O passado mítico

Entrevista hoje com o analista político argentino Carlos Pagni. Sua leitura do papel do peronismo na debacle argentina é bem interessante. A ideia é simples: Peron usou de uma vantagem competitiva da Argentina no pós guerra para inundar o país de políticas populistas, mas teve a “sorte” de ser deposto e não pegar as consequências nefastas de um modelo não sustentável. Ficou, assim, na memória do povo, o mito de “melhor presidente da história da Argentina” e, desde então, os argentinos procuram voltar àquele passado mítico.

Getúlio Vargas não teve a mesma “sorte”, e seu governo, apesar de ser reconhecido como “defensor dos trabalhadores”, não se notabilizou por uma especial bonança econômica. Nesse sentido, o nosso Peron é Lula.

Entre 2003 e 2010, Lula foi bafejado pela sorte, com a China crescendo dois dígitos todo ano e provocando a valorização dos preços das commodities. A sensação de riqueza fez o governo Lula entrar em um frenesi de populismo que cobrou o seu preço alguns anos depois. No entanto, Lula, a exemplo de Peron, teve “sorte” ao sair do poder antes da debacle, que caiu no colo da sua sucessora. Ficou, então, o mito de um passado glorioso. É este mito que dá a Lula o seu capital de votos.

Olhando para os nossos vizinhos, espero, sinceramente, que não sejamos vítimas de um peronismo tropical, que fará o país estagnar por décadas.

A cartilha de Peron

Três professores da FEA-USP cometem hoje o primeiro de três artigos sobre a ascensão e queda da Argentina.

Para os luminares, o peronismo (1943-1955) foi uma exceção à regra da decadência. Segundo os doutores, Peron reverteu parte da distância das economias mais desenvolvidas através de uma cartilha populista e desenvolvimentista, favorecendo as camadas mais baixas da população. O incrível na “análise” é que, apesar de reconhecer todos os erros cometidos pelo peronismo, atribuem a queda posterior da economia argentina ao “pensamento ortodoxo”. O maior mal que fez Peron teria sido reforçar o pensamento ortodoxo! É mais ou menos como o sujeito que trai a mulher e depois achar que o maior erro não foi a traição em si, mas sim a sua mulher procurar outro.

Mal posso esperar pelos próximos dois artigos.