Não menospreze o PT

Só assista se você tiver estômago forte. Uma coleção interminável de mentiras e mistificações.

Mas é de se tirar o chapéu a capacidade do PT de montar uma narrativa com começo, meio e fim, animado com infográficos e um discurso vibrante. Cadê o filminho do Alckmin? Ok, foi só uma pergunta retórica.

Não menospreze o PT. Nunca.

Diagnóstico errado

Esboço de um “plano econômico” do PT foi publicado hoje no Valor.

É incrível como, depois de dois anos da mais brutal recessão da história brasileira, os caras vêm com as mesmíssimas ideias que nos levaram para o buraco. Por exemplo, insistir no crédito às famílias como a alavanca que vai “despertar” a economia, em um contexto de alto endividamento.

A ideia de “usar o compulsório” mostra quanto esses caras não entendem como funciona o mercado financeiro. Os bancos não estão emprestando não por falta de funding, mas por falta de tomador! As famílias já estão super endividadas, e não tem mais como tomar empréstimos. Refinanciar para emprestar mais significa aumentar o endividamento das famílias, o que não se daria a um custo baixo. A não ser que os bancos públicos fossem usados para dar crédito “baratinho”, e já vimos onde isso termina.

Divórcio do Brasil

Só faltava o dinheiro próprio pros petistas criarem um país só deles. O divórcio do Brasil (e a moeda é um dos principais símbolos de um país) está cada vez mais claro.

Nada consegue destruir uma narrativa

Agora que Aécio virou réu, preparem-se para a mudança da narrativa: “Aécio já estava morto politicamente, condená-lo é fácil. O Alckmin, que vai concorrer nas eleições, foi liberado”.

Não há nada, absolutamente nada, que consiga destruir uma narrativa.

A gênese do antipetismo

Ah, como eu queria ser Cora Ronai por um dia, e conseguir traduzir em um texto perfeito os meus sentimentos.

Estava tentando escrever uma resposta ao desafio lançado pelos petistas: onde estão os batedores de panela que não estão se manifestando pela prisão do Alckmin? Ahá! Então o problema não era a corrupção, mas um antipetismo causado, em última instância, pela repulsa aos pobres!

Cora Ronai descreve neste texto maravilhoso o que eu apenas intuía: o PT me insultou (e a todos que não se alinham automaticamente ao seu mantra) de maneira violenta nas últimas décadas, e especialmente durante os seus governos. E insulto não se leva pra casa.

Alckmin, Maluf, Sarney, Collor, Aécio, não merecem que eu saia do conforto do meu lar. Eles podem ter roubado, mas não me insultaram. A raiva foi se acumulando, e explodiu em 2015.

Mais não falo. Leiam.

A nova saúva

Cora Ronai, O Globo, 11.04.2018

Milhões de eleitores foram agredidos pela retórica de Lula e pelo “ódio do bem” da esquerda

O antipetismo é o novo bicho papão dos intelectuais de esquerda. Ele acaba de ser comparado, por um amigo culto, inteligente e a quem respeito muito, ao antissemitismo na Alemanha de Hitler. Só posso atribuir a comparação ao calor do momento — vastas emoções, pensamentos imperfeitos. Mas acho que, em algum momento do futuro, serenados os ânimos, valeria à esquerda procurar, com honestidade, as origens desse suposto antipetismo, até porque é difícil encontrar a cura para um mal cuja causa se desconhece. Digo “suposto” não porque ele não exista, mas porque, da forma como vem sendo colocado, ele mais parece um movimento organizado, um conluio de vermes, o autêntico oposto de “democracia” — seja lá o que entenda por democracia alguém que defende o PT.

Ao contrário de tanta gente que denuncia o antipetismo, não tenho a menor pretensão de falar “pelo povo”, “pelos brasileiros”, “por todos nós”. Falo única e exclusivamente por mim, e já é responsabilidade que me baste. Eu detesto o PT. E detesto o PT pelo que o PT é, pelo que o PT fez e continua fazendo, e pela forma como o PT se comporta.

Não há um único fator externo ao PT embutido no meu sentimento.

É lógico que a sua intensidade tem a ver com o fato de que este é o partido que estava no poder até ontem: a crise que vivemos é, em maior ou menor grau, o resultado das suas escolhas e das suas ações. Tem a ver também com a hipocrisia do partido, que sempre se apresentou como alternativa ética aos demais, e foi incapaz de um simples pedido de desculpas à população quando se viu no centro do maior escândalo de corrupção já apurado no país.

E olhem que a corrupção do PT é, para mim, o menor dos seus males — ainda que ele a tenha elevado à categoria de arte. Meu maior problema com o PT, e com a esquerda como um todo, é a sua incapacidade de diálogo, a sua aversão ao contraditório e, sobretudo, a sua militância arrogante e patrulheira, que exige que todos se posicionem exatamente da mesma forma. Já estive em países de pensamento único e não gostei.

Há movimentos de direita igualmente obtusos e intolerantes, mas de modo geral eles se apresentam exatamente como são, toscos e primitivos. A sua embalagem é mais sincera; eles não pretendem ser “bons”, e nem falam do alto de um pedestal de virtudes.

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Um dia, ainda naquela remota eleição que Lula disputou com Collor, eu estava na rua com o Millôr, e comentei com ele que, pelo visto, o Lula ia ganhar — todos os carros que passavam com adesivos eram PT. O Millôr olhou, olhou, e me disse para prestar mais atenção: a maioria dos carros simplesmente não tinha adesivos.

— Sabe o que isso significa, né?

Eu sabia. Usar um adesivo do Collor, pelo menos na Zona Sul do Rio de Janeiro, era se arriscar a ter o carro arranhado e enfrentar militantes petistas raivosos. Eu tinha passado por isso com o adesivo do Covas que havia usado no primeiro turno.

Collor ganhou a eleição sem adesivos, não exatamente com “votos envergonhados”, como o PT disse à época, mas com votos intimidados.

Lula, um militante intolerante ele também, nunca desceu do palanque. Passou todos os seus anos de presidência, e mais os da Dilma, como vítima de um complô das elites, insistindo na divisão do nós contra eles: ricos contra pobres, brancos de olhos azuis contra negros, todos contra nordestinos.

Lula, como todos sabem, é uma mulher negra da periferia; agora, ainda por cima, encarcerada.

Um candidato pode ser o que quiser, mas um presidente não. O presidente de todos os brasileiros não pode dizer que quem não votou no seu partido odeia pobres e tem horror de ver os filhos dos pobres na universidade, porque além de divisiva, essa afirmação é extremamente ofensiva.

Há uma esquerda bem intencionada que talvez não tenha percebido o quanto de ódio havia, e ainda há, nesse discurso, porque ele a põe no pedestal ao qual ela imagina ter direito e massageia o seu ego. Ele reafirma a sua superioridade moral e apenas põe os inferiores no seu devido lugar.

Mas para quem não votou no PT — e que não é necessariamente de direita, de extrema direita ou, como está na moda, “fascista” — cada declaração dessas soou como um insulto. Durante 13 anos, os 50 milhões de eleitores que não votaram em Lula ou Dilma, e que, em sua vasta maioria, são apenas brasileiros como os demais brasileiros, ouviram que eram péssimas pessoas. Qualquer política de estado era invariavelmente apresentada como um desafio à sua intrínseca maldade: apesar de vocês, que não votam no PT, os pobres vão ter saúde, vão estudar, vão ter moradia e dignidade.

Como se qualquer ser humano, por não petista que seja, pudesse ser contra isso.

Cinquenta milhões de eleitores foram sistematicamente agredidos e desumanizados pela retórica de Lula e pelo “ódio do bem” da esquerda; agora não suportam o PT.

Mas por que será, não é mesmo?

Referência circular

O PT, único partido que se preocupa com os pobres do Brasil, apoia o regime de Chavez e Maduro.

O regime de Chavez e Maduro torna a vida dos pobres da Venezuela um inferno.

Os pobres da Venezuela fogem para o Brasil.

O governo neoliberal e fascista de São Paulo desaloja os pobres do Brasil para abrigar os pobres da Venezuela, fugidos do regime de Chávez e Maduro, apoiado pelo PT, o único partido que se preocupa com os pobres do Brasil.

Hora de acordar

Realmente não entendi a reação histérica das esquerdas à série O Mecanismo. Acabo de assistir o último episódio, onde o autor coloca Aécio tramando o impeachment com o Temer, porque Dilma não estaria interessada em parar a Lava-Jato. Detalhe: toda a mídia estaria comprada, a começar da Veja.

Alguém viu Aécio, Temer ou a Veja refutando histericamente a série? Tem lá uma história, que é a visão autoral do Padilha. As pessoas adultas assistem a série e concordam ou discordam daquela visão. Eu, por exemplo, acho a história de um complô contra a Dilma verosímil, mas completamente insuficiente para provocar o impeachment, que não ocorreria não fosse a abissal incompetência em variadas dimensões da ex-presidenta.

Só consigo relacionar as reações histéricas das esquerdas, incluindo o pueril boicote, a uma visão religiosa da missão de Lula e do PT. Padilha ousou mexer com o sacrossanto e mereceu o fatwa. Com isso, bobamente, as esquerdas vestem a carapuça, passam recibo. Como disse Padilha, está na hora das esquerdas acordarem.

A democracia segundo o PT

Em azul, declaração de dirigente do MST em janeiro, defendendo o bloqueio de estradas como forma de protesto pela condenação de Lula.

Em verde, declaração do deputado Pepe Vargas, do PT, atacando um suposto plano dos agricultores de Bagé de bloquear o acesso de Lula à cidade, onde iniciará a sua caravana.

Para os petistas, democracia é o nome que se dá ao sistema político que leva o PT ao poder.