Manifesto pela educação

Para não correr o risco de fazer uma injustiça, fui atrás do tal “manifesto pela educação” dos ex-ministros da educação. Está aí na íntegra para quem tiver paciência de ler.

Trata-se de uma coleção de platitudes com duas (duas só) críticas a pontos concretos. Não poderia ser diferente, dado que o atual governo sequer desenvolveu algo que pudesse ser chamado de “política para a educação”, apenas criou factoides, como ministro pedir para as escolas filmarem as crianças cantando o hino ou abrindo guarda-chuva dentro do gabinete. O governo também poderia se ajudar evitando esse tipo de constrangimento.

Comecemos pelas platitudes. São de dois tipos. Primeiro, as declarações universais, que poderiam ser escritas por geradores aleatórios de citações. Coisas do tipo “Uma educação pública básica de qualidade forma bem a pessoa, o profissional e o cidadão para desenvolverem, com independência e sem imposições, suas potencialidades singulares”. Ou “O ensino superior necessita ter qualidade, o que requer tanto constantes avaliações quanto recursos, garantindo seu papel insubstituível na formação de profissionais qualificados para um mercado de trabalho cada vez mais exigente, impactado pelos desafios das inovações e das novas tecnologias.”

Um outro tipo de platitude é mais concreta, e depõe contra quem fala como ex-ministro, pois exige do atual governo o que eles mesmos não fizeram. Por exemplo: “…é indispensável que se constitua e se organize um efetivo Sistema Nacional de Educação”. Ou “Ademais, a prioridade à educação básica demanda que cresçam os repasses do governo federal para os estados e municípios, responsáveis pelo ensino infantil, fundamental e médio, sendo prioridade a renovação e, se possível, ampliação do FUNDEB”. Por que não fizeram um Sistema Nacional de Educação ou ampliaram as verbas do FUNDEB quando tiveram oportunidade para tal? Aliás, ao que me parece, esse governo é o que mais vocaliza a descentralização de verbas (“mais Brasil, menos Brasília”), justamente para que os entes da Federação não precisem ficar mendigando recursos de fundos setoriais.

Agora, as duas críticas.

A primeira refere-se ao contingenciamento de verbas: “Contingenciamentos ocorrem, mas em áreas como educação e saúde, na magnitude que estão sendo apresentados, podem ter efeitos irreversíveis e até fatais”. Primeiro, que os contingenciamentos anunciados por esse governo estão longe de ser os maiores da história. Dilma contingenciou mais no início de seu segundo mandato e não houve manifestos. Segundo, os contingenciamentos se dão sobre verbas não vinculadas constitucionalmente, de modo que as atividades básicas estão preservadas. Terceiro, vi ontem uma estatística mostrando que os gastos com educação durante os governos do PT aumentaram em 30% como proporção do PIB. A tomar pelo seu valor de face essa estatística, isso só mostra a incompetência na aplicação dos recursos, pois obviamente a educação não melhorou em 30% no Brasil durante esse período. Enfim, essa crítica não procede.

A segunda, obviamente, é ideológica, e refere-se ao “escola sem partido”. “… e, mais que tudo, o respeito à profissão docente, que não pode ser submetida a nenhuma perseguição ideológica. A liberdade de cátedra e o livre exercício do magistério são valores fundamentais e inegociáveis do processo de aprendizagem e da relação entre alunos e professores. Convidar os alunos a filmarem os professores, para puni-los, é uma medida que apenas piora a educação, submetendo-a a uma censura inaceitável. Tratar a educação como ocasião para punições é exatamente o contrário do que deve ser feito”.

Em primeiro lugar, segundo o manifesto, o “respeito à profissão docente” se resume a não ser perseguido por questões ideológicas. Não há menção a salários, planos de carreira, segurança nas escolas, incentivos aos bons profissionais. Nada disso. Se deixarmos os professores falarem as groselhas que quiserem dentro da sala de aula, o professor estará respeitado.

Tenho restrições ao “escola sem partido”, não pelo seu objeto, mas pelo seu método. Acho que tem pouca chance de funcionar do modo que foi concebido (nisso, acompanho o Olavo). O trabalho é mais profundo, e deve ser iniciado nas universidades. Mas isso é tema para outro post. O que importa aqui é desnudar o viés ideológico desse manifesto.

Curioso que desse convescote não tenha participado o ministro da educação de Temer, Mendonça Filho, responsável por uma das poucas revoluções na educação brasileira nos últimos anos, a reforma do Ensino Médio. Aliás, bombardeada pelos partidos a que pertencem esses senhores. Obviamente, Mendonça Filho não ia meter a mão nessa cumbuca. Ele sabe que tudo isso aí é pretexto político para bombardear esse governo.

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