxas pensarão que é de graça: a compra de ingressos on line.

Comprar o ingresso online é uma conveniência: ao invés de precisar se deslocar para algum lugar, pode-se comprar o ingresso no conforto de casa. Quem não quiser pagar a taxa de conveniência, pode comprar o ingresso pessoalmente, precisando se deslocar e enfrentar filas.

Manter uma estrutura de venda online tem o seu custo, nada é de graça. Alguém tem que pagar por isso, no caso, aquele que se beneficia da conveniência, o comprador do ingresso. Ou o STJ acha que toda essa estrutura é um “direito da sociedade” caído do céu? E pensar que ainda pagamos por esse “serviço” prestado pelo STJ, custo este embutido nos preços de todas coisas que nós, brasileiros trouxas, compramos.

Ao proibir a cobrança de “taxa de conveniência” o STJ forçará que a taxa de conveniência seja embutida nos preços dos ingressos. Os trouxas pensarão que o serviço online é “de graça” e tudo ficará como dantes no quartel de abrantes.

É de graça se assim lhe parece

Raquel Balarin escreve uma excelente coluna hoje no Valor, da qual destaco o trecho abaixo.

Ontem, o Valor publicou reportagem mostrando o conflito de interesse que existe no modelo de negócios da XP, onde o assessor de investimentos recebe rebate dos produtos que vende. O mesmíssimo conflito que existe nos bancos, modelo que a XP diz que veio para superar.

Balarin mostra que esse modelo tem sua origem no fato de que o investidor não quer pagar pela assessoria. Acredita que a XP lhe oferece serviços gratuitamente. A jornalista estende o conceito para outras áreas de finanças e para a vida em geral: as pessoas não querem pagar pelos serviços que consomem.

As empresas têm duas formas de cobrar pelos seus serviços: a primeira é escondendo o custo, como faz a XP. A segunda é cobrando mais de quem paga, para compensar aqueles que não pagam. Neste segundo grupo, se todos adotassem a prática do “gato”, no limite o serviço deixaria de ser prestado. O “gato” só existe porque existem trouxas que pagam a conta.

Levar vantagem é um esporte nacional. O problema é que é preciso alguém que se disponha a ser o trouxa. No final do dia, o Brasil é um país de trouxas que se acham espertos.