A estratégia de Alckmin

Vera Magalhães, hoje novamente no Estadão, continua sua patacoada sobre a “vitória de Marina sobre Bolsonaro” no debate. Peço, por favor, que quem não tenha visto, procure no YouTube esta parte, e veja com seus próprios olhos. Esta é a melhor vacina contra fake news.

Mas não é sobre isso que quero escrever. Vera, no mesmo artigo, define bem a campanha de Alckmin até o momento, a não ser por um detalhe, que comento adiante. Segue o trecho:

De que vale Geraldo Alckmin juntar 44% do tempo de TV da propaganda eleitoral, um arsenal de deputados e senadores, se quando colocado diante do eleitor ao vivo se comporta como um candidato a prefeito de Pindamonhangaba, enfileirando siglas, falando de matas ciliares, chamando sparrings para fazer pergunta porque não tem coragem de ficar tête-à-tête com aquele que lidera a eleição no Estado em que ele governou quatro vezes? Por que ele acha que esse discurso mole, em tom monocórdio e sem mostrar qual seu projeto de País, sem fixar uma miserável ideia-guia que seja, vai fazê-lo crescer?

É isso. Alckmin parece perdido.

Para entender essa eleição, é preciso ter em mente que ela corre em dois eixos: esquerda x direita e establishment x anti-establishment. Bolsonaro é claramente direita e anti-establishment. Marina é esquerda e anti-establishment. Os dois lideram as pesquisas no momento, sugerindo que o voto anti-establishment está na frente. Ciro e Álvaro Dias tentam passar por anti-establishment, mas sem o sucesso dos dois primeiros.

Do establishment temos Alckmin e Haddad. Haddad à esquerda e Alckmin…, bem, este é o problema.

O candidato do PSDB se propôs, e isso ficou claro desde o início, a encarnar o candidato de “centro”, que apela aos “isentos”, àqueles que não gostam de radicalismos. Como diria o inefável Kassab, nem direita, nem esquerda, nem em cima, nem embaixo. O resultado é essa gelatina sem sabor que vemos. O brasileiro médio não parece muito disposto a discursos conciliatórios no momento.

Alckmin vem também tentando atacar Bolsonaro no campo da “competência e experiência”, o que resulta nesse discurso insosso que Vera Magalhães descreve muito bem. Além disso, “experiência” não conta muito quando as coisas vão mal (13 milhões de desempregados!). A pergunta óbvia é: se você é tão competente quanto diz, por que as coisas estão essa zerda de dar gosto? Além disso, a experiência é prima-irmã do establishment, e Bolsonaro explora bem esse parentesco.

Geraldo Alckmin precisa se decidir de quem quer roubar votos. Para roubar votos de Bolsonaro, ser “de centro” e “ser mais competente” parece não estar funcionando até o momento. Uma outra tática possível seria atacar as esquerdas em geral e o PT em particular com uma virulência maior do que o capitão. Foi o que fez João Doria em São Paulo com sucesso.

É neste ponto que a análise de Vera Magalhães falha: Alckmin não ganha nada confrontando diretamente Bolsonaro no campo da esquerda, como fez Marina. Este campo já está muito congestionado, até o Meirelles apareceu defendendo as mulheres! Ele precisa mostrar para o eleitorado perdido de São Paulo que é o melhor candidato para enfrentar a esquerda no 2o turno. Para isso, ele precisa atacar a esquerda no 1o turno. Se ele atacar Bolsonaro, ele próprio parecerá pertencer à esquerda, disputando votos com Ciro, Marina e Haddad para enfrentar Bolsonaro no 2o turno. É uma tática mais arriscada.

Marina, por outro lado, ganha muito atacando Bolsonaro. O campo dela é o da esquerda, e ela precisa mostrar para este campo que é a mais competente para bater o capitão no 2o turno. Assim, temas como mulheres e armas, tão caras à esquerda, são a sua matéria-prima natural. É justamente o inverso de Alckmin.

Enfim, apesar de todo o seu arsenal, esta eleição não será fácil para Alckmin. Ele juntou muitos exércitos no tabuleiro, mas parece que está em busca de uma estratégia para vencer a guerra. Ou melhor, parece não saber que guerra está lutando.

PS.: toda essa análise pode ir por água abaixo depois de iniciada a campanha na TV. Alckmin tem arsenal para fazer uma guerra de “rolo-compressor”, em que mesmo uma estratégia equivocada é compensada pelo tamanho descomunal dos exércitos. Por isso, essa eleição está completamente aberta.

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