Os dilemas da neoindustrialização

E agora? Pra que lado vai pender os desejos de “neoindustrialização” do governo petista? Para as siderúrgicas ou para os seus clientes? Ambos são indústrias. Prevejo muito trabalho para os técnicos governamentais calcularem o “maior valor agregado” de cada setor, de modo a otimizar o parque industrial brasileiro. Ou, para os mais céticos, está na hora de ver quem tem o lobby mais forte.

O fato é que essa briga demonstra que não somos competitivos em aço. E se impusermos tarifas, deixaremos de ser competitivos nas indústrias que compram aço. A solução seria impor tarifas para a importação de todos esses produtos também, resultando em uma economia ainda mais fechada.

Se reservas de mercado resolvessem alguma coisa, seríamos uma potência da informática. Durante a década de 80, a indústria gozou não de tarifas, mas de proibição pura e simples de importação de equipamentos de informática. O que entrava aqui era contrabando. Resultado: os fornecedores gozaram de um mercado cativo durante anos e os consumidores ficaram reféns dos fornecedores, resultando em atraso tecnológico em toda a indústria. Hoje, a indústria nacional de tecnologia se reduz ao zumbi Ceitec.

Em capitulo no livro “Para Não Esquecer: Políticas Públicas Que Empobrecem o Brasil”, o economista Edmar Bacha explora a vasta literatura sobre o fechamento do comércio exterior como fator de estagnação econômica, e defende a abertura comercial como um passo para aumentar a produtividade brasileira, da qual precisamos desesperadamente. Mas Alckmin vai se reunir com os lobbies e decidir com base em “estudos” qual o melhor curso para a “neoindustrialização”. É o mesmo de sempre.

O leitor que lute

Essas notinhas de jornal, muitas vezes, são fruto de uma troca mutualmente vantajosa: o repórter tem acesso a dados “exclusivos”, e o órgão governamental ganha um espaço simpático no jornal. E aí você pergunta: onde fica o leitor nessa troca “mutuamente vantajosa”? Bem, aí já é demais exigir que as três partes ganhem, não é mesmo?

Vamos fazer a pergunta óbvia: qual foi o efeito real desse “grande aumento de desembolso” do BNDES? A julgar pela evolução da produção industrial, zero. Literalmente. A produção industrial cresceu zero nos últimos 12 meses em relação aos 12 meses anteriores. E pior: decresceu 0,2% nos primeiros nove meses do ano em relação ao mesmo período do ano passado. Justamente o período em que os desembolsos do BNDES “explodiram”.

Essa é a análise óbvia a ser feita, mas talvez seja pedir demais para o repórter que precisa estar de bem com o poder para continuar a ter acesso a dados “exclusivos”. O resultado são essas notinhas chapa-branca que passam a ilusão de que o governo está trabalhando.

A cereja do bolo é a menção à CNI, que teria recebido “com entusiasmo” um pacote para “fortalecer o setor”. Bem, só faltava os industriais rechaçarem dinheiro farto e barato do governo. A julgar pelos resultados até o momento, essa “explosão” de recursos do BNDES deve ter parado onde sempre pararam: na linha de lucros das empresas, sem qualquer aumento de produção.