Gestão temerária

O governo gaúcho adiou a oferta de ações do Banrisul por condições técnicas do mercado. Leia-se: ninguém quer comprar essa joça pelo preço que o governo do RS acha que vale.

Hoje, as ações do banco estatal gaúcho valem menos que o valor patrimonial da empresa. Ou seja, os investidores não querem pagar nem pelo valor contábil dos ativos. Para entender: a empresa vale mais se vender todos os seus ativos e fechar as portas.

E por que isso? Simples: para ser sócio do governo gaúcho, os investidores exigem um desconto gigante no preço das ações do banco. E aí, você ingenuamente pergunta: o governo gaúcho não ganharia mais transferindo o controle do banco? No que eu respondo: mais não, MUITO mais. E bota mais nisso.

Mas transferir o controle do banco significa que o governo não terá mais um instrumento para as suas “políticas públicas”. Leia-se: empréstimos para setores amigos, manutenção de agências deficitárias para agradar correligionários, cargos políticos, estabilidade do funcionalismo.

Para manter o controle, em uma decisão que claramente é prejudicial ao povo mais simples, os políticos gaúchos vestem o figurino de defensores do “patrimônio público”, das “riquezas do povo”. Assim, o funcionalismo público continua sem receber seus salários, mas orgulhosamente podem mostrar que são “donos de um banco”. Ok, assim é se assim lhe parece.

A não privatização do Banrisul, a esta altura do campeonato, deveria ser punida como gestão temerária dos recursos públicos, com direito a uma temporada na cadeia.

Ah, o povo…

Graças a mais uma operação da PF, ficamos sabendo que o Estado Brasileiro torrou R$ 30 milhões (trinta milhões de reais) num troço chamado Memorial da Anistia.

Independentemente de ter havido desvio de recursos ou não (parece que a coisa estava orçada inicialmente em R$5 milhões, chegou a R$30 milhões e ainda falta muito para terminar), o grande escândalo não está no desvio, mas no gasto em si.

Em um País com tantas mazelas, consigo pensar em 478 destinos mais prioritários do que um museu destinado a exaltar a luta armada e a defesa da democracia do Partido Único.

Os professores instalados na UFMG e na Comissão da Verdade de MG não veem desta forma: para eles, é mais importante a exaltação dos feitos dos guerrilheiros anistiados do que, sei lá, melhorar a qualidade do ensino básico. Sem surpresas: a batalha no campo das ideias, para “conscientizar o povo”, sem dúvida é a coisa mais importante a ser feita, na visão desses luminares.

O povo? Ah, o povo…

Hora de mudar de estratégia

Lembro, quando criança, de ouvir meu avô discutir com meu pai sobre o conflito no Oriente Médio. Lembro do meu avô dizer que a solução era estabelecer um Estado Palestino na Cisjordânia. Não sei precisar a data, mas certamente era a segunda metade da década de 70. Claro que eu não entendia nada daquilo, mas por algum mistério da mente, lembro dessas palavras.

Isso foi há 40 anos. Nada mudou desde então.

Agora, todos os analistas e especialistas estão dizendo que o reconhecimento de Jerusalém como a capital de Israel enterrou de vez as negociações de paz e que a radicalização vai tomar conta da região. Como se estivéssemos à beira de conseguir a paz e o radicalismo já não tivesse tomado conta da região.

As críticas ao gambito de Trump parecem mais uma crítica a Trump daqueles que já não gostam dele por princípio do que ao lance em si. Os EUA moveram uma peça no tabuleiro, de modo a tentar sair do impasse que já dura 70 anos.

O prêmio Nobel da Paz teve oito anos para tentar a sua estratégia de “somos todos irmãos” na região, e parece que não funcionou muito bem. Quem sabe não esteja mesmo na hora de mudar de estratégia.

Já vai tarde

O deputado Tiririca renunciou à vida pública. Anunciou que não vai concorrer a um terceiro mandato. Sai do Parlamento para voltar ao Circo.

Fez um discurso emocionado. Disse que tem vergonha dos deputados (mas não de todos, fez questão de não generalizar, mas já generalizando). Afirmou que sai de cabeça erguida, pois cumpriu com o seu dever, que foi o de votar pelo povo. Pediu aos deputados que pensassem mais no Brasil, no povo pobre, e não nos seus egos. Que deixassem de brigas e de rixas. Chegou a dizer que sua pobre mãe está internada em um hospital público, pois não tem plano de saúde! (Se o salário de deputado + o salário de artista nacionalmente conhecido não é suficiente para pagar uma Prevent Senior para a mãe, então estamos todos perdidos mesmo).

Tiririca foi eleito duas vezes para o Parlamento brasileiro, em ambas com mais de um milhão de votos. Não estou na cabeça de quem votou nele, mas imagino que tenha sido, principalmente, porque estava cansado dos políticos tradicionais, e Tiririca era uma piada bem adequada para o Congresso que temos. Alguns, inclusive, podem ter pensado que, não sendo um político tradicional, poderia, quem sabe, “fazer algo pelo povo”.

Este foi, aliás, o mote do discurso de despedida de Tiririca: ele fez algo pelo povo, povo este esquecido pela maior parte dos parlamentares.

Se eu fosse escolher um exemplo de discurso demagógico, seria este. Discurso de quem não entendeu como funciona a política e acha que tem a solução de todos os problemas do país: basta “não pensar em si mesmo e pensar no povo”.

Certa vez, ouvi Mario Covas dizer que se orgulhava de sua condição de Político. Assim mesmo, com P maiúsculo. O que é um Político? O que é a Política?

Política é a arte da conciliação de interesses divergentes.

Veja: se em uma casa, dentro de uma família, muitas vezes é difícil fazer convergir a opinião sobre um programa a se fazer, sobre o que comer, enfim, sobre tantas coisas, imagine em grupos maiores. Imagine, enfim, em um país, com tantas cabeças com ideias diferentes. E isso porque, em uma casa, não há democracia: pai e mãe mandam, ainda que, com sabedoria, possam escutar os filhos.

Em uma democracia, é preciso se chegar a maiorias. Para isso, o formato consagrado é a existência de um Parlamento, eleito diretamente pelo povo. Estes são os representantes que refletirão as diversas ideias do que é bom ou ruim para o povo.

Tiririca acha que fez um bom trabalho simplesmente porque compareceu a todas as sessões e sempre votou “a favor do povo”. Não entendeu nada. Fazer política não é o mesmo que trabalhar em uma fábrica, onde o operário padrão não falta e encaixa uma peça na outra com perfeição. Fazer política é procurar juntar uma maioria em torno de suas ideias. Conversar, discursar, propor, compor. Estar de corpo presente e apertar um botão nas votações é a menor parte desse trabalho.

Tiririca, na verdade, fraudou o voto que recebeu. Seu único discurso no Parlamento foi este último, em que anunciou sua saída da vida pública. Saída de um lugar onde nunca verdadeiramente entrou. Pois nunca foi um Político com P maiúsculo. Foi somente um puxador de votos, papel a que se prestou com prazer.

Sua pretensão de ter votado sempre com o povo é a mesma de todos os parlamentares: todos acham que estão votando pelo povo. Na verdade, todo mundo acha que suas ideias são as melhores. E é para isso que existe o Parlamento: para o embate entre as melhores ideias de todo mundo. Pretender ser o único que votou sempre “pelo povo” é quase uma pretensão messiânica.

Claro, há bandidos, pessoas ruins. Como as há em qualquer ramo profissional. É da natureza humana. Somos homens, não anjos. A solução para isso não é apelar para que “esqueçam seu ego” e “façam algo pelo povo”. Isso é pedir um super-homem, coisa que não se pede em outras profissões. Coisa que só existe como pretensão em regimes totalitários.

Não melhoraremos a qualidade do Parlamento com super-homens ou com anjos. A solução passa por consertar a estrutura de incentivos perversos vigente. Quanto mais estatais e ministérios e cargos de confiança houver, maior será o toma-lá-dá-cá. Quanto menos dessas sinecuras houver, menor será a atração para políticos que querem se locupletar.

Tiririca se coloca como o homem humilde que tentou fazer alguma coisa pelos pobres, mas foi triturado pela máquina. Na verdade, foi um embuste, um cacareco que se levou a sério, mas não estava minimamente preparado para fazer Política. Já vai tarde.

Confissão de culpa

A defesa de Lula reclama da “celeridade extraordinária” do TRF4 na apreciação da apelação de Lula. Da mesma forma, a imprensa amiga e os petistas de todos os quadrantes medem com régua e esquadro os dias, as horas e os minutos entre a chegada da sentença em 1a instância e o voto do relator, desembargador João Pedro Gebran Neto.

Não entendo.

Esse pessoal todo jura que Lula é inocente, e que Sérgio Moro o estaria perseguindo.

Assim, deveriam estar torcendo para que o processo estivesse andando o mais rapidamente possível.

Para que, quanto antes, Lula pudesse se livrar desse processo injusto. É o que faria qualquer pessoa que se considerasse inocente.

Mas não é o que temos.

Não consigo pensar em confissão de culpa mais eloquente.

Glossolalia ininteligível

Um doce para quem conseguir decifrar este artigo.

Meu palpite é de que se trata de uma crítica aos que acreditam que a matemática seja uma ciência exata. Mas não estou bem certo.

Pelo menos, a uma conclusão eu cheguei: lendo este artigo, fica fácil de entender porque a tal “Nova Matriz Econômica” não tinha como dar bom resultado. Suas bases teóricas (se é que isso existe) não passam de uma glossolalia ininteligível, procurando dar um verniz de erudição à simples revolta contra “ tudo isso que está aí”. Brizola talvez tenha sido o último político capaz de traduzir essa gororoba para o povo. Lula nunca acreditou nessa bobajada. E Dilma não era ininteligível à toa: não é pra qualquer um traduzir essa tempestade cerebral.

Ciro Gomes é quem atualmente está tentando trazer para o mundo real esse turbilhão de ideias peregrinas. Para o bem de todos, é melhor que não consiga.

O governo acha que os pais são idiotas

O MEC do Temer decidiu não mais divulgar a nota do ENEM por escola. Quando comentei essa decisão há um ano, apostei que as próprias escolas o fariam, sem nenhum critério.

BINGO!

Reportagem de hoje no Estadão mostra que já tem consultoria fazendo o ranking. E que o próprio jornal elaborou o seu, que não bate com a nota autoatribuída pelo Colégio Objetivo, por exemplo. Uma confusão!

O ministro da Educação, ao justificar a decisão, afirmou que a nota serve como um “falso” marketing, e que outros critérios devem ser usados pelos pais para escolher a escola dos filhos. Fazem coro ao ministro os “especialistas” de sempre.

Esse pessoal realmente acha que os pais são uns idiotas, que precisam ser tutelados em suas escolhas.

O ranking é UM critério utilizado. Outro é a distância do colégio. Outros podem ser a filosofia do ensino, esportes, atividades extra-curriculares etc.

Os pais, ao escolherem a escola dos seus filhos, têm uma escala de prioridades. Alguns dão valor à socialização. Outros, à facilidade logística. E outros, à possibilidade de o filho ser aprovado nos melhores vestibulares.

Ao negar o ranking, o governo deixa à pé aqueles pais que dão valor ao vestibular. Gostaria que algum “especialista” me explicasse porque é errado dar prioridade para o vestibular. Por que raios eu não posso querer que meu filho tenha mais chance no vestibular?

Esse viés paternalista caía bem no governo do PT, que infantiliza o povo. Vindo de um governo dito liberal não dá para entender.

“Ah, mas os grandes colégios manipulam os resultados! O Objetivo coloca o nome dele lá em 1o lugar segregando uma classe especial!”

Novamente: o governo acha que os pais são uns idiotas? Que não notam essas manipulações?

“Ain, mas essa prática instrumentaliza o ensino, que é muito mais do que uma nota numa prova!”

Então porque o governo brasileiro não propõe à ONU o fim do PISA? Afinal, aquela nota, que nos faz passar vergonha todo ano, não traduz todo o potencial do estudante brasileiro! Falta aí a “socialização”, o “ziriguidum” e a “malemolência”, características do brasileiro que não são captadas por uma simples nota.

Faça-me o favor!

Os pais não são idiotas, e sabem o que é melhor para os seus filhos. Conseguirão, de uma forma ou de outra, essa nota do ENEM. Melhor seria se fosse de uma fonte oficial.