Ingenuidade?

Um detalhe para o qual vi pouco destaque nas coberturas jornalísticas e nas análises em geral: as privatizações de subsidiárias de estatais ganharam aval do STF pela elástica margem de 9 votos a 2. Em todas as previsões que eu havia lido e ouvido, os mais otimistas apostavam em vitória da tese por uma apertada margem de 6 x 5. Somente Lewandowski e Fachin ficaram do lado da pré-história.

Isso pode significar que, para temas econômicos, o STF esteja revelando um perfil mais liberal, o que pode ser muito útil para a agenda futura deste governo.

Estou sendo muito ingênuo?

Cadê os americanos?

Lembro, no início da era dos telefones celulares na década de 90, do surgimento de uma empresa finlandesa revolucionária, que em pouco tempo dominou a indústria com seus produtos inovadores: a Nokia.

Passou o tempo (pouco tempo), e os celulares viraram commodities. A Nokia foi comida por baixo pelos coreanos (e depois pelos chineses) e por cima pela Apple. Dez anos após o seu auge, a Nokia havia desaparecido.

Sim, a tecnologia do 5G é detida por empresas chinesas e finlandesas. Cadê a empresa americana?

Eu respondo para o general Mourão: a empresa americana que vai dominar o próximo ciclo tecnológico ainda não surgiu. Está morando anonimamente em algum dormitório de uma grande universidade americana.

Privatizar ou não privatizar?

O presidente dos Correios diz que a empresa é insubstituível.

Os Correios estão sob o ministério da Ciência e Tecnologia. O ministro Marcos Pontes também já se mostrou contra privatizações.

Aqui, estou com o sindicalista, que disse que é preciso que “o governo se entenda”. Não dá pra dizer que quer privatizar e, ao mesmo tempo, colocar estatistas de carteirinha no comando de ministérios e estatais. Afinal, o governo quer ou não quer privatizar?

Manifesto pela educação

Para não correr o risco de fazer uma injustiça, fui atrás do tal “manifesto pela educação” dos ex-ministros da educação. Está aí na íntegra para quem tiver paciência de ler.

Trata-se de uma coleção de platitudes com duas (duas só) críticas a pontos concretos. Não poderia ser diferente, dado que o atual governo sequer desenvolveu algo que pudesse ser chamado de “política para a educação”, apenas criou factoides, como ministro pedir para as escolas filmarem as crianças cantando o hino ou abrindo guarda-chuva dentro do gabinete. O governo também poderia se ajudar evitando esse tipo de constrangimento.

Comecemos pelas platitudes. São de dois tipos. Primeiro, as declarações universais, que poderiam ser escritas por geradores aleatórios de citações. Coisas do tipo “Uma educação pública básica de qualidade forma bem a pessoa, o profissional e o cidadão para desenvolverem, com independência e sem imposições, suas potencialidades singulares”. Ou “O ensino superior necessita ter qualidade, o que requer tanto constantes avaliações quanto recursos, garantindo seu papel insubstituível na formação de profissionais qualificados para um mercado de trabalho cada vez mais exigente, impactado pelos desafios das inovações e das novas tecnologias.”

Um outro tipo de platitude é mais concreta, e depõe contra quem fala como ex-ministro, pois exige do atual governo o que eles mesmos não fizeram. Por exemplo: “…é indispensável que se constitua e se organize um efetivo Sistema Nacional de Educação”. Ou “Ademais, a prioridade à educação básica demanda que cresçam os repasses do governo federal para os estados e municípios, responsáveis pelo ensino infantil, fundamental e médio, sendo prioridade a renovação e, se possível, ampliação do FUNDEB”. Por que não fizeram um Sistema Nacional de Educação ou ampliaram as verbas do FUNDEB quando tiveram oportunidade para tal? Aliás, ao que me parece, esse governo é o que mais vocaliza a descentralização de verbas (“mais Brasil, menos Brasília”), justamente para que os entes da Federação não precisem ficar mendigando recursos de fundos setoriais.

Agora, as duas críticas.

A primeira refere-se ao contingenciamento de verbas: “Contingenciamentos ocorrem, mas em áreas como educação e saúde, na magnitude que estão sendo apresentados, podem ter efeitos irreversíveis e até fatais”. Primeiro, que os contingenciamentos anunciados por esse governo estão longe de ser os maiores da história. Dilma contingenciou mais no início de seu segundo mandato e não houve manifestos. Segundo, os contingenciamentos se dão sobre verbas não vinculadas constitucionalmente, de modo que as atividades básicas estão preservadas. Terceiro, vi ontem uma estatística mostrando que os gastos com educação durante os governos do PT aumentaram em 30% como proporção do PIB. A tomar pelo seu valor de face essa estatística, isso só mostra a incompetência na aplicação dos recursos, pois obviamente a educação não melhorou em 30% no Brasil durante esse período. Enfim, essa crítica não procede.

A segunda, obviamente, é ideológica, e refere-se ao “escola sem partido”. “… e, mais que tudo, o respeito à profissão docente, que não pode ser submetida a nenhuma perseguição ideológica. A liberdade de cátedra e o livre exercício do magistério são valores fundamentais e inegociáveis do processo de aprendizagem e da relação entre alunos e professores. Convidar os alunos a filmarem os professores, para puni-los, é uma medida que apenas piora a educação, submetendo-a a uma censura inaceitável. Tratar a educação como ocasião para punições é exatamente o contrário do que deve ser feito”.

Em primeiro lugar, segundo o manifesto, o “respeito à profissão docente” se resume a não ser perseguido por questões ideológicas. Não há menção a salários, planos de carreira, segurança nas escolas, incentivos aos bons profissionais. Nada disso. Se deixarmos os professores falarem as groselhas que quiserem dentro da sala de aula, o professor estará respeitado.

Tenho restrições ao “escola sem partido”, não pelo seu objeto, mas pelo seu método. Acho que tem pouca chance de funcionar do modo que foi concebido (nisso, acompanho o Olavo). O trabalho é mais profundo, e deve ser iniciado nas universidades. Mas isso é tema para outro post. O que importa aqui é desnudar o viés ideológico desse manifesto.

Curioso que desse convescote não tenha participado o ministro da educação de Temer, Mendonça Filho, responsável por uma das poucas revoluções na educação brasileira nos últimos anos, a reforma do Ensino Médio. Aliás, bombardeada pelos partidos a que pertencem esses senhores. Obviamente, Mendonça Filho não ia meter a mão nessa cumbuca. Ele sabe que tudo isso aí é pretexto político para bombardear esse governo.

Multas

Por que perder a carteira com 40 pontos? Por que não com 60 ou com 100? Por que perder a carteira com qualquer pontuação?

Por que existem pontos? Pra que servem?

Por que existem multas de trânsito? Pra que servem?

Por que existem limites de velocidade nas estradas? Aliás, por que existem regras de trânsito, afinal?

Se tudo não passa de uma grande indústria com o objetivo de arrancar dinheiro do motorista, vamos acabar com todas as regras. Matar a indústria pela raiz.

Ou não?

Lições

Os ex-ministros da educação dos governos FHC, Lula e Dilma se reuniram para fazer um alerta sobre os perigos dos retrocessos na educação do Brasil.

No ano 2000, o Brasil participou pela primeira vez do PISA, apenas na categoria leitura. Ficou em último lugar entre 36 países da OCDE, com 395 pontos.

Em 2018, o Brasil se classificou em 63o lugar entre 70 países. A nota em leitura foi de 407 pontos, um incrível avanço de 12 pontos em 18 anos, o que nos deixou em 59o lugar nesse quesito.

Vamos ouvir os alertas dos ex-ministros da educação. Eles têm muito a nos ensinar.

A boa política

Ia escrever sobre isso ontem, mas ficou melhor ainda com essa foto e esse editorial do Estadão.

Política. A boa política.

Aparentemente, o governo Bolsonaro começa a entender que não se faz política com confronto, mas com negociação. E que negociação não significa automaticamente corrupção.

Como todo governo, Bolsonaro ainda sofrerá muitas derrotas no Congresso, assim como conseguirá muitas vitórias. Assim é a democracia, não uma luta entre o bem e o mal, mas um embate de concepções de mundo na arena regulamentar: o parlamento.

PS.: o Estadão fez muitos editoriais criticando o governo Bolsonaro. Alguns dirão que, se o editorialista está elogiando, é porque Bolsonaro está no caminho errado. Eu prefiro pensar que receber um editorial elogioso é uma conquista para qualquer governo.